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Bolonha: que formação de professores queremos?

O Processo de Bolonha poderia estar a constituir uma oportunidade para reflectirmos sobre o estado actual e a qualidade das formações que o nosso ensino superior oferece, incluindo, naturalmente, a formação de professores e de educadores, e para descortinarmos as mudanças que, em muitos casos, se impõe fazer.
De facto, Bolonha formalmente é um processo apresentado como visando a criação de um espaço europeu de ensino superior com maior qualidade global, traduzida em maiores probabilidades de mobilidade dos diplomados, maior competitividade e atractividade dos sistemas.
Mas em Portugal cedo se percebeu que os Governos e, em particular, os da coligação PSD/CDS, viram aí apenas uma oportunidade para fixar (cegamente) um 1º ciclo de formação superior com uma duração de três anos (o mínimo que o processo de Bolonha admite) e de determinar que só esse ciclo seja financiado pelo Estado, sendo os ciclos seguintes suportados pelo estudante. Um simples caso de engenharia financeira?
Por vontade governamental, todas as discussões sobre os perfis de competências necessárias aos diferentes desempenhos profissionais, sobre as finalidades, objectivos e conteúdos científicos dos cursos, imprescindíveis ao desenvolvimento das competências pretendidas, deveriam ter sido arredadas. E mesmo se, por acção das instituições de ensino superior, dos sindicatos, das ordens profissionais, a discussão se tornou forçosa, se há hoje relatórios em discussão pública, entre os quais o relativo à formação de professores, a Senhora Ministra, já demitido o Governo, lembrou que no fim quem decidirá será o Governo. Que não haja dúvidas nem ilusões?
Um conjunto importante de cursos já passou para o campo das excepções, ou seja, não vão ter durações de três anos as formações iniciais de médicos, nem de arquitectos, nem de engenheiros. E nessas situações o Estado financiará a formação necessária ao desempenho da profissão em causa. Impõe-se que o mesmo suceda no que se refere à formação dos futuros professores e educadores que actualmente se formam, no mínimo, em quatro anos, sem que se imagine quem, com conhecimento de causa, possa propor o encurtamento.
Para nós, a duração de uma formação inicial não pode ser entendida nem discutida como um dado absoluto. Essa duração variará necessariamente em função do perfil de profissional que se quiser formar. Está-se a pretender discutir e modificar um aspecto da estrutura dos cursos (a duração), quando esse não será seguramente o primeiro aspecto a discutir, nem o mais difícil de alterar. Aquilo que nos parece mais prioritário discutir e que é certamente mais difícil de modificar, são as concepções que presidem aos currículos de formação inicial de professores e as práticas, tantas vezes comprovadamente desajustadas, ineficientes e ineficazes, que neles têm lugar.
Há que reconhecer que ser professor hoje, desempenhar papéis e funções que, entretanto, mudaram, muito e muito rapidamente exige competências de elevado grau de complexidade. Importa que a formação inicial seja reconceptualizada no sentido de preparar futuros profissionais autónomos, críticos e criativos, promotores do sucesso educativo dos alunos. Era isto, pensamos, o que deveria estar a ser discutido.


  
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Edição:

N.º 141
Ano 14, Janeiro 2005

Autoria:

Manuela Esteves
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação da Univ. de Lisboa
Manuela Esteves
Fac. de Psicologia e Ciências da Educação da Univ. de Lisboa

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