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Espanha rompe o «pacto de silêncio» 70 anos depois da Guerra Civil

A Espanha precisou de mais de 30 anos de democracia para romper o "pacto de silêncio" estabelecido depois da morte de Franco pelos inimigos da Guerra Civil, que, deste modo, pretendiam contribuir para a reconciliação nacional.
O juiz espanhol Baltasar Garzón anunciou em meados de Outubro a sua competência para iniciar uma investigação sobre os "desaparecidos" da Guerra Civil espanhola e do franquismo, assim como pediu a abertura de várias valas comuns, entre elas a que contém os restos mortais do poeta Federico García Lorca.
Garzón declarou-se competente para investigar os desaparecimentos durante o franquismo abrindo formalmente uma instrução sobre as milhares de vítimas da Guerra Civil esquecidas nas valas comuns.
Esta decisão responde aos pedidos apresentadas por várias associações de famílias de vítimas republicanas para que a justiça investigue o desaparecimento dos seus parentes durante a Guerra Civil (1936-39) e a ditadura franquista (1939-75), localizando os corpos e esclarecendo as circunstâncias da sua morte.
As denúncias também assinalam a "existência de um plano sistemático e pré-concebido de eliminação dos oponentes políticos a partir de assassinatos, torturas, exílio e desaparecimento forçado de pessoas a partir de 1936, durante os anos da Guerra Civil e no pós-guerra".
Garzón decidiu passar por cima da lei de amnistia de crimes políticos aprovada em 1977, dois anos após a morte de Franco. Esta investigação, cujo futuro é incerto do ponto de vista jurídico, constitui a última resposta das instituições espanholas a uma exigência cidadã bastante recente.
Foi preciso esperar pela dobragem do século para que algumas associações de famílias das vítimas colocassem em primeiro plano um debate que a Espanha moderna, próspera democracia integrada na União Europeia, acreditava ter silenciado durante a transição para a democracia.
A Associação para a Recuperação da Memória Histórica (ARMH) foi a primeira a levantar a questão e há oito anos exuma valas e identifica os desaparecidos dessa época e, sem ajuda estatal, realizou a maior parte das 4.000 exumações praticadas em mais de 170 valas comuns.
Sob a pressão dessas associações, o governo do socialista José Luís Rodríguez Zapatero, neto de um combatente republicano fuzilado, elaborou uma controversa lei da Memória Histórica, que finalmente foi aprovada em 2007, e tem por objectivo reabilitar moralmente as vítimas republicanas e localizar e exumar desaparecidos. Essa lei trouxe consigo uma grande polémica e descontentamento em vários sectores. A esquerda reprova o governo por não ter anulado os processos sumários dos tribunais franquistas, que foram declarados apenas ilegítimos, e a direita acusa Zapatero de "reabrir inutilmente as feridas do passado".
Os cineastas espanhóis continuam a retomar os dramas da Guerra Civil e do período franquista. Este ano estrearam dois filmes de sucesso nacional: "13 rosas", a história real de 13 meninas fuziladas pelos franquistas, e "Os girassóis cegos", que representará a Espanha na pré-selecção do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, sobre o drama de um casal de esquerdistas nos anos 40. O realizador Pedro Almodôvar anunciou que o seu próximo filme se baseará nas memórias do poeta comunista Marcos Ana, que passou 23 anos na prisão sob a ditadura franquista.

AFP


  
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Edição:

N.º 183
Ano 17, Novembro 2008

Autoria:

AFP
Agence France-Presse
AFP
Agence France-Presse

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