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Governo quer promover o diálogo entre os ministérios

Maria Amélia Paiva, presidente da CIDM, fala das mudanças no II Plano Nacional contra a Violência Doméstica

Licenciada em História e diplomata de carreira, Maria Amélia Paiva é presidente da Comissão para a Igualdade e para os Direitos da Mulher (CIDM) desde Setembro de 2002. Foi representante da Missão de Portugal nas Nações Unidas, em 1999, encarregue de lidar com as questões dos direitos humanos e dos direitos das mulheres, tendo representado Portugal durante a presidência portuguesa da União Europeia nas negociações do processo de revisão da IV Conferência Mundial sobre as Mulheres, realizada em Pequim em 1995.
Nesta curta entrevista, Maria Amélia Paiva fala das alterações ao II Plano Nacional contra a Violência Doméstica e rejeita a crítica de este plano não envolver mais de perto as ONG?s.

A violência sobre as mulheres é, ainda, muitas vezes encarada como uma característica do Portugal do passado e habitualmente associada às gerações mais velhas. As estatísticas, no entanto, demonstram que essa visão não corresponde à realidade, e que este fenómeno, ao contrario do que se possa pensar, atinge também as gerações mais novas. Confirma esta ideia?

De facto, alguns estudos recentes, elaborados no contexto da população universitária, mostram que as relações entre os jovens continuam a contemplar uma forte prevalência dos actos de violência sob diversas formas, o que, de alguma forma, é indicador de que os padrões de comportamento entre homens e mulheres continuam a replicar modelos que são muito antigos e que mostram um desequilíbrio nas relações de poder, mesmo entre as gerações mais novas. E isso é notório se atentarmos, por exemplo, nas idades das pessoas que procuram os nossos centros de atendimento, situadas nas faixas entre os 20 e os 40 anos.

Como se explica que após três décadas de uma mudança política e social profunda no nosso país se continue a verificar esse estigma na sociedade portuguesa?

Esta será provavelmente uma das áreas sociais onde as mudanças se afiguram mais difíceis. Se no espaço público as mudanças têm sido mais rápidas, muito em parte pela força da opinião pública, no espaço privado, e apesar de também se terem verificado algumas mudanças, elas não foram tão céleres.
Por outro lado, os modelos que se transmitem, inclusivamente na comunicação social, estão ainda marcados por uma relação entre homens e mulheres profundamente desigual. E isso continua a marcar não só as relações entre homens e mulheres, como as relações no interior das famílias e das próprias relações no espaço público.
Basta observarmos o desequilíbrio entre os géneros existente quer na participação quer na representatividade ao nível dos cargos de decisão da administração pública e na vida política. Nesse aspecto, há vários indicadores que apontam no sentido da necessidade de aprofundar a nossa democracia e de fazer cumprir a Constituição da República, trazendo para a vida de todos, mulheres e homens, a efectiva realização dos seus direitos e deveres.

De acordo com números oficiais, em 2004 as queixas apresentadas junto da PSP e da GNR relativas a violência doméstica diminuíram relativamente a 2003. Significa isto que se verificou uma diminuição de facto dos índices de violência doméstica ou simplesmente um menor número de queixas apresentadas?

Eu creio que não há dados que nos possam elucidar concretamente acerca do porquê desta diminuição. Seria talvez necessário analisar outros factores e variáveis para encontrar uma resposta satisfatória.
No entanto, julgo que estas questões estão muitas vezes relacionadas com ?picos? ou com uma maior ou menor visibilidade na comunicação social, que, directa ou indirectamente, fazem com que os cidadãos que são vítimas deste tipo de violência se sintam mais ou menos encorajados a apresentar queixa. Mas esta, sublinho, não é uma resposta com base em dados científicos.

Tendo em conta a mudança de governo e a recente nomeação de um novo grupo de missão para o II Plano Nacional contra a Violência Doméstica, houve alguma redefinição dos seus conteúdos e linhas de orientação?

Eu creio que a grande mudança ? expressa, aliás, em resolução do Conselho de Ministros ?, está na introdução de um olhar transversal, até do ponto de vista da tutela política, na questão da violência doméstica. Ela deixa de estar na exclusiva dependência da segurança social, onde estava sediada até agora a estrutura do grupo de missão, para passar a cruzar a intervenção de diversos ministérios, nomeadamente os da educação, da justiça e da administração interna, que, em colaboração com a CIDM e com outros organismos, têm um papel muito importante no combate a este fenómeno.

Uma das ONG's contactada para este trabalho critica o facto de o II Plano Nacional contra a Violência Doméstica ser eminentemente estatal e de as ONG?s terem um papel meramente consultivo na sua estratégia de base. Concorda com esta crítica?

Eu discordo dessa posição, já que, em primeira análise, as próprias ONG?s estão a desvalorizar o papel que elas próprias desempenham. Depois, porque a CIDM tem colaborado muito intensamente e tem feito contactos com estas organizações no sentido de trabalhar com elas na formação dos seus técnicos, na disponibilização de técnicos afectos à CIDM para acções de sensibilização e inclusivamente de um trabalho conjunto com as organizações da sociedade civil no sentido de encontrarmos soluções comuns para o mesmo problema.

Entrevista conduzida por Ricardo Jorge Costa


  
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Edição:

N.º 147
Ano 14, Julho 2005

Autoria:

Maria Amélia Paiva
Presidente da CIDM
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
Maria Amélia Paiva
Presidente da CIDM
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

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