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Um pensamento vazio salpicado com insultos

"Ignorância"; "insuportável ignorância agressiva"; "!imperdoável ignorância"; "ato de má-fé"; "até os cientistas precisam vender livros!"; "infantil argumento":" suposto cientista";."ridículo". Todo o texto da Doutora Barbosa de Oliveira revela o seu timbre ético-intelectual. Mas faz afirmações "interessantes", reveladoras da sua 'doutrina'. Assim, escreve: "as verdades de Einstein e de Hawking são diferentes das verdades de Heisenberg e Prigogine?" Isto não tem sentido. Poderia clarificá-lo com uns exemplos? E quem é que esconde as verdades? As teorias, os cientistas? Depois, nunca escrevi o disparate de que não há, no mundo real, possibilidades que ignoramos. Uma das missões da ciência é descobri-las. Não há em ciência, no sentido que quer a autora, "existências invisíveis mas reais". Poderá, sim, haver entes de cuja possível ou provável existência suspeitamos apenas pelos seus efeitos, e/ou pela "necessidade" de os incluir em teorias bem estruturadas e fundamentadas. Nada mais do que isso.
Não sei o que seja objetivismo tacanha (sic) ? que cham(o) de objetividade-que tantos males já causou ao nosso mundo, etc.. Como quase toda a gente malvada no mundo, eu suponho que há 'sujeitos', que conhecem, e 'objectos' que podem ser conhecidos. Esse conhecimento pode ser organizado em teorias compreensivas que, para serem científicas, se têm de referir a objectos identificáveis pelos sentidos, auxiliados, muitas vezes, por instrumentos. Quanto aos malefícios desse conhecimento, desconheço-os, sabendo-se, sim, que alguns podem ser "mal ou bem" aplicados.
Se o conhecimento científico não é uma construção social ele é o que? Qual a ciência que já foi produzida fora das sociedades, etc. A inanidade da pergunta está patente logo na interrogação seguinte, que lhe responde. Mas a Sr.ª Doutora acredita, com os seus parceiros, que os factos são "socialmente construídos"» Que as teorias são apenas "narrativas ou mitos"? Que os debates científicos são resolvidos por retórica? Que os resultados de experiências são aceites por negociações entre interessados, talvez politicamente motivados? Que as teorias científicas são seleccionadas darwinianamente e, finalmente, recusadas ou validadas conforme o meio e a condição social e política onde se desenvolvem, etc.?, . Quando lhes mostramos exemplos, e lhes pedimos exemplos, disfarçam como se estivéssemos a falar de outra coisa. Assim, referi-me ao reconhecimento da existência de átomos devido aos trabalhos teóricos de Einstein e Smoluchowsky e resultados experimentais de Perrin Qual a "resposta"?: "se a existência do átomo é certa, são menos certos os seus comportamentos (sic) e transformações, etc." Que se passa aqui?
Afirma, depois, que "o conhecimento científico traduz as preocupações e prioridades da sociedade e torna real (sic) aquilo que imagina e deseja"
Com Boaventura de Sousa Santos, a Doutora Barbosa de Oliveira, diz que é possível só produzir 'conhecimento bom'. E parece que basta só "imaginá-lo e desejá-lo !!!". E acrescenta que:"? a relevância social do estudo é um dos critérios para o financiamento ou não do trabalho,etc. Ora isto não é verdade. Para não sair da física, basta pensar no grande número de estudos teóricos e experimentais em curso e nos custosos projectos de aceleradores, detectores de neutrinos, "fábricas" de neutrinos ou de "mesões", detectores de ondas gravitacionais, observatórios astronómicos, etc.,etc.. A 'relevância social' não é um dos critérios invocados para o financiamento destes projectos pela razão simples de que não se sabe qual seja. Claro que nalgumas áreas científicas, por exemplo em bio medicina, pode influir a relevância social dos estudos.
Pergunta "se ignoro que (Boaventura de Sousa Santos) BSS não é um não (sic) pesquisador errante"? Se é pesquisador, errante ou não, não sei. Sei é que está evidentemente errado em quase tudo o que diz sobre ciência, e que não é um cientista (pelos critérios usualmente adoptados para a definição). Ignoro também se existem pensadores como Kuhn, Prigogine, Stengers, Feyrabend e Maturana "que vem confirmando através de numerosos estudos a pertinência e a relevância dos escritos de BSS?" Apesar de não ter grande admiração pelos pensadores citados, exceptuando Prigogine, enquanto cientista, claro, gostaria, como certamente os leitores deste jornal, de conhecer essas referências a BSS. Algumas citações bastariam, particularmente em trabalhos científicos do físico-químico Prigogine.
E, depois, escorre o sumo do espremido nada que é o artigo: "quem é e quem não é o cientista digno de atenção neste simulacro de debate"?. Estou calorosamente de acordo -e quase desesperava - com a classificação de "simulacro de debate". Mas se se escreve que o autor (BSS) de "Crítica da Razão Indolente. O Desperdício da Experiência" é um cientista, de uma penada varremos do grupo de cientistas todos os Prémios Nobel da Química, da Física, da Medicina e Fisiologia, incluindo, claro, Prigogine, assim como todos aqueles cuja actividade permitiu que a humanidade tenha uma História da Ciência.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 116
Ano 11, Outubro 2002

Autoria:

António Manuel Baptista
Professor Universitário, Lisboa
António Manuel Baptista
Professor Universitário, Lisboa

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