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Educação para os Media: por onde começar?
No artigo deste mês proponho-me partilhar com os leitores uma reflexão e algumas inquietações sobre a situação da formação em educação para os media (EPM). Esta reflexão surge num momento simbólico para esta área ? a celebração do 25º aniversário da Declaração de Grunwald, um documento publicado pela UNESCO a 22 de Janeiro de 1982 que expressa as razões da premência e da pertinência da EPM.
Um quarto de século depois desta Declaração, pouco se avançou neste domínio em Portugal. As iniciativas levadas a cabo caracterizam-se por acções pontuais e isoladas, sem uma estratégia organizada e consequente. Em 1993 o então Secretario de Estado dos Ensinos Básico e Secundário encomendou à Universidade do Minho um estudo que teve como finalidade apresentar propostas de implementação da EPM nos vários níveis de ensino. A iniciativa foi encarada, na altura, como uma excelente possibilidade para que esta área entrasse formalmente nos curricula de crianças e jovens, porém, com a mudança de Governo, o estudo acabou por ficar na gaveta, sem qualquer seguimento.
A EPM permaneceu, deste modo, um domínio de ninguém, empurrado muitas vezes da escola para a família e vice-versa. Por motivos de vária ordem, alguns conhecidos, outros ainda por apurar, esta área tem tido uma aceitação e uma recepção difíceis por parte dos que poderiam ser seus protagonistas (os vários agentes educativos ? professores, pais, técnicos dos serviços educativos, etc).
Um desses motivos é, necessariamente, a pouca oferta de formação dirigida aos actuais e futuros profissionais da educação e, consequentemente, a falta de preparação que os mesmos sentem para abordar e explorar conteúdos de este âmbito. Uma das poucas disciplinas autónomas de EPM oferecidas nos cursos de formação de professores e educadores era leccionada, desde 1988, no Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho, porém, com a reestruturação dos cursos à luz do Processo de Bolonha a disciplina acabou por ficar reduzida a um módulo e apenas num dos cursos de 2º ciclo (equivalente ao actual mestrado). Ora, sem formação torna-se mais difícil a sensibilização e a preparação dos profissionais de educação para a abordagem dos media nas instituições em que desenvolvem a sua acção pedagógica.
É claro que o desenvolvimento de um trabalho a este nível com as crianças pode passar também pela família. Há quem defenda, aliás, que deve mesmo começar no espaço familiar uma vez que é este o principal contexto de recepção e de interacção com os diferentes meios de comunicação. Porém, coloca-se aqui, de novo, ainda que a um outro nível e de forma mais acentuada, a questão da preparação, da sensibilização e da consciencialização para a importância da mediação em relação aos media.
Na minha perspectiva, é fundamental que as famílias sejam envolvidas na EPM pois um trabalho desta natureza unilateralmente considerado pode não ter as condições necessárias para o seu desenvolvimento e pode não alcançar resultados efectivos. É precisamente por partilhar desta opinião e por considerar fundamental a divulgação da investigação que se vai desenvolvendo dentro dos muros das universidades, que tenho orientado, de norte a sul, acções de formação dirigidas a pais e encarregados de educação. Tem sido meu objectivo, com estas acções, não a apresentação de um receituário de como usar os meios de comunicação na família, concretamente com as crianças, como por vezes me é solicitado, mas antes a colocação de questões que levem os pais a debaterem o papel e a importância dos media na vida quotidiana das duas famílias e a reflectirem sobre os usos que fazem dos mesmos. Tem também sido meu objectivo comunicar-lhes algumas estratégias para ajudar as crianças a lidarem, de forma mais critica e selectiva, com os meios de comunicação. Porém, nas duas últimas acções desenvolvidas percebi a resistência de alguns pais em aceitar os media, especificamente a televisão, como motivo e mote de diálogo e de reflexão. Percebi alguma dificuldade em aceitarem que o seu principal meio de entretenimento, de distracção, de informação, de companhia e até de catarse dos problemas do dia-a-dia, possa, também ele, constituir razão de preocupação e de discussão. A televisão assume um lugar tão central nas casas e nas vidas de algumas famílias que não é fácil deixarem, por uma noite, de ver televisão para irem falar sobre ela.
Perante este cenário, coloca-se a questão: por onde começar então esta formação considerada pela UNESCO, e por outras organizações internacionais, uma componente essencial da formação básica de qualquer cidadão? A questão fica em aberto, como apelo à reflexão do leitor.

  
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Edição:

N.º 165
Ano 16, Março 2007

Autoria:

Sara Pereira
Universidade do Minho
Sara Pereira
Universidade do Minho

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