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Televisão educativa e cultural em Portugal

O sistema televisivo português não dispõe de um serviço exclusivamente dedicado à programação educativa e cultural. É possível encontrar nos canais generalistas alguns programas que respondem a estes objectivos, embora tenham uma presença pouco significativa nas grelhas. A RTP2 é um caso diferente.

Foi publicado em Maio, pela editora espanhola Gedisa, o «Libro Blanco sobre la Televisión Educativa y Cultural en Iberoamérica», sob a coordenação de Lorenzo Vilches e José Manuel Pérez Tornero, professores na Universidade Autónoma de Barcelona. Trata-se de uma primeira obra que reúne contributos sobre a origem, contexto e estado actual das televisões educativas e culturais de 10 países iberoamericanos: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México, Espanha, Peru, Portugal, Uruguai e Venezuela.
O capítulo referente a Portugal foi elaborado por Sara Pereira e Luís Pereira, investigadora e doutorando, respectivamente, no Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade da Universidade do Minho. Neste capítulo, os autores descrevem e caracterizam a programação educativa e cultural emitida em 2008 pelos quatro canais televisivos generalistas portugueses (RTP1, RTP2, SIC e TVI). Na elaboração do estudo, uma das primeiras questões com que os autores se depararam foi com o próprio conceito de televisão educativa e cultural (TEC). De que se trata quando se fala em TEC? Levantada a questão e sem uma resposta definitiva e cabal, os autores seguiram um conceito abrangente de ‘programa educativo e cultural’, baseando-se, para a sua caracterização, no que está regulamentado, nos objectivos definidos para e pelos programas e na sua característica dominante. Assim, uma das orientações assentou no que está estabelecido no Protocolo assinado entre as três estações televisivas generalistas RTP, SIC e TVI em 21 de Agosto de 2003. Nesse Protocolo, entende-se por programação cultural “a apresentação, debate e divulgação das áreas artísticas, a saber, literatura, cinema, teatro, dança, pintura, arquitectura, música, artes plásticas, produção audiovisual e design, bem como do património, história, costumes e outras expressões de identidade cultural do país”.
O Protocolo mencionado não esclarece, no entanto, o que se entende por ‘programação educativa’, nem este conceito aparece explicitado noutro documento legal de regulação do audiovisual. Nestes documentos encontra-se apenas a recomendação (ou obrigatoriedade) de emissão de programação de natureza educativa, geralmente para o público mais jovem. Deste modo, a discussão do conceito ‘educativo’ permanece aberta, não havendo consenso nem um ponto de chegada relativamente ao entendimento do mesmo. Desde logo, considera-se que o significado de programa educativo pode variar em função do objecto olhado, bem como de quem o olha, analisa, produz e programa.
Uma das conclusões mais proeminentes do estudo é o facto de o sistema televisivo português não dispor de um serviço TV exclusivamente dedicado à programação educativa e cultural. É possível encontrar nos canais generalistas alguns programas que respondem a estes objectivos, embora, comparativamente com outro tipo de conteúdos, tenham uma presença pouco significativa nas grelhas. Um caso diferente é o da RTP2, que se apresenta como um serviço que tem como vocação a criação de espaços de programação para públicos específicos e que procura equacionar toda a grelha como uma proposta cultural.
Olhando-se para os dados referentes à relação oferta/procura ou emissão/recepção apresentados para cada canal relativamente aos conteúdos educativos e culturais, verifica-se que este género de programas tem uma baixa procura por parte da população portuguesa. Os autores relacionaram esta situação com a função ou o papel da TV para as pessoas. Como vários estudos têm demonstrado, a TV é usada sobretudo como meio de informação e de entretenimento. Os conteúdos educativos, principalmente estes, sobretudo quando seguem uma perspectiva demasiado colada aos princípios da escola, acabam por atrair pouco as audiências. Ora, nenhuma televisão, pública ou privada, pode sobreviver sem audiências, o que não significa que devam ser os números, as audiências e o interesse do público a comandar uma programação. A responsabilidade social dos mediaimplica uma atenção à qualidade da programação e, nesse sentido, à diversidade de conteúdos, de temáticas, de géneros, de formatos, de públicos, entre outros.
Neste sentido, os autores consideram que é uma filosofia de grelha e de programação, e não apenas de programa, que está em causa. Uma programação deveria ser enquadrada “dentro do princípio mais geral de procurar sempre exprimir um gosto, uma atitude, uma interrogação sobre a actualidade social, científica e cultural” [Jorge Wemans, RTP Newsletter Nº6, 2006]. Se esta for a filosofia, os programas de natureza cultural e educativa farão parte do ‘menu’ como fazem parte outro tipo de conteúdos. Além disso, é importante também saber cativar e sensibilizar o público para uma oferta desta natureza.
No final do capítulo, os autores anotam alguns aspectos para o desenvolvimento da TEC, bem como para uma melhor aceitação deste tipo de TV por parte do público, a saber:

– promover a educação para os media/literacia mediática – neste caso, a TV educativa dá lugar ao educar para ver TV, que passa, entre outros, por estimular os espectadores, com destaque para os mais novos, a um consumo criterioso e exigente;

– estimular iniciativas por parte da sociedade civil, de fundações e outros organismos com acção nestas áreas;

– promover acordos de auto-regulação – mais do que a imposição de leis e directivas, são uma boa forma de envolver e implicar os operadores na produção e emissão de conteúdos educativos e culturais (embora os protocolos entre instituições, nomeadamente entre as estações de TV, sejam vistos como mais um programa a cumprir, por vezes envoltos em burocracias, acabam, no entanto, por se revelar eficazes e produtivos);

– considerar as plataformas digitais com as quais a maioria dos cidadãos interage actualmente.

Sara Pereira

Universidade do Minho


  
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Edição:

Edição N.º 190, série II
Outono 2010

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