"E de repente, quando iam para a escola, Eugénia e a
sua irmã notaram que
as andorinhas tinham voltado, anunciando-lhes a primavera."
(Finalmente - Leituras para a 4ªclasse, 6ªedição,
s/d)
Num artigo do DN ("Negociar tudo nas escolas",
17/3/01, p. 57), que passou quase desapercebido (talvez por ter sido inserido
na secção "emprego" onde o seu autor colabora assiduamente), Fernando
Santos lembra que "nos últimos vinte e seis anos não houve um
único ministro da Educação que não fosse contestado
pelos estudantes." Perante tal regularidade, o actual ministro, numa entrevista
ao Público (18/3/01, pp. 2-4), e procurando desvalorizar a contestação,
"responde" (fazendo teoria como académico que se preza) com
outra regularidade: "em educação, a paz social é relativa
e tem uma natureza sazonal o que, aliás, faz com que haja picos de contestação
no início da Primavera". Para além das andorinhas temos agora
também este indicador para marcar o início do ciclo primaveril!
O Governo iniciou o seu primeiro mandato pronto a dialogar
com tudo e com todos, disposto a encontrar "parceiros e protagonistas" nos consensos
alargados, consubstanciados nos "dez compromissos de acção" inscritos
no Pacto Educativo para o Futuro (documento de trabalho tornado público
logo em Fevereiro de 1996, do qual Augusto Santos Silva foi um dos seus autores
materiais). Era a época da "paixão", da Educação
como grande desígnio nacional. Transcorridos nem meia dúzia de
anos, o balão das intenções aglutinadoras esvaziou-se:
o ME não conseguiu estabelecer um "pacto", nem tão pouco
uma "união de facto", antes se pôs de candeias às
avessas com os principais actores educativos e com a generalidade das forças
político-partidárias(*). Estudantes, professores e pais contestam-no
nas ruas, os partidos isolam-no, politicamente, na Assembleia da República
. O "divórcio" é por demais evidente.
Perante esta ruptura vislumbra-se um novo "namoro".
Surge a confluência dos sindicatos, das associações de pais
e do movimento associativo estudantil em redor das intervenções
proferidas pelo Presidente da República. Não é de admirar,
pois é mais fácil o acordo à volta dos discursos (de diagnóstico
do Presidente) sobre o estado de "degradação total da realidade
escola" do que em torno das medidas (concretas do Governo) no planeamento e
gestão das políticas definidas.
As participações do Presidente, quer no XXVI
Encontro Nacional das Associações de Pais (17/3/01) onde deu visibilidade
às vulnerabilidades do sistema "o insucesso escolar e a desmotivação
dos estudantes, por um lado, e a indisciplina e a violência, por outro",
quer no VII Congresso Nacional da Fenprof (21/3/0) em que manifestou "o sentimento
de urgência " face à necessidade de mudar a educação
no nosso país", revelam bem o protagonismo acrescido que procura impor
no exercício do seu segundo mandato. Bom prenúncio. Ainda que
da "magistratura de influência", na esfera educativa, não
seja de esperar mais do que "ralhetes" e "puxões de orelhas".
Entretanto, resta-nos desejar ao ME uma Primavera breve e uma
longa silly season, na qual se cumpra a tradição académica
de ver "a contestação" esvair-se nas águas cálidas
do litoral, devolvendo assim a paz social aos timoneiros da 5 de Outubro.
Luís Souta
Instituto Politécnico de Setúbal
(*) Muito recentemente a bancada socialista votou contra
toda a oposição, chumbando a proposta de suspensão do processo
de Reorganização Curricular (apesar da votação ter
ficado empatada). Independentemente de apoiarmos o prosseguimento da "Reforma",
este votar sozinho não é bom sintoma na política educativa.
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