Nomenclaturas gramaticais e ensino do Português: uma revisão
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Prossigo uma reflexão suscitada pela polémica em redor da Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário, vulgo TLEBS. Na polaroid anterior procurei, por um lado, reconduzir a questão àquilo que me parece serem os seus limites precisos (uma terminologia linguística é um instrumento relevante, mas é apenas um entre muitos outros), e, por outro lado, inscrever a polémica no quadro em que ela faz sentido, que é o do projecto do ensino do Português nas escolas (sendo para mim claro que nem a TLEBS ou uma outra terminologia vai resolver os problemas maiores do ensino do Português, nem a sua ausência se vai constituir factor de um qualquer desastre irreversível). Pretendo agora revisitar, de forma necessariamente rápida, os antecedentes históricos da TLEBS, na expectativa de que tal ajude a projectar alguma luz sobre o que agora está em jogo, já que, em alguma medida, o quadro em que ela surge, os desafios a que pretende dar resposta e os processos de elaboração adoptados têm precedentes precisos. A consideração desses antecedentes permite reconhecer a emergência de movimentos de estabilização terminológica como resposta a situações de "crise" verificada no ensino do Português. Na origem do movimento que haveria de conduzir, em 1967, à aprovação da Nomenclatura Gramatical Portuguesa, documento que a TLEBS se propôs substituir, encontram-se "divergências perturbadoras" no campo do ensino do Português que estariam a colocar em causa "a defesa e a valorização da língua", objectivo então assumido como central. A resposta aos problemas identificados passaria, em consequência, pela harmonização dos modos de falar da língua e pela delimitação clara da "língua" de que se deve falar. Um movimento desta natureza representa, pois, um reinvestimento num dos núcleos historicamente constitutivos das disciplinas escolares da área do Português ? a "gramática". A terapia proposta corresponde congruentemente a um diagnóstico que releva sintomas de erosão nesse mesmo núcleo. Quando o legislador afirma que o trabalho de elaboração da "nomenclatura" foi guiado "por critérios científicos, de harmonia com os progressos da linguística, mas ao mesmo tempo pelo respeito pela tradição e pelas imposições da pedagogia" ou quando um dos membros da Comissão que interveio na preparação dos projectos, Mª Alice Gouveia, afirma que "a exactidão científica das denominações e a coincidência com a nomenclatura gramatical de outras línguas românicas" foi um dos critérios valorizados no desenvolvimento do projecto, deixa-se perceber que a inadequação "científica" dos termos era pelo menos parte do problema e revela-se a crença no potencial correctivo que a reconfiguração terminológica poderia, por si, acarretar para o ensino do Português. Ora o que sabemos é que este movimento "rectificativo" se gorou, como se pode verificar quando se têm em conta as características dos livros didácticos ou dos próprios programas que vão vigorar nas escolas ao longo dos anos sessenta e setenta do século passado. Quer isto dizer que, já naquela ocasião, os caminhos de renovação do ensino do Português pareciam não passar pela delimitação mais ou menos precisa dos conteúdos gramaticais e dos termos para os referir. Proximidades e afastamentos entre este "caso" e o da TLEBS serão explorados em próximo texto.
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Ficha do Artigo
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Edição:
Ano 16, Março 2007
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Autoria:
Universidade do Minho
Universidade do Minho
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