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Remodelação educativa

o problema da inversão de perspectiva

Das intenções do presente executivo português, na pessoa do Ministro da Educação, vislumbra-se uma ?profunda reforma estrutural da educação em Portugal?. Afirmado simplesmente desta maneira, soa a sola gasta e já muito distorcida, pois os actores do sistema (chamemos-lhe operacionais especializados em instabilidade) estão há muito, descrentes.
Olhando para trás, para o ano de 1986, com a publicação da então Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), que não chegou a ser regulamentada em toda a sua extensão e seguidamente para o Pacto Educativo, que não teve melhor sorte, ambos acentuaram a instabilidade de um sistema que tem sofrido alterações sucessivas que se prolongam indefinidamente e sobre as quais tarda a haver uma avaliação séria e objectiva.
Antevê-se assim, mais um conjunto de acontecimentos que, embora ainda não se conheçam em absoluto, já estão a despoletar as mais diversas reacções, toda elas contraditórias entre si. Estas ocorrências, já se sabe, irão conduzir a uma situação em que a remodelação irá, como habitualmente, ser imposta de cima para baixo (top-down), tipicamente em jeito de organização burocrática ?weberiana?, em que as directivas a implementar no terreno, pelos operacionais, irão sofrer sucessivas (re)interpretações até que deixe de existir remodelação e passe a existir uma adaptação ao que já se faz.
Aquela atitude não trará resultados positivos visíveis se não ?convencermos? todos os colaboradores a ?vestirem a camisola? abraçando a missão como se fosse deles. Questiono: já perguntaram a quem se encontra no terreno do que realmente precisa? De outra maneira: têm a certeza de quais são as necessidades reais do sistema educativo? Perguntaram às pessoas quais as suas ?exigências?? Chamaram-nas a colaborar activamente na definição das estratégias a implementar? Ou é mais uma decisão de gabinete?!
Deste conjunto de questões, facilmente se depreende que é imperativa a necessidade de se alterar a perspectiva com que se encara o sistema educativo (prefiro chamar-lhe escola), pois esta visão ?de cima? está ultrapassada e no seio dos gestores está a cair em desuso. Assim, da prática de muitas organizações, retira-se que só quando as directivas do topo da cadeia hierárquica coincidem com as necessidades e anseios de quem ?mete a mão na massa?, é que se consegue alcançar uma verdadeira harmonia e entendimentos efectivos, na prossecução dos objectivos (leia-se missão) da organização.
Aquela perspectiva, como se percebe, implica uma nova contemplação do sistema. Em primeiro lugar há a procura da reunião das diferentes visões do ?negócio? recorrendo às bases da organização, depois tenta-se retirar daí algo que seja realmente familiar a todos os intervenientes e seguidamente encaminha-se para degraus superiores a resultante. Esta direcção (da base para o topo - bottom-up), concerteza estará mais próxima de conseguir transportar as reais carências e necessidades de quem executa a missão, tendo como consequência a definição de estratégias adequadas e do reconhecimento de todos, logo, estamos mais próximo de conseguir resultados positivos, pois resultam da participação efectiva de todos.
Embora se recolha as diferentes partes de todo o sistema, da sua junção irá resultar algo mais, pois ao interagirem obtêm-se acontecimentos impossíveis de pressupor, o que revela entre outros aspectos, a complexidade indiscutível de um sistema como a escola. Esta abordagem contudo, necessita da existência de verdadeiros planos de estratégia de acção, com objectivos claros e mensuráveis, de modo a permitir uma avaliação real e atempada, na mira de corrigir desvios de percurso e correcções de planeamento que deverá contemplar de base, o funcionamento contingencial do sistema.
Se recorrermos a esta inversão de perspectiva, induziremos com maior facilidade as várias componentes do sistema a participarem activamente, de forma organizada e com objectividade, numa reforma estrutural efectiva da educação, sem a necessidade constante de receber, de cima, indicações sobre fazer o quê, como e para quê. Basta para isso incrementar uma autonomia e capacidade de decisão efectivas.


  
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Edição:

N.º 134
Ano 13, Maio 2004

Autoria:

Luís Fernando Maurício
Professor em Portalegre
Luís Fernando Maurício
Professor em Portalegre

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