Toda a sociedade tem uma cultura. Toda a sociedade, seja esta
Estado-Nação, Etnia, República, Monarquia, Aldeia, Bairro, no presente ou no
passado. Estejam ou não em Federação em Convénio em concorrência ou em união.
Toda a sociedade tem uma cultura. Denomino por sociedade a interacção de indivíduos
que sabem gerir uma mesma memória social semelhante e transferir os conceitos
da memória às sucessivas gerações através do tempo e conforme a hierarquia do
seu estar no social ? seja este classe, estrato, o outro tipo de agruparão de
indivíduos que no seu conjunto formam esse grupo que partilha a dita memória
social comum. De forma adequada ou de forma conveniente; adequada, porque existe
um estatuto que diz como transferir o saber, a sua estrutura e o processo de
ensino e aprendizagem; conveniente por ser o hábito desses indivíduos se classificarem
mutuamente. Na base de padrões culturais.
Padrões culturais quer dizer que toda a sociedade tem uma cultura. Conceito
que não define a erudição do grupo social ou dos seus indivíduos bem como eu
gosto de entender, define as ideias com as quais o social manipula a materialidade
do seu grupo para a sua reprodução, seja esta biológica ou económica, seja ainda
do saber da tradição e o de aceitar as novas ideias. Por outras palavras normas
que a memória social acumula e que fazem do saber uma via para orientar o comportamento.
Comportamento que é diferente entre os adultos e as crianças do mesmo grupo
social. Porém, toda a sociedade tem duas culturas: a do adulto e a da infância.
A do adulto caracteriza-se desde os tempos de Aristóteles em 342, retomado por
Tomás de Aquino em 1267, continuado por Adam Smith à maneira presbiteriana em
1776 e recolocado na lógica dos povos, desta vez orientais e ocidentais, em
1979 por Milton e Rose Marie Friedman, pela sua capacidade de optar. Um adulto
vive do imaginário do real que abstrai conceitos em cifras e em emotividade,
convenientes ou não, para o seu objectivo de maximizar os recursos produtivos
e reprodutivos de si, os seus seres mais chegados, os parentes amigos e vizinhos
ou simplesmente dos seus associados. Este grupo adulto é quem define o que uma
criança deve aprender para saber e agir de forma conveniente. No entanto a criança,
esse ser do 0 anos até à sua maturidade, anda a entender a vida e como ela se
desenvolve. Com surpresa. Com emoção. Com experimento. Sem experiência. A "tactear"
o mundo dos adultos enquanto define a sua própria interacção entre os seus iguais;
através dos brinquedos, das brincadeiras, dos jogos, da imitação, da vadiagem,
a disciplina, a subordinação aos seus iguais que parecem entender melhor do
que um deles, a realidade que andam a experimentar. Eis que a criança concebe
ao mundo através do seu próprio entendimento que se vai formando na medida do
crescimento e do seu estar ao pé de adultos nos quais confia e dos quais retira
maneirismo que reproduz à sua maneira. Epistemologia que leva com ele no dia
que desde a cultura conveniente entre a cultura adequada, informatizada para
ele pelos programas escolares, pela preocupação dos seus adultos de que esses
programas sejam entendidos, pelo meio da criança de não entender como essa parte
da realidade encalha no seu quotidiano experimental. Por usar os conceitos de
Hegel de 1808, a infância percebe perante si uma antítese que deve confrontar
com a sua teses ou interpretação conceptual da memória social local. A síntese
nem sempre é feliz. É, como tenho observado durante 28 anos na Galiza, durante
18 anos em Portugal, durante 10 anos na França, durante 6 anos em países da
América-latina e da África, é, reitero resultado essa sínteses do contexto social
que a criança lhe calha viver.
Porém, formam um grupo de conceitos que denomino a epistemologia da Infância
e que é preciso entender de conhecer, debater entre adultos, para poder ser
usada como a melhor via que estrutura o processo de ensino e aprendizagem.
Raúl Iturra
Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa
ISCTE/Lisboa
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