No rescaldo de uma autêntica sublevação dos deserdados como a que se ensaiou em França, nomeadamente nas periferias de Paris e de outras cidades madrastas, com milhares e milhares de carros a arder, os poderosos de ambas as margens do ?rio? Mediterrâneo tentaram, em Barcelona, convencerem-se e convencer a comunidade internacional que estão dispostos "a actuar juntos contra o racismo, a xenofobia e a intolerância". Neste ?diálogo de civilizações?, apoiado pelas Nações Unidas, o choque consubstancia-se nas divergências semânticas existentes na ideia europeia de por fim a toda a violência e terror e na ideia árabe de consagrar o ?direito de resistência à ocupação estrangeira?? Para bons entendedores, meia semântica basta. A definição de terrorismo não é a mesma nas duas margens do grande rio. Os árabes dificilmente aceitarão meter no mesmo saco ?terrorismo? e ?resistência? e a Europa não quer desagradar demasiado aos Estados Unidos, numa altura em que o dossier dos voos secretos da CIA, com prisioneiros sem direitos, agita as mentes mais inquietas. Recorde-se que depois do 11 de Setembro, a pretexto da luta contra o terrorismo, muitos países adoptaram práticas de repressão à oposição interna. restringindo liberdades fundamentais e legitimando práticas de tortura tão inaceitáveis que os próprios torturadores procuram realizá-las às escondidas e fora de casa. A água do Mediterrâneo é um muro que não trava os milhões de emigrantes da margem esquerda que procuram a margem direita e que dificilmente se destruirá sem um plano para promover o acesso a uma educação de qualidade, segundo os objectivos do Desenvolvimento do Milénio da ONU, junto das populações mais carenciadas. A guerra no Iraque e a situação que se vive no Afeganistão, na Palestina e na Tchechénia contaminam todos estes esforços diplomáticos. E não adianta ensaiar outros temas de agenda para ?esquecer? a questão central da paz. Não é pelo facto da Igreja de Roma preferir debater o problema das vocações sacerdotais de homossexuais (para que Bento XVI recupere o protagonismo do antecessor) que a Guerra e a Paz continua a ser o tema central do nossos tempo.
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