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Descobertas e invenções em narrativas imagéticas

“Sempre compreendo o que faço depois que já fiz. (...) É sempre uma descoberta. Não é nada procurado. É achado mesmo.” 

[Manoel de Barros, «Memórias inventadas: a segunda infância», 2006]

As pesquisas que venho fazendo com imagens de escola vêm assumindo importância crescente pelo que despertam de interrogações e ideias, diálogos e narrativas possíveis sobre os cotidianos expressos nas imagens de escolas com as quais entro em contato. Elas mobilizam as minhas possibilidades de compreensão/invenção de objetos que deem conta das tantas formas possíveis de dialogar com aquilo que se vê/lê. Percebo, no material observado, inúmeras pistas a respeito dos cotidianos escolares vividos, questionados ou obedecidos, transformados por tantos e tantas alunos(as), professores(as), autoridades, inspetores, tecendo compreensões possíveis daquilo que as narrativas imagéticas me dizem.
Mas é sempre descoberta/invenção a posteriori. Nunca sei bem o que posso encontrar, nem mesmo tenho um objetivo na busca de demonstrar o que quer que seja a priori. O prazer e a aprendizagem a que essas pesquisas me levam estão nas descobertas e invenções possibilitadas por elas, pelo que permitem me aproximar das redes que se põem em movimento nos muitos cotidianos escolares.
Einstein afirmava que “nem tudo o que pode ser contado conta, e nem tudo o que conta pode ser contado”, questionando a importância que nos acostumamos a conceder à quantificação. Aderindo a essa máxima, entendo que captar e perceber as qualidades e especificidades “que contam” não é tarefa fácil. Encontrar nas narrativas imagéticas indícios da realidade que, supostamente, elas expõem, requer certa abertura para o inesperado.
A imprevisibilidade do que se pode encontrar é, de algum modo, expressão da própria imprevisibilidade da vida cotidiana, que, ao contrário das crenças difundidas pela e na modernidade, é espaço de permanente negociação de sentidos, de criação e reinvenção permanente de saberes/fazeres/valores e emoções. Ou seja, para além da repetição dos esquemas hegemônicos da organização formal da Escola, há no seu cotidiano outros saberes/fazeres/valores e emoções que se insinuam também nas imagens.
No material recentemente pesquisado (Museu Nacional da Educação – Rouen, França), chama a atenção a função atribuída aos cartazes usados até os anos 1960, que servem de suporte a atividades de redação, ditado, gramática, vocabulário e fixação de conteúdos de diferentes disciplinas.
Em comum, as imagens observadas têm muito: expressam um modelo, uma defesa de um modo de vida mais do que apenas de escolarização. O modelo de Escola que neles se evidencia é aquele que ensina expositivamente, busca a fixação, educa para a formação do bom cidadão/cidadã, pessoa respeitadora e defensora dos bons costumes e dos valores da sociedade democrática. Sem dúvida, estamos perante a chamada “Escola Tradicional”, ainda hoje modelo predominante. Mas não nos enganemos, essa escola está em movimento.
Cartazes produzidos entre 1850-1940 mostram coisas diferentes e por meio de outra estética. Tudo parece mais fixo e menos dinâmico. Sem avançar em possíveis interpretações arriscadas, penso ser importante destacar essa mobilidade, pois é ela que permite questionar a suposta permanência do modelo, a suposta imobilidade da Escola, tida como instituição inadaptadaàs mudanças do mundo. É ela que permite afirmar que, para além das permanências, há movimento, e se não o podemos captar nas imagens em si, podemos captá-lo no que elas não expressam, a sua própria mobilidade e a daquilo que expressam/escondem.

Inês Barbosa de Oliveira


  
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