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Erguer de novo a velha questão da nossa alma mediterrânica
Ainda o Mundo, de umbigo situado em Bruxelas, não tinha digerido toda a glória da capacidade diplomática de Portugal para gerar consensos, demonstrada no chamado acordo informal para o Tratado de Lisboa, e já Nicolas Sarkozy insiste em marcar novos acontecimentos mediáticos como é a proposta de uma conferência sobre a unidade mediterrânica, a realizar em Paris, em Junho de 2008.

Há doze anos, em Barcelona, ensaiou-se uma ofensiva diplomática semelhante, mas a indiferença do Reino Unido, da Alemanha e de países nórdicos comprometeu o êxito de uma unidade entre os povos das duas margens deste mare nostrum já à data marcado pela atracção que a margem direita exerce sobre quem vive na margem esquerda, considerando que esse rio corre de Oriente para Ocidente.

Sarkozy quer evitar um debate de tema único (que forçosamente seria o da imigração) e propõe que os primeiros dossiers se limitem às questões que se levantam em torno do desenvolvimento sustentado, da energia, dos transportes e da água ? uma espécie de abertura oficial do maior laboratório do Mundo em matéria de cooperação para o desenvolvimento.

Para o Presidente da França, um entendimento entre os povos das duas margens do mare nostrum é indispensável como antídoto para as guerras de civilização e de religiões e como arma preventiva contra o terrorismo, o fundamentalismo e o integrismo. No Mediterrâneo vai ganhar-se ou perder-se tudo, diz Sarkozy, obrigando a que o futuro Tratado de Lisboa seja mais mediterrânico do que Atlântico.

A proposta francesa para a criação de uma União Mediterrânica gera dúvidas e desconfianças em muitas capitais da União Europeia e até na própria Comissão Europeia, dúvidas e desconfianças em parte alimentadas pela consciência de que um projecto assim ambicioso terá, para ter êxito, de solucionar, previamente, o conflito que opõe Israel aos palestinianos, o que não será pêra doce.

Há também quem desconfie que o que Paris quer, é apenas adiar a questão turca, deixando em aberto a possibilidade de Ancara poder aproximar-se da União Europeia por esta via. Intenção já desmentida pela França e solução já recusada pela própria Turquia, em processo da adesão à União Europeia, o que não significa rigorosamente nada, nem mesmo como indício do que será o futuro desse lago imenso em cujas margens floresceram civilizações bem marcantes.

  
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Edição:

N.º 172
Ano 16, Novembro 2007

Autoria:

Júlio Roldão
Jornalista do Jornal de Notícias
Júlio Roldão
Jornalista do Jornal de Notícias

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