Um novo paradigma de aprendizagem – a conetividade. O saber não está só no indivíduo, mas nos meios tecnológicos que o rodeiam. Ao saber e ao saber fazer, acresce agora uma outra dimensão: o saber onde (know where).
George Siemens, o autor que propõe o conceito, regista que a semivida do conhecimento é cada vez menor. O saber está constantemente a tornar-se obsoleto – metade do que é hoje conhecido era desconhecido há dez anos. Também os contextos de aprendizagem se modificaram: desenvolvem-se agora em comunidades de prática e em redes sociais na net. O indivíduo encontra-se ultrapassado pela velocidade da informação. Em vez de a interiorizar ou apropriar-se dela, no sentido tradicional do termo, só lhe resta tornar-se mais um nó na rede. Quais as consequências deste estado de coisas? No interior de uma abordagem pragmática tão ao gosto anglo-saxónico, Siemens propõe, a propósito destas ligações às tecnologias, uma visão educativa e, de certo modo, otimista. O indivíduo passa a ser um nó na rede e, para ser adaptativo, o melhor é que se torne um nó eficaz. O pensamento deixa de estar centrado no ser humano, mas na relação dele com as redes de informação. Em Siemens, o pensamento corre o risco de ser reduzido a uma das partes que o integram – a performance. Ou seja: saber-onde e completar com sucesso tarefas na web, por exemplo, é apenas um nível de competência. O pensamento exige reflexividade e visão estratégica sobre o que se faz. Eis alguns aspetos que poderão ser negligenciados por esta abordagem. Socorro-me agora de um autor incontornável da escola francesa para pôr um pouco em perspetiva o interessante conceito de Siemens. Bernard Stiegler assume uma posição mais reservada: a nossa relação com as tecnologias possui um enorme potencial de alienação. Apoiado nos trabalhos de André Leroi-Gourhan, defende que a cultura resulta em grande parte da exteriorização do conhecimento em objetos. Assim, uma faca ou um objeto de cerâmica pressupõem, por si mesmos, conhecimentos que implicam a sua passagem de geração em geração. A hipomnésia corresponde exatamente a um estado em que as componentes da memória são cada vez mais confiadas à tecnologia. Copo meio cheio, meio vazio? Penso que a proposta da conetividade é bastante interessante em termos educativos, assim como o próprio desenvolvimento de competências de know where. Estes objetivos podem permitir a construção de abordagens que permitam trabalhar as vivências ‘tecnológicas’ atuais dos nossos adolescentes. Esta ação não contraria, aliás, as posições de Stiegler: o autor defende uma regulação da “paisagem audiovisual”, de forma que se torne menos agressiva e alienante. A educação será com certeza uma dimensão incontornável neste propósito. A ideia de know where só aparentemente é inovadora. Melhor dizendo: é inovadora no que se refere ao contexto em que ocorre, as novas tecnologias. Desde a antiguidade que a procura do melhor mestre foi uma preocupação para as famílias letradas da nossa civilização e que o debate em tertúlias de iguais serviu propósitos de desenvolvimento pessoal dos seus membros. Atualmente, já sabemos, o mestre, o detentor da informação não é apenas o professor. É neste contexto de aceleração informativa que cumpre selecionar e escolher o conhecimento mais válido e eficaz, mas é também neste contexto que é necessário um esforço de reflexividade – no fundo, um esforço de caráter ético para não nos limitarmos à dimensão performativa das coisas. Essencialmente, o pensar sobre a desigualdade: eficácia nem sempre é igual a verdade.
Rui Tinoco
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