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Literatura infantil um mergulho no caldeirão da imaginação

?Se se quiser falar ao coração dos homens, há que se contar uma história.
Dessas onde não faltem animais, ou deuses e muita fantasia.
Porque é assim ? suave e docemente que se despertam consciências.?
Jean de La Fontaine

Após longos anos de pura racionalidade científica, estamos vivenciando um momento de retomada do que costumamos chamar de maravilhoso, aos poucos a magia, o fantástico, o imaginário, deixam de ser vistos como pura fantasia para fazer parte da vida diária de cada um, inclusive dos adultos que já se permitem em muitos momentos se transportar para este mundo mágico, onde a vida se torna mais leve e bem menos operativa.
No entanto a discórdia entre os defensores da ?realidade? e os defensores da ?fantasia? que está presente há muito tempo nas reflexões dos pedagogos e estudiosos sobre a criança e o que convém à criança, continua acirrada.Conforme o parecer de muitos teóricos, um dos elementos que menos conviria às crianças seria exatamente a fantasia. Ogro, fadas, feiticeiras, varinhas mágicas, seres poderosos, amuletos milagrosos, animais que falam, objetos que raciocinam, todo tipo de excesso deveria, segundo eles, ser desterrado dos contos, sem maiores contemplações. O ataque se faz em nome da verdade, da fidelidade ao real, do razoável. Já Rousseau havia determinado que a literatura haveria de interferir pouco ou nada na esmeradíssima educação de seu Emílio e, menos ainda, os contos de fadas, pura e simplesmente mentirosos. E depois dele, inúmeras vozes levantaram-se contra a fantasia.
Mas ao ser acusada de fantasia, do que estará sendo realmente acusada a literatura infantil? Por que tanta paixão na condenação? Em nome de que valores se lançam os ataques? O que se quer proteger com esse gesto? Estou convencido de que nessa aparente oposição entre realidade e fantasia, escondem-se certos mecanismos ideológicos de revelação/encobrimento que servem aos adultos para domesticar e submeter as crianças às suas vontades.
Mas ainda assim, os contos de fadas têm se perpetuado há milênios, atravessando todas as geografias, mostrando toda a força e a perenidade do folclore dos povos. Quem lê ?Cinderela? não imagina que há registros de que essa história já era contada na China, durante o século IX d.c e assim como tantas outras. E porque será que isto acontece? Porque os contos de fadas estão envolvidos no maravilhoso, num universo que detona a fantasia, partindo sempre de uma situação real, concreta, lidando com emoções que qualquer criança já viveu, porque se passam num lugar que é apenas esboçado, fora dos limites do tempo e do espaço, mas onde qualquer um pode caminhar, porque as personagens são simples e colocadas em inúmeras situações diferentes, onde têm que buscar e encontrar uma resposta de importância fundamental, chamando a criança a percorrer e a achar junta uma resposta sua para o conflito, porque todo esse processo é vivido através da fantasia, do imaginário, com intervenção de entidades fantásticas (bruxas, fadas, duendes, animais falantes, plantas sábias...).
Segundo Bettelheim (1980), a fantasia facilita a compreensão das crianças, pois se aproxima mais da maneira como vêem o mundo, já que ainda são incapazes de compreender respostas realistas. Não esqueçamos que as crianças dão vida a tudo. Para elas, o sol é vivo, a lua é viva, assim como todas os outros elementos do mundo, da natureza e da vida. 
Falar sobre literatura infantil é sem dúvida, falar sobre a imaginação. SOSA,(1982), assinala a importância da literatura infantil como etapa criadora dentro do problema geral da imaginação, uma vez que não se sabe bem em que idade, nem em que forma e circunstâncias ela aparece na criança. Concluindo o capítulo sobre os ?caracteres da imaginação infantil?, o mesmo autor afirma que a imaginação é a ?faculdade soberana? e a forma mais elevada do desenvolvimento intelectual. Se em outros componentes curriculares, dá-se atenção concentrada a conteúdos significativos para as crianças, na literatura infantil encontramos o espaço privilegiado para estimular o sujeito como elemento gerador das hipóteses mágicas.

Referências bibliográficas:

BETTLLHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. Rio de Janeiro: Paz e Terra,     1980.
SOSA, Jesualdo. A literatura infantil. Trad. ... Literatura Infantil: autoritarismo e emancipação. São Paulo : Ática, 1982.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 130
Ano 13, Janeiro 2004

Autoria:

Anderson Pereira da Silva Netto
Univ. Federal Fluminense, Rio de Janeiro, Grupalfa - pesquisa em alfabetização das classes populares
Anderson Pereira da Silva Netto
Univ. Federal Fluminense, Rio de Janeiro, Grupalfa - pesquisa em alfabetização das classes populares

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