No contexto de uma série daquilo que a imprensa hegemônica vem chamando de “escândalos”, envolvendo a distribuição farta de dólares aos políticos do que esta mesma imprensa chama de “base aliada do governo”, vem ganhando grande destaque manifestações de rua chamadas pela classe média, sem presença visível dos partidos de “oposição”: a primeira aconteceu em 15 de março e a segunda em 12 de abril. Na segunda, um porta-voz dessa imprensa assim se exprimiu em manchete: “A Avenida Paulista voltou a ser palco neste domingo, 12 de abril, do maior ato do dia de protestos contra a corrupção e o governo da presidente Dilma Rousseff, assim como já havia acontecido em 15 de março. Mas o público foi menor do que há um mês.” Nesse mesmo fim de semana, quando a presidenta participava da cúpula das Américas e se sentava na mesma mesa dos presidentes do Panamá, que recebia o encontro, do México e dos Estados Unidos – ou seja, daqueles que dirigem os principais países do continente –, ninguém fez notar isto, em um contexto no qual o importante é ‘fazer subir o dólar e abaixar as ações da Petrobrás’. Quero, no entanto, chamar a atenção sobre outra coisa, a partir de uma faixa produzida por um professor que apareceu nas redes sociais, na manifestação de 15 de março, em S. Paulo, e que continua a repercutir até hoje entre os professores e professoras que se mostram indignados com a mesma. Paulo Freire, nosso educador maior, que formou e forma, com suas ideias, sucessivas gerações de professores é nela citado negativamente – “Basta de Paulo Freire!” A indignação de todos é assim, bastante explicável. Mas quero ir por outro caminho: mostrar o que significa de possibilidade de democracia os governos aos quais o uso da rua para manifestação não tem assustado e que não têm tomado nenhuma medida contra, sequer contra a imprensa hegemônica, como aconteceu na Venezuela ou na Argentina, por exemplo.
A praça é do povo. Frente às manifestações de junho/julho de 2013, essas sim, envolvendo milhões de pessoas em praticamente todas as cidades brasileiras, houve por parte do secretário de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro, a tentativa de passar normas (que valessem para o país) que transformavam os manifestantes em “terroristas” – palavra de ordem na agenda diária dos países desenvolvidos. Em primeiro lugar, procurou a Presidência da República, através do ministro da Justiça. Não foi feito nenhum caso disto, nem nenhuma providência foi tomada. Esse mesmo secretário foi, então, à Câmara, entregar aos deputados um projeto de Lei, que agora, com os que estão dirigindo as duas casas legislativas (Câmara Federal e Senado), talvez venha a ter espaço na “revolta” em que estão contra a presidenta, na busca de mais cargos em ministérios e de tencionar – junto com a imprensa hegemônica – fugir do processo de corrupção em que estão denunciados. Embora também indignada com a tentativa de fazer calar aqueles que foram formados pelo pensamento de Paulo Freire, quero mostrar as formas democráticas que avançaram no Brasil com os governos pós-ditadura, em especial os dois presididos pelo Partido dos Trabalhadores (PT), o que permitiu que um professor de História paulista fosse para a rua com aquela faixa. Castro Alves (1847-1871), poeta maior do romantismo brasileiro, nos declarou que “a praça, a praça é do povo / como o céu é do condor”, sem que os céus brasileiros tenham jamais visto um condor, pois esta é ave de outras paragens, mas que nos dá uma bela imagem para as manifestações de rua como direito de todos, até mesmo de um professor que não quer garantir a outros que exerçam sua profissão dentro de ideias diferentes das suas. Isto permitiu ‘conversas’ e discussões infindáveis sobre os direitos deste professor expressar suas ideias e como isto se dá como garantido por presidentes que sofreram o período de falta de liberdade de expressão, durante os governos da ditadura. Uma linda lição pode ser tirada disto tudo: os debates de ideias estão abertos em um contexto da expressão internacional de um país que melhorou economicamente e criou condições de expressão democrática a qualquer um
Nilda Alves
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