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Profissão Educador Social - "PROFISSIONAL DO TRIÂNGULO"

Em tempo de reforma social, que temos vindo a vivenciar, há que enfatizar o papel que tem de assumir o Educador Social, enquanto agente de mudança.
Assim, nos mais diversificados contextos de intervenção, deste profissional, queremos particularizar a atenção para, a acção privilegiada que o Educador Social pode ter, junto de todos aqueles idosos que são marginalizados pela nossa sociedade. Sociedade essa, que de modo directo ou indirecto, tem "arranjado" mecanismos para não permitir a participação e intervenção desses mesmos idosos.
Com efeito, e segundo Alfredo Bruto da Costa (1998), "o problema social dos idosos, é um dos mais graves problemas sociais, e a maior parte das soluções em vigor é insatisfatória e contribui para criar nas pessoas e na opinião pública, a ilusão de que o problema vem sendo resolvido".
Importa assim, reflectirmos sobre qual o contributo que o Educador Social pode dar, não só, na tentativa de melhorar a qualidade de vida dos idosos, como também de toda uma sociedade, tal como refere Corominas, "compete à sociedade melhorar a qualidade de vida do indivíduo, aquando do seu envelhecimento".
Actualmente, vivemos numa sociedade, que bem se pode designar por "sociedade do espectáculo", onde, só cabem os cidadãos que mantenham um vínculo com o trabalho, e os que consigam exibir-se de algum modo.
No que se refere ao trabalho, reside logo o grande problema para os idosos, pois com a chegada da reforma, deixam de ter vínculo com o trabalho, ou seja, deixam de "interessar" à sociedade.
Como assinala André Gortz "o que nós chamamos trabalho é uma invenção da modernidade. A forma em que o conhecemos, o praticamos e o situamos no centro da vida individual e social foi inventada e logo generalizada com a revolução industrial(...) é então graças ao trabalho remunerado que adquirimos nossa condição de cidadãos, conseguimos uma existência e uma identidade social, estamos inseridos numa rede de relações e intercâmbios sociais".
Assim, podemos dizer que, na cultura ocidental, o trabalho, porque é muito valorizado, é fundamental para a integração social e obviamente também para a exclusão.
Com efeito, durante o período profissional é exigido comprometimento total com a profissão, por isso, a maior parte das pessoas vê-se privada de muitas actividades extra -profissionais. A sociedade impõe necessidade do desempenho da profissão, e essa mesma sociedade exige mais tarde a cessação dessa função.
Face a isto, podemos dizer com toda a legitimidade, que toda a actividade de uma vida, termina com a chegada da reforma.
No entanto, a reforma não deve ser sinónimo de inutilidade ou inactividade, antes pelo contrário, ela deve proporcionar ao indivíduo um tempo de repouso e de relaxamento, mas também de valorização pessoal.
Porém, se esse momento não for devidamente preparado, poderemos estar, isto é, estamos mesmo, perante um problema que tem grandes probabilidades de desencadear graves consequências a nível psicossocial.
No que concerne à exibição de algo, e face aos valores que predominam, os idosos também não têm nada para oferecer à "sociedade do espectáculo".
Assim sendo, sem trabalho e sem ocupação do tempo, os idosos tornam-se num grupo estigmatizado, com óbvias dificuldades de integração na sociedade, apesar da sua forte vontade de estarem integrados.
Talvez por "problemas de consciência social" a tal "sociedade do espectáculo" tenta arranjar umas (pseudo)soluções. Destas, destacamos algumas formas de ocupação do tempo, tais como, os "passeios para idosos", as "colónias de férias para idosos", o "campismo para idosos", o "turismo para idosos", e porque está na moda, qualquer dia o "big brother para idosos", que não são mais do que meras formas desestruturadas e pontuais produzidas pela "sociedade do espectáculo".
A este respeito, Alfredo Bruto da Costa(1998) afirma: "quanto a essas actividades, é de notar que as mesmas tendem a agravar a «ghetização» dos idosos, ao desintegrá-los do resto da sociedade. Pondo-os a conviverem entre si, poderão atenuar a solidão, mas não proporcionam a possibilidade de conviverem com as outras idades, como é próprio da vida".
Enfim...
O que tenho a dizer, é que, é prioritário e mesmo imperioso que para os idosos exista uma ocupação em qualquer actividade que lhes dê prazer e os faça sentir úteis, pois, a falta de ocupação, tem efeitos nefastos sobre qualquer ser humano. No entanto, tais actividades têm que ser planificadas de um modo coerente e acima de tudo, enquadradas numa perspectiva humanista, e nunca, como têm sido, numa perspectiva de espectáculo, para a tal "sociedade do espectáculo", de tenho vindo a falar.
Há assim que ir contra à filosofia do individualismo que impera na nossa sociedade, na perspectiva de se recuperarem os sujeitos colectivos, de modo a caminhar-se para uma sociedade mais solidária. Então, é preciso mudar, e para isso, há que experimentar um pouco por toda a parte nas condições naturais, pois, a qualidade de vida dos idosos num futuro próximo, dependerá das mudanças na forma como a sociedade perceber e responder ao envelhecimento. Sociedade essa que, segundo Kofi Annan deve ser para todas as idades e longe de representar os idosos como doentes e aposentados, os deve considerar agentes e beneficiários do desenvolvimento.
Para isso, na minha perspectiva, há que ter em conta o triângulo, cujos vértices são: o trabalho, a reforma e as ocupações.
O principal agente dinamizador desse mesmo triângulo, deve ser o Educador Social, profissional melhor apetrechado para ajudar a construir projectos de vida, que tendo em conta essas três vertentes, evitará a marginalização do ser humano, quando idoso. Período de vida em que ainda há muito para dar, pois:
- os idosos ensinam a simplicidade;
- os idosos ensinam a interdependência;
- os idosos, com a sua busca de companhia, desafiam uma sociedade em que os mais fracos são frequentemente abandonados a si mesmos, lembrando a natureza social do Homem e a sua necessidade de voltar a tecer a rede de relações interpessoais e sociais.
Corrigir assim a actual representação negativa da velhice é um compromisso cultural e educativo que deve envolver todas as gerações, e que necessita do "profissional do triângulo", que é, sem sombra de dúvida, o Educador Social, que emerge nos dias de hoje, para assim, de modo decisivo contribuir para a valorização do SER sobre o TER, permitindo assim, caminharmos da "sociedade do espectáculo" para a "sociedade da integração".

Paulo Gaspar
Universidade Portucalense


  
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Edição:

N.º 96
Ano 9, Novembro 2000

Autoria:

Paulo Gaspar
Univ. Portucalense, Porto
Paulo Gaspar
Univ. Portucalense, Porto

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