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Alfabetização de pais e responsáveis de alunos

ALFABETIZAÇÃO

O DESAFÍO DA EDUCAÇÃO ESTÁ MUITO ALÉM DAS PAREDES DA ESCOLA. ELE ADENTRA NOS LARES DOS NOSSOS ALUNOS COMO UMA FORÇA MOVIDA PELO NÃO-CONFORMISMO E PELA POSSIBILIDADE DE TRANSFORMAÇÃO, DESCARTANDO O FATALISMO, A IMPOTÊNCIA, A «HERANÇA», BUSCANDO NOVOS CAMINHOS E NOVOS RUMOS.

Inconformados com o número crescente de alunos retidos no 3° Ano do Ciclo de Alfabetização, reunimos um grupo de pais para discutirmos esta problemática. Descobrimos  que cerca de 40% dos pais ou responsáveis dos alunos não sabiam ler nem escrever, (dados que foram levantados após entrevistas com os responsáveis).  Surge então a proposta de realizarmos uma «classe de alfabetização para pais e responsáveis» que, em reunião geral com a comunidade escolar, recebeu todo apoio.  Desta forma enviamos para a  Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias, um projeto de alfabetização de Pais que, autorizado,  teve início no dia 18 de junho de 2002, com  60 inscrições, sendo efetivadas 47 matrículas. 
O Projeto superou nossas expectativas em relação ao impacto que proporcionou na vida de nossos alunos. Eles relatavam diariamente com grande entusiasmo a satisfação por ver seus pais ou responsáveis estudando na mesma escola e aprendendo juntos as mesmas ?letras?. Os professores observaram mudanças no comportamento dos alunos que tinham seus pais inseridos no projeto:  a elevação  da auto-estima e a participação nas atividades propostas na escola, despertando um novo interesse para a leitura. Eles relataram desejar ajudar os pais nas tarefas escolares.
No primeiro dia de aula do projeto anotamos alguns anseios dos pais, e entre eles destacamos: 1. «desejo aprender a ler e escrever para ajudar meus filhos, ou netos, ou sobrinhos, na escola, com as atividades de casa,  2. Quero ler a Bíblia, a Palavra de Deus.  3. Quero ler para tirar a carteira de motorista».
Resgatar a cidadania é sem dúvida a tarefa principal deste projeto.  Afinal, os anseios por eles expressos são o clamor de  um povo que tem sido furtado no direito de cidadania. Qual é o cidadão que não tem direito de: ajudar os filhos nas tarefas da escola «lendo» e interpretando seus exercícios; «ler» os comunicados da escola que são levados em forma de bilhete;  «ler» e assinar os relatórios semestrais do seu filho; «ler» a Bíblia entendendo os seus ensinos; «ler»  as placas no trânsito que apontam os caminhos a seguir. A repetição do verbo ler, demonstra o desejo interno de cada pai e responsável em conquistar o acesso ao código escrito, que eles vêem mas ainda não conseguem interpretar. Viver em um mundo letrado sem ter se apropriado do  código escrito restringe o acesso a inúmeras possibilidades. 
Durante cinco meses de aula no projeto, cerca de 90% dos alunos foram alfabetizados. 
Dona Madalena sonhava com a possibilidade de ter acesso à escola. Todos os dias suas lágrimas banhavam seu rosto, pela emoção e possibilidade de interpretar os sons das letras. Quando pequena, ao entrar em uma sala de aula,  seu pai a tirou com chicotadas para trabalhar na roça e nunca permitiu que ela aprendesse as ?letras? pois «isso não era coisa para mulher».  Nesta  semana recebi a  visita de Dona Madalena:
? «Diretora, hoje  eu recebi um aerograma da Secretaria de Educação, para efetivar a matrícula da minha filha na sala de recursos da Escola Municipal Santa Luzia. A Senhora poderia me explicar  como posso chegar a este endereço?»
 
Eu li para ela tudo o que estava escrito.  O seu sorriso me mostrava que ninguém pode matar a esperança e que ela pode se transformar em realidade quando as oportunidades são oferecidas.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 124
Ano 12, Junho 2003

Autoria:

Rejane D'Avila Marques
Grupo de Pesquisa Redes de Conhecimento em Educação e Comunicação: questão de cidadania, GRUPALFA, Brasil
Rejane D'Avila Marques
Grupo de Pesquisa Redes de Conhecimento em Educação e Comunicação: questão de cidadania, GRUPALFA, Brasil

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