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Complexidade, cotidianos escolares e processos avaliativos

Sempre que possível colocamos como questão: em que momento você ensina, avalia, planeja e aprende? De modo geral, temos obtido como resposta: o tempo todo!

Em nossas pesquisas com os cotidianos buscamos problematizar os diferentes processos avaliativos realizados pelos praticantes-pensantes das escolas públicas, assumindo a ideia de avaliação como fio de uma complexa rede de práticas-saberes cotidianos, não podendo ser pensada de modo isolado, isto é, fora de suas relações com os outros tantos elementos do campo educacional que acontecem dentro-fora das escolas.
Nesse sentido, apesar de encontramos bibliografias específicas na área da educação para a diversidade das complexidades que se entrecruzam nesse campo complexus, a partir da produção de discursos sobre temas como avaliação, planejamento, ensino-aprendizagem, currículo, formação, gestão, entre outros que dizem respeito à prática pedagógica, quando nos envolvemos nas redes cotidianas tecidas pelos praticantes-pensantes das escolas, essas possibilidades de organização do campo educacional em unidades de complexidade acabam por fortalecer, contraditoriamente, uma lógica que tem na homogeneidade sua argumentação mais consistente.
De fato, mesmo entendendo que esses discursos têm buscado se afirmar por meio da ideia de complexidade, isso não só tem produzido certo fechamento dos mesmos discursos como, também, tem sido insuficiente para dar conta da educação como um campo complexus. O que estamos querendo dizer é que o uso da noção de complexidade reduzida aos diferentes temas da educação, em muitos casos, tem oportunizado homogeneidades, compartimentalizações e especialismos.
De modo geral, isso pode ser percebido nas imagens-narrativas de muitos professores que, ao considerarem a avaliação como uma “prática complexa” e, com isso, circunscrevendo-a com limites bem definidos em um dado campo teórico-metodológico específico, clamam pela urgência de referências mais precisas sobe “como” e “o que” avaliar e, por consequência, pela busca de outros instrumentos mais consistentes que possam dar conta do que está sendo ensinado.
Essas urgências e buscas, mesmo quando supostamente respaldadas por ideias ou teorias que defendem que o conhecimento se processa em múltiplas redes e, portanto, tem uma dimensão de complexidade que precisa ser considerada, acabam por reduzir a avaliação a uma prática localizada, pontual e individual de verificação das informações que foram transmitidas nas salas da aula.

Problematização permanente. Entretanto, se as ideias de complexus e de redes de conhecimentos fundam-se, entre outros princípios, nas potências das dimensões das relações estabelecidas entre os praticantes-pensantes, isto é, nos processos coletivos e, ainda, nas incompletudes e interações entre os diferentes campos do conhecimento, qualquer tentativa de hierarquização, classificação e medição decorrentes da avaliação, jogam por terra as ideias de complexus e de redes tomadas como princípios do trabalho pedagógico.
De fato, essas ideias implicam problematizações e deslocamentos dos saberes-práticas de avaliação em direção às redes tecidas, atitude que supõe, entre outras coisas, conviver com permanentes linhas de fuga que se mostram nas instabilidades, homogeneidades, tentativas de controle e padronização, indeterminismos, negociações, resistências, invenções, hibridizações e imprevistos vividos nos cotidianos escolares.
Assim, assumir o conhecimento como redes de saberes-fazeres e a educação como campo complexus, pressupõe destituir a avaliação de seu sentido tradicional de verificação, classificação e controle do outro tomado em sua individualidade. O desafio que se coloca então é o de ao desqualificar o sentido tradicional de avaliação, produzir outros sentidos que apostem na possibilidade de entendimento e de ação nessas redes, aproximando-nos da noção de avaliação como uma permanente e sempre aberta prática de problematização daquilo que acontece nos cotidianos escolares.
Desse modo, em nossas pesquisas, temos nos empenhado em mostrar a urgência da necessidade de produção de outras imagens-narrativas para o campo educacional que possam, minimamente, articular os diferentes discursos complexos especializados e, sobretudo, que possam nos ajudar a entender a educação como complexus, não como justificativa para os limites e as impossibilidades desses saberes-práticas cotidianas, mas como potência de problematização e fundamentação epistemológica das mesmas.
Nesse sentido, sempre que possível colocamos como questão: em que momento você ensina, avalia, planeja e aprende? De modo geral, temos obtido como resposta: o tempo todo!

Carlos E. Ferraço e Janete M. Carvalho


  
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