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De quem, para quê e como?

BASE DE DADOS POPULACIONAIS GENÉTICA

O anúncio da criação de uma base de dados genética para fins de identificação civil, mas que serviria igualmente para fins de investigação criminal, feito no programa do XVII Governo tem agitado a comunidade científica e judicial. Mas até agora muito permanece por discutir. Foi esta a conclusão de um debate realizado em Junho pela Comissão de Ética do Instituto de Biologia Molecular e celular da Universidade do Porto.
?Uma base de dados populacional para que fins?? Da resposta a esta questão depende toda e qualquer discussão que se possa fazer adiante. António Amorim, geneticista do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto, assume uma posição cautelosa no que toca à utilização das bases de dados genéticas: ?Uma coisa são os dados recolhidos, outra as informações que se podem extrair deles?. Diz-se a favor da criação de uma base de dados civil desde que, insiste, ?possa primeiro ver a lei que a regula?.
De modo geral distinguem-se as bases de dados genéticos mediante a sua utilização, seja ligada à saúde, à investigação forense e à criminalidade, abrangendo civis ou militares. Desde a guerra do Iraque que todos os indivíduos pertencentes ao exército dos EUA contribuem com uma amostra genética para uma base de dados. A ideia ganhou aceitação face ao argumento de acabar com os ?soldados desaparecidos?. E constitui um exemplo de uma base de dados para fins militares.
O Reino Unido foi pioneiro na criação de uma base de dados forense para ajudar a investigação de crimes violentos. Inicialmente, a recolha de dados genéticos, abrangia apenas a população criminal. Cedo, porém, se concluiu que, pelo facto de estes indivíduos ficarem encarcerados, a manutenção dos seus dados genéticos na base de dados não teria utilidade para a identificação de eventuais crimes, sendo este o fim a que se destinava a recolha. Face a esta conclusão deu-se um alargamento da noção de suspeito: qualquer individuo é obrigado a contribuir com dados fisiológicos para a base de dados, desde que a polícia suspeite dele. Por isso, alerta António Amorim, ainda que ?as recolhas oficialmente não incluam a população ao nível nacional, com este processo rapidamente o conseguem?. Numa população de mais de 60,5 milhões de habitantes, estima-se que 2,5 milhões estejam registados.
Entre os riscos de abuso que um tal instrumento de identificação poderia acarretar, Helena Moniz, jurista do Centro de Direito biomédico da Universidade de Coimbra, identifica um: a sua permanência sob a custodia de uma só policia. Algo que parece assegurado no capítulo dedicado à Justiça do programa do XVII Governo Constitucional onde se lê: ?Será criada uma base de dados genéticos para fins de identificação civil, que servirá igualmente fins de investigação criminal (assegurando-se que a respectiva custodia não competirá a órgão de policia criminal)?.
Assumindo não ter ?medo? desta medida, Helena Moniz aponta a necessidade de restringir o âmbito da base de dados ao AND, de suspeitos, arguidos, condenados, a vestígios recolhidos em local de crime. Ainda assim, a jurista recorda que em matéria de Direito Processual Penal, a noção de suspeito em Portugal é também muito abrangente, incluindo qualquer pessoa sobre a qual haja indício de que possa ter praticado um crime. De igual modo, arguido (pessoa contra a qual foi deduzida uma acusação) pode ser qualquer indivíduo que seja retido pela polícia para prestar declarações. E mesmo no que toca aos condenados, existindo várias instancias de apelo, um indivíduo pode ser condenado na 1ª e absolvido na 2ª. Argumentos que levam a jurista a defender que a futura lei que regule esta matéria seja antecedida de um parecer prévio da Comissão Nacional de Protecção de Dados. ?Não podemos esquecer que cada cidadão tem direito da reserva da vida privada e dos seus dados pessoais?, conclui.


  
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Edição:

N.º 147
Ano 14, Julho 2005

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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