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Jogar pelo passado: medidas e metas para a catástrofe

DESPORTO ESCOLAR

NÃO FAZ O MEU JEITO A ESCRITA AZEDA. MAS, SINCERAMENTE, DEPOIS DO QUE LI [Jogar pelo futuro: medidas e metas para a década ]E JÁ COM MAIS DE TRINTA ANOS DE SERVIÇO DOCENTE, APETECE-ME GRITAR A TODO O PULMÃO: POR FAVOR DEMITAM-SE OS RESPONSÁVEIS.           

O desempenho do Senhor Ministro da Educação, Dr. David Justino, deixa-me reticências sem fim. Hoje, aqui me traz o maltratado desporto escolar e o designado documento: ?Jogar pelo futuro: medidas e metas para a década?. Li o essencial, contactei vários credíveis colegas no espaço Nacional e concluí que o Ministro, afinal, continua a fazer jus ao fraco desempenho de muitos dos seus antecessores. Ora, sendo ele o 16º Ministro da Educação em 27 anos de governos constitucionais, o que perfaz, por ministro, uma escassa média de 20,2 meses de mandato e que só no período das maiorias absolutas do Professor Cavaco Silva, a Educação contou com cinco Ministros (João Deus Pinheiro, Roberto Carneiro, Diamantino Durão, Couto dos Santos e Manuela Ferreira Leite), é politicamente imperdoável que o Ministro, por uma questão de rigor, no mínimo, não se tivesse interrogado sobre os posicionamentos estratégicos dos seus antecessores e sobre os porquês do sucessivo fracasso das políticas para o desporto escolar, antes de propor as banalidades que propôs.
Não faz o meu jeito a escrita azeda. Mas, sinceramente, depois do que li e já com mais de trinta anos de serviço docente, apetece-me gritar a todo o pulmão: por favor, demitam-se os responsáveis. Do mal o menos. De resto, relativamente ao Senhor Ministro, a média estatística não sofrerá grande alteração. Sobretudo porque há necessidade de romper com a irresponsabilidade histórica vivida no seio do desporto escolar, consubstanciada nos sucessivos programas de governo e nas trocas e baldrocas que o fizeram deambular, anos a fio, segundo os interesses, entre os sistemas educativo e o desportivo. Ora, quando, em Sintra, se assiste ao anúncio de dez vagas medidas e metas, desenquadradas e desarticuladas de uma política global que implicaria, necessária e prioritariamente, a reformulação programática e organizacional da própria Educação Física curricular, o que me vem à cabeça é que, de facto, o desporto, todo ele, do escolar ao federado, continua entregue a pessoas sem qualificação e estratégia. Apenas o utilizam como um apetecido bolo em que os convivas tentam retirar a melhor fatia, borrifando-se, obviamente, para os interesses dos jovens do país. Uma vergonha nacional.
Quando se vê Portugal gastar incontáveis milhões de Euros no Europeu de Futebol de 2004 e em tantas organizações desportivas de carácter internacional que nada deixam, realizadas para gáudio de uma série de pavões, e, ao lado, confrontamo-nos com uma situação interna que não só é a pior da Europa na taxa de participação desportiva, mas também de permanente desastre na participação olímpica, eu diria que são lamentáveis estas medidas. Elas exprimem que o Senhor Ministro não tem noção do que é uma efectiva política de educação pelo desporto, da base ao topo e em todos os sectores, para que, a prazo, se cumpra o preceito constitucional: ?(...) Todos têm direito à prática do desporto?.
Finalmente, é um paliativo, destinado a enganar os incautos, o discurso político que colocou, em alternativa, mais desporto ou mais toxicodependência. A prova está na Região Autónoma da Madeira, onde apesar do significativo aumento do parque infra-estrutural e de, nos últimos dez anos, terem sido disponibilizados cerca de 90 milhões de contos de subsídios ao associativismo desportivo e ao Jornal da Madeira, a toxicodependência não tenha sido erradicada ou quase erradicada. Pelo contrário, tal como o alcoolismo, disparou para números extremamente preocupantes. Os problemas são, portanto, outros.
           Sendo assim, o título mais adequado ao documento divulgado pelo Senhor Ministro deveria ter sido: ?Jogar pelo passado: medidas e metas para a catástrofe?.


  
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Edição:

N.º 124
Ano 12, Junho 2003

Autoria:

André Escórcio
Mestre em Gestão do Desporto. Professor do Ensino Secundário, Funchal
André Escórcio
Mestre em Gestão do Desporto. Professor do Ensino Secundário, Funchal

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