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Meu amigo José Paulo Serralheiro

Eu o conheci há quase duas dezenas de anos na cidade do México, num Congresso Internacional de Educação promovido pelo Sindicato Internacional de Professores.
Todos os convidados estavam no mesmo hotel e, na manhã do último dia do encontro, quando já todos iriam viajar de volta, ao entrar na sala em que serviam o pequeno almoço, só havia um lugar numa das mesas em que estava sentado um homem para mim desconhecido, que talvez me parecesse norte europeu. Pedi-lhe licença e me sentei. Logo, logo, nos identificamos como um português e uma brasileira. A nossa conversa fluiu na medida em que nos aproximávamos por afinidades eletivas. Nesta manhã tinha início uma relação que mais e mais se estreitou tornando-nos grandes amigos. Daí em diante, a cada ano, não importava o motivo de minha ida à Europa, ao final da viagem, parava sempre no Porto para encontrá-lo. E, de nossos encontros, decorriam novos planos de trabalho. Em todos estes anos, a cada mês lhe enviava um pequeno texto a ser publicado na rubrica “O lugar da escola”  em A Página da Educação. Em 2005 ele me propôs organizarmos um livro  - Afinal onde está a escola? ... afinal, esta era a nossa preocupação comum. Assim o fizemos. Já nenhum livro nos resta desta primeira edição no Brasil.
Com a sua doença, passei a lhe telefonar nos fins de semana à tarde e muito e muito conversávamos. Ele me dizia que o que o mantinha vivo eram os planos que estava sempre a criar. Jamais o vi ou ouvi desanimado. Se o jornal se tornava impossível, por injunções políticas e econômicas, então façamos uma revista eletrônica mensal ou mesmo sazonal, reagia ele, já envolvido no novo projeto. E o fez, chegando a ver o primeiro número  pronto.
No último dia em que lhe telefonei, ninguém atendeu. E era ele quem em geral atendia as minhas chamadas. No dia seguinte recebi a notícia que ele havia falecido na véspera. Não tivemos tempo de uma última conversa. Fica a saudade de um grande amigo. Fica a lembrança de tudo o que fizemos e do tanto que ainda pretendíamos realizar. Fica a certeza de que com a morte de um grande amigo, uma parte nossa também morre. Fica a tristeza da falta de quem tanto me ensinou com seu exemplo de intelectual militante, que lutava por um mundo outro, um mundo em que outros mundos pudessem coexistir,  um outro mundo que lhe parecia possível e pelo qual lutava, um mundo melhor em que mais solidariedade e justiça houvesse.

Regina Leite Garcia

 


  
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Edição:

Edição N.º 186, série II
Outono 2009

Autoria:

Regina Leite Garcia
Univ. Federal Fluminense, Rio de Janeiro, Brasil
Regina Leite Garcia
Univ. Federal Fluminense, Rio de Janeiro, Brasil

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