Adivinha-se um mundo de contradições por detrás deste desabafo. No interior do mundo de cada um e entre o mundo de cada um e o dos outros. Porque a "minha" escola ainda é a escola da minha infância, ligada à representação da importância dos saberes, evidentemente, dos saberes que têm importância para mim, daqueles que constituem a "minha" disciplina ou daqueles que fazem parte da minha identidade. Mas também pode acontecer que a "minha" escola já não seja, antes de tudo, o lugar da reprodução dos saberes, ou dos saberes que eu valorizo, pensando que eles são os verdadeiros saberes da escola. Afinal, a "minha" escola também pode ser o espaço onde já têm, hoje, lugar os que, há alguns anos atrás, ainda não eram alunos, cujos pais nunca foram alunos e, por isso, são, hoje, "maus" alunos, porque o "bom" aluno não é uma coisa que seja só porque se entra na escola. O aluno não é uma vocação natural. Toda a gente sabe disso. Mas agora não basta saber. Agora, que se nota bem que há na escola muito mais indivíduos que alunos e que, portanto, é preciso ir "fazendo" os alunos antes que eles o sejam de facto, mais que saber, é preciso transformar-se e isso significa que a "minha" escola também tem de ser a escola deles. Como dizia alguém, que vivia intensamente esta contradição entre a "sua" escola e a escola "deles", "só agora é que estes alunos começam a merecer atenção" porque os professores, aflitos, não sabem lidar com eles nem com a sua indisciplina". De facto, a "sua" indisciplina é a disciplina deles, justamente porque não é possível separar a sua vida da vida da escola por efeito dalgumas operações de mágica magistral. Sabemos que há projectos, currículos alternativos, flexibilidade curricular, um mundo de possibilidades político-administrativas. Mas que fazer de tudo isso, se nada disso é a "minha" escola? Ou que fazer de tudo isso, se esta é a "minha" escola, mas não é a "tua"? Tudo pareceria extremamente simples se, afinal, a "minha" e a "tua" combinada com a "deles", pudesse ser a "nossa". Todavia, para que isso seja possível, será necessário admitir qualquer coisa de comum, não é? Coisa irremediavelmente complicada num horizonte educativo dominado pela concorrência... Manuel Matos Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação / Universidade do Porto
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