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Luzes e Sombras na Universidade

A qualidade não se decreta. O paradigma da qualidade na Universidade exige um amplo debate entre os diferentes parceiros da comunidade científica e educacional. Como refere Stenhouse (1984), para avaliar há que compreender a realidade. E esta realidade está configurada por grandes turbulências não só ao nível de conhecimento, informação e tecnologia, mas também devido a novos modelos de cultura organizacional. No dizer de Boaventura Santos (1994), a universidade está ela própria em crise, dando sinais de perda de hegemonia, legitimidade e identidade institucional. Este quadro está, em boa medida, relacionado com a concorrência de outras instituições produtoras de saberes e culturas e pela impossibilidade da Universidade responder a muitos dos problemas colocados pela sociedade.
Ora, se quisermos perceber as turbulências da Universidade em Portugal e os efeitos das reformas levadas a cabo nos últimos anos, teremos que atender à sua expansão recente e a alguns desequilíbrios com ela relacionados. Além disso, há que perceber que a articulação entre o ensino superior público e o ensino particular e cooperativo não tem sido fácil. O Estado demitiu-se do seu papel regulador, deixando o "mercado" em "roda-livre". É da opinião geral que os "turbo-professores" facilitaram/participaram na tarefa de transformação da Universidade naquilo que hoje é, por muitos, designado por "fábricas de licenciados". Acresce, ainda, que a inserção dos novos diplomados no mercado de trabalho tem-se confrontado com obstáculos que condicionam o seu projecto de emprego e a vida das próprias instituições universitárias.
Neste contexto, urge desocultar alguns constrangimentos e dificuldades motivados pelo alargamento da rede universitária e massificação do ensino, a fim de melhor percebermos as "luzes" e as "sombras" da Universidade que se pretende de qualidade. Assim, enunciamos algumas pistas que podem servir para a reflexão em torno dos desafios do futuro, identificando os principais elementos que concorrem para a crise geral em que se encontra a Universidade, que, em muitos aspectos, é um espelho da sociedade, a saber:

  • Redefinição de uma nova Lei-quadro para o Ensino Superior, em que se clarifiquem as regras para o funcionamento dos diversos subsistemas, quer no sector público quer privado, nomeadamente no domínio dos objectivos, finalidades, recursos financeiros, articulação geográfica e interacção institucional com as comunidades onde as instituições estão sediadas;
  • Desenvolvimento de uma nova cultura organizacional, assente no princípio de funcionamento democrático, centrada em lideranças democráticas e responsáveis;
  • Criação de um processo de avaliação permanente, consubstanciada num compromisso de auto-avaliação e de avaliação externa, num constante diálogo entre a instituição e a sociedade em que se insere, com vista à prossecução de uma cultura de qualidade e na promoção de uma cultura de liberdade, solidariedade e justiça;
  • Definição do actual perfil dos professores, reforçando a componente pedagógica, institucionalizando cada vez mais práticas de trabalho em grupo e incentivando parcerias com outras instituições;
  • Criação de redes universitárias complementares e diferenciadas, conciliando o know how técnico com o know how ético;
  • Reforço da estabilidade da relação de trabalho, com o respeito pelas legítimas expectativas dos docentes e investigadores, eliminando situações de arbitrariedade e de manifesta injustiça;
  • Respeito pelo Ratio/Padrão, legitimando a "pedagogia problematizadora" e questionando a "pedagogia bancária";
  • Articulação dos diversos níveis de ensino, em especial entre o ensino secundário e superior;
  • Implementação do professor/autor e do aluno/mentor com vista à diminuição das taxas de abandono e insucesso escolares;

Estas medidas poderão contribuir para a dignificação da instituição Universidade nos diferentes âmbitos da sua actuação - ensino, investigação e extensão à comunidade ?, constituindo um exemplo a ser seguido pelos cidadãos e outras instituições, imprescindível para a reconstrução e aprofundamento de uma sociedade mais democrática e solidária.

Américo Nunes Peres
docente da UTAD


  
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Edição:

N.º 90
Ano 9, Março 2000

Autoria:

Américo Nunes Peres
Univ. de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) - Pólo de Chaves, Vila Real
Américo Nunes Peres
Univ. de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) - Pólo de Chaves, Vila Real

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