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Você sabe fazer raiz quadrada?

Alheias aos trágicos efeitos das suas práticas, as escolas ‘normais’ vão entupindo a memória dos alunos com informações que eles não relacionam com o mundo real. Vão preparando projetos para os alunos, quando deveriam construir projetos com os alunos.

“Vou tirar o meu filho desta escola. Vou levá-lo para uma escola normal. Aqui, eu sei que ele é feliz, mas será que aprende? Com este método, ele conseguirá entrar na universidade?”
Não me surpreende a preocupação e o desabafo da mãe do Thiago. Mas confesso a minha irritação face à argumentação com a qual uma professora da escola ‘normal’ persuadiu a ansiosa mãe a trocar de escola: “Aqui, o seu Thiago vai aprender todo o conteúdo que precisa. Nós trabalhamos à moda antiga, como a senhora gosta. A senhora não acha que antigamente é que se aprendia?”
A pérfida mestra fez-me evocar um delicioso texto, publicado pela PUC de Campinas, e que a contradiz: “A escola de antigamente nunca foi de boa qualidade”. Por coincidência, ou talvez não, no decurso de uma palestra, um professáurio proferiu frase idêntica à da mestra da escola ‘normal’: “Isso que você diz é muito bonito, mas antigamente é que se aprendia. Na terceira classe, eu já sabia mais conteúdo do que a minha filha, que já está no nono ano.”
Deselegante, porque a paciência tem limites, respondi-lhe com uma pergunta: “O colega completou o Ensino Básico com aproveitamento?”
A resposta foi uma risada coletiva. Insisti, perguntando a mais de um milhar de professores ali presentes se tinham aprendido todos os conteúdos do currículo do Básico.
“Claro! É evidente!”, responderam em coro.
Completei o questionamento: “Sabeis fazer raiz quadrada?”
Um perturbador silêncio se seguiu à inusitada pergunta.
Alguns, poucos, ergueram o braço. Possivelmente, professores de Matemática…
Com uma ponta de sadismo (confesso) insisti: “Então, aprenderam ou não aprenderam esse e outros conteúdos?”
Fica evidente que não aprenderam. Decoraram, vomitaram a raiz quadrada numa prova e… esqueceram-na. Aliás, esqueceram a maior parte dos conteúdos supostamente aprendidos.

É o que nos dizem as pesquisas. Alheias aos trágicos efeitos das suas práticas, as escolas ‘normais’ vão entupindo a memória dos alunos com informações que eles não relacionam com o mundo real. Vão preparando projetos para os alunos, quando deveriam construir projetos com os alunos. Despendem significativa parte do seu tempo a fazer planeamentos de aulas, sedimentando processos de heteronomia, quando deveriam ensinar os alunos a planejar, a saber gerir tempos, recursos, a desenvolver senso crítico e autonomia intelectual.
Os professores das escolas ‘normais’ ainda creem que, dando aula, ensinam. Promovem acumulação cognitiva, quando deveriam efetuar mediação pedagógica, cocriar guiões de pesquisa, provocar aprendizagens, sem confundir prova com avaliação, ou confundir avaliação com classificação.
Também ajudaria que lessem o Bruner e avidamente estudassem outros autores, cujas obras os ajudariam a perceber o que seja aprendizagem significativa – gostaria de saber que livros os candidatos a professores leem na faculdade…
Nas escolas ‘normais’, o jovem engole sebentas, aliena-se do mundo para se concentrar no objetivo maior: entrar numa faculdade. Se, decorridos alguns anos, esse jovem e os professores da sua faculdade fizerem o mesmo exame que lhes deu acesso à Universidade, provavelmente, não conseguirão ser aprovados. Quantos ‘bons alunos’ detentores de

José Pacheco 


  
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Edição:

Edição N.º 200, série II
Primavera 2013

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