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Crise financeira rompe o idílio entre capitalistas e países emergentes

Uma nacionalização criticada na Argentina, ataques às moedas do Leste Europeu, pânico nos mercados russos: a ilusão dos países emergentes em relação ao seu progresso económico pode cair por terra e privar de vez os mercados de um dos seus apoios mais seguros dos últimos anos.
"Nenhuma região está imune" à crise mundial, resume Christine Li, da agência de classificação Moody's, comparando a periclitante situação actual à saúde invejável do mundo emergente no início do ano, cheio de oportunidades para as empresas ocidentais.
Para Jean-Louis Mourier, da casa Aurel, o vigor das economias asiáticas, europeias do leste e latino-americanas "serviu durante muito tempo como amortecedor das empresas muito globalizadas", preservando-as das turbulências financeiras.
No entanto, um primeiro alarme soou no último trimestre no mercado das matérias-primas, coincidindo com o fim dos Jogos Olímpicos de Pequim, gerando temores de uma desaceleração dos investimentos chineses. Os preços do petróleo e do aço foram os primeiros a cair.
As acções das poderosas mineradoras BHP Billiton e Rio Tinto, da líder mundial da siderurgia ArcelorMittal e da gigante americana do alumínio Alcoa, agonizam: em três meses, perderam, respectivamente, 47% e 55% em Londres, 65% em Paris e 68% em Nova York.
O pessimismo do Fundo Monetário Internacional (FMI) nas suas recentes previsões sobre o crescimento mundial ampliou os temores dos investidores em relação às "empresas de infra-estrutura e construção", sustentadas até agora pelos seus contratos nos países emergentes.
A crise financeira foi o último golpe, acentuando "os riscos de suspensão de pagamentos" para os Estados mais vulneráveis, particularmente "aqueles que se apoiaram demais nos capitais estrangeiros para financiar o seu crescimento", indicou Li, citando como exemplo os casos da Argentina, países bálticos, Turquia, Hungria e Ucrânia.
A decisão de Buenos Aires de nacionalizar o seu sistema de pensões foi interpretada como uma tentativa de "lançar mão da poupança dos cidadãos para evitar o que seria a sua segunda derrocada numa década".
Julgada hostil por grupos estrangeiros, a nacionalização derrubou nesta semana a bolsa de Madrid, arrastada pelas empresas mais presentes na Argentina, como a petroleira Repsol e a operadora Telefónica. A francesa Alstom, que tinha entre os seus projectos a construção, agora congelada, de um comboio de alta velocidade na Argentina, também viu as suas acções caírem em Paris.
A fragilidade financeira de alguns países do Leste, ilustrada pela queda das moedas húngara e polaca e pelas advertências da Standard and Poor's sobre a dívida russa, levou a uma escalada "das preocupações dos bancos expostos nesta região, como a Société Génerále" [francês].
Jean-Paul Pierret, director de estratégias da Dexia, querendo remar contra a maré, classifica, como "absurdos" os reveses indiscriminados sofridos pelos grupos implantados nos países emergentes, dizendo que "a situação não é homogénea, e a China não é a Hungria". Mas esta reflexão deve demorar ainda, lamenta o analista, "enquanto o mercado continuar a dar a impressão de que é incapaz de realizar a mínima análise nas últimas semanas".
É no entanto evidente que é preciso, pelo menos, mudar a linguagem e que a análise sobre o futuro deve vir das pessoas e já não dessa entidade mítica que é o mercado.

AFP


  
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Edição:

N.º 183
Ano 17, Novembro 2008

Autoria:

AFP
Agence France-Presse
AFP
Agence France-Presse

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