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O Universo “invisível”

Os resultados alcançados pela Cosmologia nas décadas recentes, conduzindo à descoberta, por inferência, de “matéria escura” e de “energia escura”, são paradoxais. Depois dos passos gigantescos dados no século passado, a Cosmologia questiona agora os fundamentos da Física.

A Cosmologia desenvolveu-se surpreendentemente durante o passado século. As descobertas de métodos para medir a distância de estrelas e a sua velocidade proporcionaram a cartografia em larga escala do Universo em movimento. E a invenção de equipamentos muito mais sensíveis e sensíveis a um espectro de radiação muito mais largo, desde as micro-ondas à radiação gama e raios cósmicos, alargou muito a janela de observação dos corpos celestes os mais remotos – no espaço e no tempo. A prova empírica da expansão do Universo, apurada pela pesquisa de Edwin Hubble, foi um passo de gigante no conhecimento cosmológico. O norteamericano trabalhou durante as décadas de 20 e 30 do século passado com o maior telescópio óptico de então, em Mount Wilson (Califórnia). Hubble sistematizou os desvios espectrais na luz emitida por certas estrelas variáveis, Cefeides, para concluir que o Universo é constituído por muitas galáxias autónomas, muito para além da nossa Via Láctea – que anteriormente se julgava preencher todo o espaço. E mais inferiu que as distintas galáxias se afastam umas das outras com velocidade proporcional à respectiva distância. Tal veio conferir verosimilhança a uma teoria de Big Bang, de harmonia com a proposta de Georges Lemaître (1927). À luz da teoria da relatividade geral (1917), tal significaria uma dilatação uniforme do espaço. Para Albert Einstein, essa descoberta foi surpreendente, posto que havia optado por um modelo de Universo estacionário, no qual, para contrapor e equilibrar a atracção gravítica entre estrelas e galáxias, havia postulado uma força repulsiva através do espaço, teoricamente substanciada numa “constante cosmológica”.
Nas últimas décadas, o mapeamento mais extensivo do Universo foi evidenciando que a velocidade de rotação das galáxias é, como regra, mais rápido do que aquela que a atracção gravítica exercida pela sua massa central sobre as estrelas na sua periferia permitiria suportar. Ou seja, que deverá haver massa invisível no núcleo das galáxias que mantenha a sua integridade ao longo de milhares de milhões de anos. Tal massa invisível é designada “matéria escura”. Por outro lado, a observação sistemática do brilho de certo tipo de Supernova permitiu, mais recentemente (desde fins da década de 90), descobrir que as galáxias divergem a uma velocidade que na realidade se vem acelerando. Isto é, o Universo exibe expansão acelerada, e não desacelerada, como se supunha. A gravidade universal por si só actuaria no sentido de retardar a expansão do Universo. Tal descoberta significa que existe uma ainda misteriosa força que, contrapondo-se à força da gravidade, não só a equilibra mas até a excede. Tal força misterios é manifestação de uma designada “energia escura”. As Cefeides são estrelas variáveis cuja luminosidade oscila a uma frequência que está correlacionada com a respectiva massa (e brilho). Começaram a ser estudadas sistematicamente no início do século passado. Essa oscilação é explicada à luz de mecanismos de retroacção entre temperatura, pressão e opacidade do material estelar, no campo gravítico da estrela. As Supernovas são fases explosivas atingidas por alguns tipos de estrelas, que nessa fase emitem um muito intenso impulso de radiação e/ou matéria. No caso de sistemas binários em que uma das duas estrelas é uma anã branca, esta é objecto de explosão termonuclear quando, por acreção de massa oriunda do seu par, atinge uma certa massa crítica (limite de Chandrasekhar). O impulso luminoso é semelhante em todas as ocorrências deste evento. Quer Cefeides quer Supernovas tiveram (têm) um papel importantíssimo no estabelecimento das distâncias entre as galáxias, posto que, sendo nesses casos conhecido o brilho absoluto das estrelas, a luminosidade aparente detectada permite calcular a distância a que a estrela se encontrava quando emitida a luz que é observada. Os resultados alcançados nas décadas recentes, conduzindo à descoberta, por inferência, de “matéria escura” e de “energia escura”, são paradoxais. A Cosmologia, depois de ter dado passos gigantescos ao longo do passado século, presentemente questiona os fundamentos da Física.

Rui Namorado Rosa


  
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Edição:

Edição N.º 195, série II
Inverno 2011

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