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A idade de ouro dos medíocres

O decadentismo, fenómeno mental e cultural transversal a vários contextos epocais, obedece, no essencial, a um percurso mental comum, desde a crença jovem nos ideais igualitários e na natureza inocente do homem, na linha de Rousseau, passando à primeira maturidade, esta última insegura e rarefeita de ideias sólidas, definida por um conservadorismo cómodo, no qual muitos se atolam por conveniência pessoal ou mera estultícia e, finalmente, culminando no reconhecimento da verdade do socialismo, embora esta conclusão assente numa disposição mental negativa e decadente.
Nesta linha devem recordar-se os exemplos de homens como os “vencidos da vida”. No século XIX, descrentes na possibilidade de se efectuarem significativas mudanças em Portugal, por força do obscurantismo latente e do misoneísmo idiossincrático do português. No século XXI, e decorridos mais de cem anos, a mesma pobreza mental caracteriza a maior parte da intelectualidade nacional, sempre ciosa de tempos que, na verdade, nunca existiram.
Neste processo, estagnam no atoleiro dourado, articulistas, auto-denominados sábios, sociólogos, politólogos, economistas, pugnando cada um à sua maneira pela defesa da filosofia do capital e do mercadocentrismo, enfim, pelo regresso a uma idade de ouro na educação, no trabalho, nos valores e nos costumes, que em boa verdade nunca existiu. Defendem o regresso aos valores retrógrados do servilismo e da rigidez das hierarquias, criminalizando o socialismo com exemplos históricos falaciosos e inadequados de que se servem oportunisticamente. Face à força poderosa do capital, inúmeros pensadores enveredam pela descrença, configurando o surgimento de novos períodos decadentistas, cuja expressão artística e científica se traduzirá em obras específicas, profícuas, mais tarde admiradas e perfeitamente compreendidas. 

Paulo F. Gonçalves


  
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Edição:

Edição N.º 192, série II
Primavera 2011

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