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Agnès Varda: Ainda estou viva. Ainda sou curiosa.

Para o J.S. e o M.R.P.

Agnès Varda fez 90 anos. O The Guardian chama-lhe a avó da Nouvelle Vague. Para comemorar, deu uma grande festa e um mergulho no Atlântico. Varda nasceu na Bélgica, de mãe francesa e pai grego, e cresceu no Sul de França. Nasceu Arlette, mas aos 18 anos mudou o nome para Agnès. Estudou Literatura e Psicologia na Sorbonne, depois História de Arte e Fotografia. Começou a trabalhar como fotógrafa, mas isso não a satisfez. “Era muito silencioso.”
O seu primeiro filme, La Pointe Courte, foi estreado em 1955, filmado em Sète entre a comunidade pesqueira onde cresceu. Como fez durante toda a sua carreira, misturava factos e ficção. A maior parte dos actores era constituída por pessoas reais no seu trabalho quotidiano e apenas dois profissionais, entre eles Philippe Noiret, a sua estreia no cinema. La Pointe Courte é considerado o pioneiro da Nouvelle Vague.
Em 1959, Agnès conheceu o realizador Jacques Demy e foi, como diz, “coup de foudre”. Ambos estavam determinados em mudar o vocabulário do Cinema. Demy fê-lo criando musicais exuberantes em Technicolor sobre a vida quotidiana e com diálogos cantados. Meio século depois, filmes como Les Parapluies de Cherbourg ainda são revolucionários. Varda diz que para ela foi fácil porque as regras eram completamente desconhecidas.
Quando começou a fazer filmes, tinha visto apenas dez. Cléo de 5 à 7 conta a história de uma deslumbrante pop star esperando um diagnóstico terminal, em tempo real; Le Bonheur, sobre um carpinteiro que ama a sua mulher, mas quer mais da sua vida, é filmado como um quadro impressionista. O documentário Les Glaneurs et la Glaneuse é sobre os que colhem o que é deixado nos campos e vinhas depois da colheita – ela viu-se sempre como uma respigadora.
Nos seus filmes nada é desperdiçado; refaz o seu passado, pede emprestados factos aos seus heróis. Os filmes são fabulosamente franceses: experimentais como Godard, fixados na memória como Marker e Resnais, e filosóficos como os três. Mas o que a torna verdadeiramente diferente é que no âmago de tudo há o silêncio e um discreto foco nas mulheres – seja através da taxista em Cléo (muito pouco habitual na altura), do feminismo e do aborto, em L’Une Chante, L ´Autre Pas, ou dela própria em Les Plages de Agnès.
Agnès Varda era a única mulher entre os cineastas da Nouvelle Vague. Terá sido tratada de maneira diferente? “Não, não penso isso. Não me vejo como uma mulher a fazer um filme, mas como um realizador radical que por acaso é uma mulher. Um pouco diferente. Sou uma mulher. Penso que tenho o espírito, a inteligência, a ousadia e a alma de uma mulher.”

Paulo Teixeira de Sousa


  
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