Comecei a trabalhar como professor de Educação Profissional
em 1973, em cursos noturnos para adultos, em Santos (SP). Durante o dia, trabalhava
como técnico em Eletrónica desde 1965.
No primeiro semestre de 1994 passei a lecionar e a produzir
recursos didáticos também para adolescentes. Foi nesse momento que me vi como
Educador, ou pelo menos, enxerguei que era isso o que os alunos esperavam de
mim.
Para o aluno, sobretudo o jovem, o professor, seja de Eletrónica,
seja de Filosofia, tem que ser um educador. Mesmos os jovens mais rebeldes e
arredios vêem o professor como modelo, e como modelo amplo, não apenas na sua
área específica de conhecimento das humanidades ou das tecnologias, mas sim
como um referencial para a sua postura ética, sociabilidade e até higiene. Eu,
que era um técnico seguro dos meus conhecimentos e de minha experiência profissional
no campo da Eletrónica, senti-me inseguro, felizmente, diante do novo desafio:
ser professor. Essa insegurança, derivada da percepção de que esta nova profissão
exigia de mim responsabilidades muito maiores, levou-me a refletir muito e aguçou
em mim a curiosidade de saber como as pessoas aprendem.
Eu já sabia como os circuitos de um televisor "identificavam"
e separavam os sinais de vídeo, áudio, sincronismo e cor, e como davam o tratamento
adequado a cada uma dessas informações. As pessoas não deviam ser muito diferentes,
embora dispusessem de alguns sensores a mais.
Depois de algum tempo tentando desenhar o modelo matemático
da cabeça do aluno típico, e tentando descobrir o seu circuito equivalente,
percebi que cérebros humanos não obedeciam a uma padronização tão perfeita quanto
a dos receptores de televisão. Não seguiam uma norma técnica. Eram todos diferentes
uns dos outros: uma bagunça!
Vi que meus colegas professores de matérias técnicas aplicavam
provas e classificavam seus alunos em A, B, C e D, de acordo com a quantidade
de respostas certas (ou esperadas) que eles apresentavam. Perguntei a eles para
que isso era feito. A resposta não me satisfez: "A" era equivalente a 9 ou 10,
"B" igual a 7 ou 8 e assim sucessivamente. Perguntei novamente: o que vocês
fazem com esses resultados? "Registramos no diário de classe". (?!)
Percebi então que os alunos eram mais complexos que os televisores,
e que os professores, por sua vez, operavam de uma maneira muito mais elementar
que o receptor de TV.
Qualquer informação obtida por este último é logo transformada
em som e imagem, e há uma terceira, a de feed-back, que o aparelho usa para
corrigir eventuais distorções no áudio ou no vídeo. Um televisor jamais usaria
uma informação apenas para copiar numa tabela.
Para resumir, foi um longo processo até perceber que era uma
falácia o professor achar que o seu dever estava cumprido e que a sua aula havia
sido um sucesso quando alguns alunos haviam aprendido tudo, outros alguma coisa,
e muitos, coisa alguma. Era falso pensar que se alguns aprenderam, todos haviam
tido a mesma chance e o que faltou foi dedicação e esforço por parte dele, aluno.
E esse processo foi ainda mais longo por influência da cultura, do sistema estabelecido
no meio escolar. Os coordenadores perguntavam: - Qual foi a média da classe
2º B? Com isso, reforçavam o conceito de que existia o "aluno médio", para o
qual a aula devia ser planejada e conduzida.
Esses conceitos absurdos, que ainda hoje grassam no meio escolar,
mesmo entre professores egressos de cursos de licenciatura e magistério, são,
no mínimo, de mesma intensidade nos cursos de Educação Profissional.
Certa vez, testemunhei o seguinte diálogo:
Você não era engenheiro?
Era.
E o que fez para virar professor?
Vesti um jaleco azul.
Pensei comigo: ele, como eu, e como grande parte dos professores
universitários e de cursos técnicos, transformou-se em "DADOR DE AULA" em apenas
20 segundos, mas vai custar muito esforço, e demandar muito tempo até que se
torne um Educador, um profissional da Educação.
Muitos alunos vão desistir, muitas carreiras serão prejudicadas
até que ele descubra que necessita ler outros livros e não apenas os de seu
campo técnico, que precisa assinar outras revistas e não apenas "Mundo Mecânico"
ou "Eletrónica Popular". Se for arquiteto, que não veja a cabeça do aluno como
a planta baixa de um prédio qualquer.
Muito ele próprio irá sofrer até perceber que não é o professor
que ensina, mas sim o aluno que constrói o seu conhecimento. E, quando descobrir,
perceber que nessa construção, além de um bom "mestre-de-obras", é necessário
que ele seja um bom animador de equipes e de indivíduos em processo de construção
de conhecimento. Muita energia será desperdiçada até que ele faça melhor uso
da avaliação do que simplesmente classificar os alunos (ou desclassificá-los),
sem levar em conta que existem múltiplas e diferentes inteligências, todas elas
úteis à humanidade e passar, a exemplo do receptor de televisão, a fazer uso
da informação que ele obtém medindo a saída para corrigir as falhas na sua aula,
no seu plano, na sua escola e até no Sistema Educacional.
Hoje, depois de haver passado por cursos de graduação e pós-graduação
no Brasil e no exterior, no campo da Pedagogia; 25 anos de experiências diversas
em Educação, e encontrando-me à frente de um Centro de Formação de Professores
para a Educação Profissional, é que venho, com humildade, dar o meu testemunho
e conclamar os jovens professores ou candidatos à docência, a buscarem uma formação
no campo da Educação.
Não estou recomendando um curso de Pedagogia, mas sim sugerindo
que leiam bons livros sobre Didática, Filosofia da Educação, Planejamento e
Avaliação, entre outros. Que procurem fundamentar sua acção docente estudando
e procurando saber como as pessoas aprendem e que, sobretudo, não reproduzam
simplesmente, com seus alunos, o modelo que receberam de seus professores, mas
busquem uma ação transformadora, colocando-se sempre ao lado de cada aluno,
sempre atentos ao momento sócio-histórico que estiverem vivendo e sempre abertos
a aprender.
Waldemar de Oliveira Junior
Director do Centro Senai Fundação Romi
Formação de Formadores
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