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«Comunicações electrónicas»

Muitos consideram o termo telecomunicações desajustado para o mediaticíssimo globo deste século XXI em que vivemos. Soará a telefone, mais, soará sobretudo a telefone fixo. Outros, possuindo memória mais extensa, dirão mesmo que soa à velha telegrafia e aos telegramas. Então não se encontraria uma mais aggiornata expressão nesta época do digital, da Internet, da convergência de tecnologias (Telecomunicações, aliás, Comunicações e Tecnologias da Informação, C+TI, ou antes, invertendo a ordem, TI+C, o que dá TIC) e de convergência de sectores (telecomunicações, tecnologias da informação, difusão de rádio e tv - sem ou com ?fios? -, entretenimento, terminais)? Pois, a União Europeia, os seus órgãos dirigentes, liderados pela criatividade da Comissão Europeia, encontraram-na: ?comunicações electrónicas?. Passou a ser uma ?nova? designação oficial.
Agora: parece natural dizer que as comunicações tout court são as que se exercem a uma distância que os sinais portadores de informação trocados entre dois ou mais correspondentes podem aplicar a sua influência directamente aos órgãos sensoriais dos receptores implicados - ou seja, sem ser necessário o emprego de intermediários tecnológicos, a aplicação de uma mediação de equipamentos desenvolvidos e fabricados por mulheres e / ou por homens. E que, portanto, quando as distâncias em apreço não permitem que os sinais comunicados aos nossos correspondentes lhes cheguem de modo a poderem ser convenientemente captados pelos seus órgãos sensoriais - e está-se a falar de sinais acústicos e de sinais visuais -, entra-se no domínio das comunicações à distância. Com a invenção dos métodos eléctricos de comunicação de sinais - telegrafia, telefone - as comunicações à distância passaram a ser chamadas telecomunicações. Até aí, as comunicações à distância utilizavam sinais acústicos como os tãtãs, ou visuais como era o caso dos fumos.
Entretanto, nos primeiros tempos do século XX, veio a electrónica, uma inovação tecnológica do campo da electricidade, e vieram os serviços de radiodifusão sonora e, mais tarde, a televisiva, já a começarem a transbordar das telecomunicações. Mas foi com o avançar para os finais do século, enquanto a regra básica tecnológica se mudava do analógico para o digital nas telecomunicações, com as infra-estruturas destas a serem também empregues para a comunicação de dados, com o advento do acesso à Internet, com as redes de tv cabo a fornecerem também acessos de banda larga à Internet em paralelo com o ADSL nas ?telecomunicações? tradicionais, foi assim que estas começaram a deixar de ser apenas o que tinham sido até então. Isto, sem contar, é claro, com a emergência das telecomunicações móveis a cortarem fatias cada vez maiores do serviço telefónico fixo.
Perante tais mudanças, tais diversificações no campo das comunicações à distância num cenário que até aí tinha sido dominado quase por completo pelo serviço telefónico [fixo], uma designação que abarcasse tudo o que foi e vai ?convergindo começou a ser procurada. Na área da normalização, em meados dos anos 90, chamaram-lhe ?telecomunicações e áreas relacionadas?. Mais recentemente, o novo aglomerado tecnológico passou, como vimos, a chamar-se TIC. A União Europeia que, durante anos, laboriosamente preparara um quadro de regulação para a liberalização, nos finais dos anos 90, das telecomunicações, sobretudo do serviço telefónico fixo - agora, pouco depois, um ?negócio? em queda -, teve que, à pressa, actualizar aquele seu enquadramento legal. Fê-lo - os serviços respectivos da Comissão Europeia - e inventou a designação das ?comunicações electrónicas?. Esta, sendo tomada à letra por um extra-terrestre que nada disto soubesse, e aqui chegasse, dar-lhe-ia um bom trabalho para entender o significado deste modernismo?


  
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Edição:

N.º 153
Ano 15, Fevereiro 2006

Autoria:

Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom
Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom

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