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Universitários 'Invadiram' Lisboa

A maior manifestação de sempre. Pelo menos, é assim que os estudantes do ensino superior classificam a concentração que ocorreu a 25 de Março em frente à Assembleia da República. Motivo: pedir a revogação da actual Lei de Financiamento. O próximo passo é o pedido da cabeça do ministro.
É ponto assente que foi a maior manifestação deste Governo, mas há quem garanta que superou as dos tempos áureos da contestação contra as propinas do PSD e principalmente o record de 1994, quando a pasta da Educação era ocupada por Manuela Ferreira Leite.
Os próprios dirigentes estudantis ficaram surpreendidos com a adesão. Eram esperados cinco mil estudantes, mas só de fora de Lisboa este número foi ultrapassado. Da Universidade do Porto, por exemplo, deslocaram-se a Lisboa 1500 alunos, o que contrasta com os 300 da última manifestação. Do Politécnico da Guarda e da Universidade de Coimbra eram 3.500, mas também vieram estudantes da Universidade da Beira Interior, Faro, Évora, Trás-os-Montes, Minho, Beja, Portalegre e Aveiro. Cerca de 500 universitários dos Açores, dada a impossibilidade de estarem presentes, saíram à rua, em Ponta Delgada, para pedir a revogação.
O próprio ministro da Educação acusou o efeito dos números e, em vez do habitual discurso de que as acções contestatárias constituem um direito dos estudantes, disse tratar-se de uma concertação entre a Juventude Social Democrata (JSD), o PCP e a Federação Nacional dos Professores (Fenprof).
Uma reacção que valeu a Marçal Grilo críticas por parte dos estudantes. O presidente da Associação Académica de Coimbra (AAC), António Silva, diria que o ministro estava 'embaraçado politicamente', e o presidente da Associação Académica do Porto (FAP), Ricardo Almeida, acrescentaria que a frase é 'à rasca'.
Quanto a uma eventual concertação de forças políticas da oposição e da Fenprof, António Monteirinho, presidente da Federação Nacional das Associações de Estudantes do Ensino Superior Politécnico (FNAESP), fez questão de afirmar que é 'militante da Juventude Socialista, o que é prova inequívoca de que não só essas associações (da oposição) que estão na manifestação.
Feitas as contas, um em cada mil portugueses e cinco em cada cem estudantes do ensino universitário público pediram ao ministro que suspendesse e revogasse a lei. Uma última oportunidade dada pelos estudantes a Marçal Grilo. Caso não volte atrás com a Lei-Quadro de Financiamento, a próxima revogação pedida é a do ministro da Educação, com greve nacional em todas as faculdades do País.
O facto da manifestação ter coincidido com o funeral do Cardeal Patriarca de Lisboa, D. António Ribeiro, motivou alguma contenção dos actos e das palavras de ordem dos estudantes. Além disso, fizeram um minuto pela morte do Cardeal e souberam manifestar-se de forma pacífica e ordeira.

Dia do Estudante em protesto

A manifestação nacional em frente à Assembleia da República foi antecedida de uma 'maratona' de meia centena de estudantes de Coimbra, que fizeram um percurso de 40 quilómetros a pé, desde Mafra até Lisboa, pela Estrada Nacional 8. Uma espécie de preâmbulo da 'manif', pela qualidade de ensino, que coincidiu com o Dia do Estudante.
Este dia dedicado aos alunos foi aproveitado pelos universitários de todo o País para protestarem contra o que consideram estar mal nas respectivas faculdades. No Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), em Lisboa, por exemplo, fecharam-se as portas durante todo o dia e os estudantes reuniram-se em assembleia geral.
Na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto tentou-se mostrar que as aulas não funcionam se todos os alunos estiverem presentes. Simplesmente porque não cabem todas, sobretudo nos primeiros anos dos cursos, em que há mais alunos inscritos.
Em Psicologia houve greve às aulas, com uma adesão total da parte da manhã e, à hora do almoço, em conjunto com os estudantes da Faculdade de Direito (funcionam nas mesmas instalações) fizeram um churrasco como forma de protesto por não existir cantina naquele pólo.
O motivo de preocupação dos estudantes da Faculdade de Economia do Porto prende-se com a saúde pública. Marcaram uma conferência de imprensa e, mais uma vez tentaram chamar a atenção para a necessidade de substituir o pavimento da faculdade, uma vez que contém amianto, uma substância cancerígena.
Como as empresas que se candidataram para fazer a obra em Economia apresentaram orçamentos superiores às verbas disponibilizadas pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional, o conselho directivo, por considerável falta de verbas, considera a possibilidade de usar o dinheiro das propinas, o que os alunos recusam terminantemente. Se a obra não for feita nas férias do Verão, os alunos ameaçam com greve no início do ano lectivo.

Cursos de Medicina em análise

Enquanto se movem influências para obter um curso ou uma faculdade de medicina nos vários concelhos que se apresentam como candidatos, já foi decidido em Conselho de Ministros que o 'numerus clausus' vai aumentar e os cursos de medicina vão ser reestruturados. Uma boa notícia para os que vão entrar nos próximos anos e para os que lá estão, que irão ter uma formação mais prática.
Ao todo são 18 os concelhos que pedem um curso de Medicina, uma faculdade ou uma escola de ciências da saúde e tudo indica que deverá 'nascer' no Interior do País. O grupo de trabalho chefiado por Diogo Lucena tem até Setembro para dizer qual o local.
Quanto ao aumento do número de vagas no ensino superior público, o Ministério da Educação aguarda, agora, os pedidos das Instituições para considerar o crescimento gradual do 'numerus clausus'. Mas a questão não é pacífica, pois as escolas fazem algumas exigências em troca de uma maior abertura: querem a alteração do rácio docente/aluno, que é actualmente de 1/6, e do sistema de articulação com os hospitais.
O ministro da Educação considera que as relações com as unidades hospitalares têm de ser revistas (já existe um grupo de trabalho para analisar o assunto) e sublinha que o surgimento de uma nova faculdade nesta área levará a que as já existentes repensem o que oferecem. Uma questão que promete mais desenvolvimento.

Luísa Melo


  
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Edição:

N.º 67
Ano 7, Abril 1998

Autoria:

Luísa Melo
Jornalista
Luísa Melo
Jornalista

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