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Carta aberta à Senhora Ministra da Educação

Sou professor e tenho um afilhado que anda no 9º ano e é um gazeteiro por excelência. O seu pai, meu grande amigo, desesperado, pediu-me para o ajudar ao que eu acedi prontamente. Ficou decidido que o Manuel, meu afilhado, passaria umas horas comigo por semana de forma a eu ajudá-lo na vida escolar em particular na matéria curricular. 

No primeiro dia sentou-se à minha frente e com o seu bom humor que me encanta disse-me: "Sou todo seu padrinho! "
- Que sugeres Manuel? Tens Tpc`s?
- Não.
- Muito bem. Vais fazer uma redacção sobre?sobre a crise financeira mundial.
- Padrinho, não sei do que está a falar?
De facto eu próprio reconheci o grau de dificuldade da tarefa que lhe propus.
- Ok então vais escrever sobre os problemas do ambiente e a importância da reciclagem.
- Padrinho?não dá para mudar de tema? Sei lá?o futebol ou a despenalização das drogas leves?
Suspirei e concordei: - Pode ser, escreve sobre as drogas leves e a eventual despenalização das mesmas! Boa ideia, fala das vantagens e desvantagens segundo o teu ponto de vista.
O Manuel suspirou fundo algo degradado com esta ideia de o pai, o pôr lado a lado com o padrinho, mas lá pegou numa caneta e num caderno para meu alívio.
Retomei a leitura do jornal. A frequência com que o observava era igual à frequência que o via a olhar em seu redor, para a janela, para o tecto, ou para mim. Por fim afirmou:
- Padrinho?que cena?a despenalização das drogas leves! Eu não pesco nada disto!
- Então Manuel, vá lá?puxa pela cabeça! Não tens cinco anos porra?tens quinze!
- Que cena padrinho?estar agora a escrever sobre as drogas.
- Ok Manuel, esquece isso vamos fazer um ditado! Escreve aí?
- Um ditado padrinho!?
- Sim?eu dito-te e tu escreves ok?
- Ok?
Lá ditei o que me ia na alma. Depois fui ler. A seguir apresento-lhe o texto integral escrito pelo meu sobrinho:

Exclentissima senhora menistra da educação

Como profeçor devo confessar a minha priocupação pelo rumo que os nossos jovens estão aseguir. De há uns anos e esta parte, constatase a facilidade quase vergonhosa com que os alunos transictam de ano. Ultimamente essa facilidade aumentou drasticamente. Açim de relanse constato tres motivos: O primeiro por motivos de sobreviviência, já que os professores se não apresentam elevados níveis de sussesso não sobem na carreira, fruto da avaliassão do desempenho estar prejudicada pelas retensões que apresentam. Há por isso que despaschar os alunos para dessa forma apresentar um bonito grau de sussesso. O segundo motivo deve-se çuponho á nessessidade emperiosa de Portugal se aproximar dos níveis europeus de ensino, isto é dar a conhecer aos nossos parsseiros europeus estatísticas mais interessantes, ou seja não parcermos tão atrasados. O terceiro tem haver com a sua entrevista dada num órgão de comunicassão ssossial em que afirma que os alunos ficam mais prejudicados se ficarem retidos do que se transictarem de ano. Eles vão segunda a senhora menistra, desaprender. Premita-me corregila senhor menistra; eles ficam retidos porque não aprendenram, por isso e impoçivel desaprender, correto? Perante estas condissionantes inuzitadas, inçolitas, vamos de certeza fazer boa figura na Europa, vamos ter o tão desejado sussesso! Nesse çentido a senhora merece uma estátua em cada sentro histórico de cada cidade de Portugal, porque defacto a senhora menistra está afazer história. Noutro çentido, o do correcto dezenvolvimento da juventude, nas suas áreas coginitivas e intelequetuais, estamos simplesmente a produzir analafabetos, ceres desprobidos de uma aprendijajem verdadeiramente bálida, çéria, extrutural, que vai nessessariamente refelectir-se nas próximas jerações com inegábeis prejuisos para o país e para a sua ssossiedade. Costumasse dizer que o futuro é dos jovens. Estamos simplesmente a estragare o futuro dosmesmos.
Respeitozos cumprimentos, Sérgio Cunha
- Acabou tio? Até que enfim! Já me dói a cabeça!
Depois de ler o texto escrito pelo meu sobrinho, apetece-me dizer duas coisas; O meu sobrinho apesar de todas as suas limitações, aqui expressas por preguiça cognitiva e intelectual, além da sua vergonhosa e inacreditável ortografia, vai muito provavelmente transitar para o 10º ano. Depois, nem os abençoados Magalhães os vão salvar, muito provavelmente o corrector ortográfico vai bloquear. E é isto uma educação de sucesso!
No meu tempo, este meu sobrinho estaria com toda a legitimidade e propriedade no 4º ano. Pior do que por o carro á frente dos bois, é soltar os bois e fazer desaparecer o carro.

Sérgio Augusto Cunha Machado


  
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Edição:

N.º 184
Ano 17, Dezembro 2008

Autoria:

Sérgio Augusto Cunha Machado
Professor de Educação Física
Sérgio Augusto Cunha Machado
Professor de Educação Física

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