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Lá como cá é necessário respeitar a vontade da maioria

Impulsionado pela vontade de mudança da maioria dos americanos, o candidato do Partido Democrata, Barack Obama foi triunfalmente eleito presidente dos Estados Unidos, arrebatando uma vitória esmagadora sobre o candidato republicano McCain.
Vitória tanto mais significativa quanto se traduziu na eleição inédita do primeiro presidente de origem afro-americana, resultante da mobilização massiva da maioria dos trabalhadores e dos jovens, não apenas dos brancos, mas sobretudo dos negros (apesar da sobrevivência da discriminação e da segregação racial) e dos hispânicos, a que se associaram todos os sectores sociais que pretendiam (e pretendem) pôr termo à agressiva política anti-social e imperialista de Bush e dos candidatos à sua prossecução contra os povos da América e do mundo, ao serviço dos interesses da plutocracia financeira e petrolífera. Convém, a propósito, não esquecer que George W. Bush pôde assegurar a sua "eleição" graças à segregação racial que permitiu a exclusão do recenseamento eleitoral de enormes massas de eleitores negros.
Certamente que Obama, apesar das promessas de mudança que formulou, não esperou pelo fim da campanha para definir os limites da sua acção política, no respeito pelos objectivos e regras de funcionamento do sistema a cuja presidência se candidatou: apelo a uma aceleração da retirada das tropas americanas do Iraque acompanhada do anúncio do aumento dos seus efectivos no Afeganistão, em nome da necessidade de continuação da "guerra contra o terrorismo"; anúncio da intenção de manter o embargo a Cuba e do apoio incondicional ao expansionismo sionista do estado de Israel contra os palestinianos e restantes povos oprimidos do Médio Oriente; defesa da redução da tributação das empresas logo seguida da apresentação da sua equipa de conselheiros económicos, na sua maioria apologistas do mercado livre segundo os cânones da Escola de Chicago, a pontos dum responsável nacional da central sindical americana, AFL - CIO, ter-se manifestado profundamente chocado com semelhante escolha.
Só que, no contexto da crise generalizada do sistema capitalista mundial com efeitos devastadores nos próprios Estados Unidos ? a começar pelo desalojamento de milhares de famílias, subitamente privadas da capacidade de amortizar os empréstimos bancários contraídos para pagar as suas habitações, devido ao agravamento draconiano das respectivas condições após a explosão da bolha imobiliária sob os efeitos da especulação, sem esquecer a subida vertiginosa dos preços dos combustíveis em benefício exclusivo das grandes companhias petrolíferas e suas repercussões dramáticas na generalidade dos sectores da economia, com o aumento brutal do desemprego ? o cumprimento das promessas de mudança feitas por Obama durante a campanha eleitoral vai, seguramente, ser cada vez mais exigido pela maioria que o fez eleger, confrontando-o com os limites que aceitou respeitar no exercício do seu cargo, mobilização que inevitavelmente se radicalizará à medida que os seus protagonistas, dentro e fora da América, forem perdendo as suas ilusões, procurando munir-se dos meios políticos que lhe permitam fazer respeitar a sua vontade soberana.
Do mesmo modo, em Portugal, como na generalidade dos países da Europa, apesar das manifestações desesperadas de descrédito de responsáveis políticos de direita na democracia, como as que Manuela Ferreira Leite acabou recentemente de protagonizar, a maioria dos cidadãos certamente desconfiará da natureza e alcance das reformas que alegadamente só poderão ser feitas contra a sua vontade democraticamente expressa, dada a experiência que tem vindo a acumular face à política anti-social do governo "socialista", no essencial ditada pela União Europeia e à consequente recusa de submissão do Tratado de Lisboa a referendo popular, de tal modo receia que este seja massivamente rejeitado, como recentemente o fizeram os irlandeses, depois dos franceses e dos holandeses terem, por sua vez, recusado o Tratado Constitucional em 2005. 

Lá como cá é necessário respeitar a vontade da maioria.
20 de Novembro de 2008

José Marques Guimarães


  
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Edição:

N.º 184
Ano 17, Dezembro 2008

Autoria:

José Marques Guimarães
Universidade Aberta, Lisboa
José Marques Guimarães
Universidade Aberta, Lisboa

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