Das propostas apresentadas, destaquem-se a realização de uma assembleia de turma por semana, ajudar quando houver brigas, ajudar os alunos que precisam e organizar uma ida ao cinema todos os meses.
1. Tudo aconteceu por causa da campanha eleitoral para as legislativas deste ano. Era um dia normal na escola, mas lá fora começou a ouvir-se uma voz que reclamava atenção, definitivamente. Não era a carrinha a vender fruta que por aquelas bandas costuma passar. Era um carro com uns cartazes de divulgação política. A voz do carro deu azo a que a planificação, cuidadosamente elaborada para dois anos de escolaridade e vários grupos de trabalho diferenciados, fosse por água abaixo. Como tenho por hábito encontrar positividade em tudo o que (me) acontece, resolvi, imediatamente, sair do plano. A resposta à questão “o que é aquele barulho?” levou-nos a falar das eleições de 4 de outubro, de razões, de procedimentos... E a uma proposta para a realização de uma verdadeira eleição do delegado de turma na nossa sala de aula. O entusiasmo foi claro. Então, foi altura de se estabelecerem prazos e regras. Os alunos interessados em participar como candidatos tiveram uma semana para elaborar o seu programa eleitoral com propostas concretas de ações a desenvolver na turma. Esta foi uma das partes mais difíceis! Na prática, os candidatos do 2º ano tinham de escrever duas ideias para dinamizar a turma e para resolver algumas questões que por vezes acontecem e se devem evitar; os do 3º ano, três.
2. Chegado o prazo para a entrega do programa eleitoral já alguns pré-candidatos tinham desistido. Mas quatro (em dez) foram resistentes. Das propostas apresentadas, destaquem-se a realização de uma assembleia de turma por semana, ajudar quando houver brigas, ajudar os alunos que precisam ou organizar uma ida ao cinema todos os meses. A semana seguinte foi de campanha eleitoral. Todos os dias houve um tempo reservado para os candidatos explicarem as suas propostas e para os restantes alunos colocarem questões. Elaborar questões também não foi fácil! Mas com incentivo e exemplos, as perguntas lá foram surgindo, e até a crítica aos que não fizeram perguntas aconteceu. Algumas questões eram pertinentes: “as assembleias são como as que fazemos, de escola, com os outros meninos?”, “como é que vais resolver as brigas?”, “como é que vais ajudar os alunos que precisam?”, “que filmes é que vamos ver?”, “em que país vamos ver o cinema?”... Estas e outras perguntas tiveram respostas imediatas. “Dá-me uma boa razão para eu votar em ti”, pedi a todos os candidatos, apesar de eu não fazer parte dos eleitores. Todos pediram tempo para pensar pois não sabiam o que responder. E todos os dias perguntavam: “Então, professora, hoje não faz aquela pergunta?” Claro que todos os candidatos construíram um cartaz de apelo ao voto. Dois elementos do cartaz foram iguais para todos: uma fotografia que tínhamos tirado no início do ano letivo (já é tradição) e uma frase impressa dizendo “Vota em mim”. O resto foi trabalho de cada um – de salientar que na contagem decrescente para terminar o cartaz (estabelecer o tempo das tarefas e a conhecida tolerância é fundamental para mim e para eles) houve candidatos e outros alunos que foram ajudar os que estavam mais atrasados, para que todos os cartazes ficassem completos. Missão cumprida! No último dia de campanha houve algumas respostas à difícil pergunta. Destaco: “Eu acho que as pessoas devem votar em mim, porque eu sou responsável e vou tentar fazer as coisas”; “Se votarem em mim, eu pago um almoço a todos, pronto”. O dia seguinte foi dia de reflexão.
3. Entretanto, imprevistos aconteceram. Um dos candidatos torceu um pé e teve de ficar em casa. A sua preocupação maior era se nós íamos fazer as eleições no dia marcado. Claro que não, queríamos que todos tivessem presentes nesse importante momento da vida da turma. Por isso, as eleições foram adiadas. Passados dois dias, tudo aconteceu realmente. A campanha eleitoral nacional teve impacto na eleição realizada na turma. Tudo pronto: a mesa de voto, o boletim e a urna. A urna fugiu ao tradicional sólido geométrico preto e passou a cor-de-rosa, reutilizando uma caixa de sapatos. O secretismo do voto foi respeitado, mas assim que os votos foram contados e registados e aplaudidos o vencedor e os outros candidatos, houve a alegria de dizer em quem se tinha votado. E até houve um candidato que votou noutro candidato, o que o levou a ter zero votos! Passada a euforia... “Ó professora, durante quanto tempo é que temos de fazer as assembleias semanais?”...
Betina Astride
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