“Reuniões” era o título da crónica
subscrita, nesse sábado de Julho, por António Silva no jornal
“Público”.
Usando da sua habitual ironia, António Silva, descreve
a via sacra das reuniões numa escola EB 2/3. Fá-lo, provavelmente,
a partir da sua experiência como docente e o retrato que sobra da crónica
que escreve está muito longe de constituir uma imagem lisonjeira sobre
os professores e as escolas deste país. Não sendo, provavelmente,
esta a sua intenção, foi esse, contudo, o resultado da leitura
que muitos, como eu, fizeram desse texto. Porque não são o Ministério
da Educação, ou os tão mal-
-amados pedagogos, que podem ser chamados à pedra pelo facto de algumas
reuniões terem dois pontos: “informações”
e “outros assuntos”. Reuniões que, precisava o autor,
se encerram após se lerem “as notas do pedagógico”.
Não são também nem o Ministério nem, pelo menos,
alguns dos teóricos da coisa educativa que poderão ser responsabilizados
pelo raciocínio dos professores face a um “aluno que merece
o chumbo”. Raciocínio esse que António Silva descreve
com o sarcasmo q.b. de um excerto escrito neste tom: “Às vezes,
o aluno merece o chumbo, mas não pode porque já teve positiva
anteriormente e os professores avaliam competências. Ora, as competências,
uma vez adquiridas, não se perdem. Logo, não leva “nega”
e lá vem o célebre “3” pequenino, muito pequenino”.
Serão também o M.E. e os pedagogos que justificam - a propósito
do que no artigo se designa por “componente atitudinal”
- “as empoladas reuniões onde se discutia se tal coisa devia
pesar 50 por cento ou 60 por cento na nota final !” ?
Admito, contudo, que quer o Ministério quer alguns especialistas poderão
ser responsabilizados pelo facto de se ter de realizar nas escolas uma análise
mais atenta – “justificações” chama-lhe
A. Silva – das razões que explicam o facto de numa disciplina haver
mais de 50% de reprovações. E ainda bem que assim é, escrevo
eu. Ainda bem que se elaboram relatórios que poderão, eventualmente,
permitir que alunos com necessidades educativas especiais tenham outras e diferenciadas
oportunidades educativas. Ainda bem, também, que há “planos
de recuperação” que podem, igualmente, permitir aos
alunos menos bem sucedidos não entrar no ciclo infernal das reprovações
crónicas. Esse ciclo que, sob a aparência da exigência e
do rigor, não é mais do que a expressão do laxismo pedagógico
através do qual se acede à solução escolar mais
fácil, a de permitir que só os alunos que se revelem como academicamente
mais capazes consigam obter sucesso em escolas organizadas em função
de tais pressupostos.
Contudo, lendo o texto de A. Silva constata-se que há, ainda, uma distância
significativa entre o que se pretende fazer e o que na realidade se faz. Sobretudo,
quando se verifica que a prática se circunscreve à intervenção
de um “psicólogo a dizer que a criança “revela
dificuldades na aquisição de conhecimentos” e do assistente
social a dizer que o menino “provém de um agregado familiar
desestruturado” ou quando as estratégias educativas aconselhadas
pelos “planos de recuperação” são
do tipo “ensino mais individualizado”, “reforços
positivos” e “sensibilizar o aluno para a necessidade de
se envolver mais empenhadamente no processo de ensino-aprendizagem”.
Eis-nos, pois, perante a fachada inclusiva de uma Escola que encontrou outros
meios e outras estratégias para excluir os alunos que não lhe
interessa, de facto, acolher. E sabendo nós que o M.E. continua a ter
a sua quota parte de responsabilidades nesta situação, sabendo
nós, também, que, na expressão de Hameline, alguns especialistas
especialmente especializados deste país não se encontram isentos
de algumas culpas no cartório, parece-me, apesar disso, injusto, isentar
os professores do seu próprio contributo para que este estado de coisas
se continue a verificar. É o próprio A. Silva que no-lo relata,
quando invoca os normativos utilizados por professores para justificar que um
aluno reprove enquanto outro transita, apesar de ambos terem obtido notas iguais,
explicando, assim, “em acta as complexas razões da injustiça
para que o absurdo pareça razoável”.
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