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Tensões sociais e conflitos na escola: da prevenção e da resolução

Não há vida sem tensões, seja na escola, seja no amor, nas relações entre pares, entre crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos, géneros, gerações, etc. Provavelmente, deveríamos mudar um pouco, não só o nosso vocabulário, mas também, e principalmente, as nossas representações sobre a natureza das tensões. Elas fazem parte da normalidade da vida.

As tensões, em si, não são uma patologia social. O que não significa que não tenha de haver mediação preventiva para a aprendizagem da convivência e para a paz social, o que implica sempre uma construção. As tensões são o tempero das relações humanas e nem sempre deveriam ser vistas como um problema ou mesmo como um conflito.
O mesmo se tem de pensar sobre a escola, as turmas, os alunos. Quantas vezes não ouvimos dizer “esta turma é problemática”, “esse aluno é um problema”? Estes discursos denotam a idealização de um mundo cor-de-rosa.
Alguns professores, mesmo que não tenham consciência disso, estão a criticar a realidade escolar, que é sempre social, pondo a tónica no essencialismo. Mas não são as pessoas, os alunos, as turmas, os grupos que são problema em si; que são indisciplinados em si. Urge desconstruir este essencialismo do conflito, como se de um corpo atingido por uma bactéria conflituosa se tratasse. Temos de aprender a pensar de forma mais relacional e não nos casos/pessoas como coisas descontextualizadas. Como nos lembra Bertolt Brecht, “do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem”.
Por isso, na escola ou noutras instâncias sociais, não se deve pensar, apenas, no final da linha, quando, efetivamente, o conflito se agudiza. Antes da foz já o rio era rio e já as margens o comprimiam, levando-o a correr mais velozmente ou mesmo violentamente, como é o caso dos rápidos. Antes, portanto, já as tensões existiam. Tensões que são o desencontro cultural entre os diferentes que habitam um mesmo mundo.
Mas a verdade é que, nesta matéria, é muito mais usual ouvirmos falar de conflitos do que de tensões. Até parece que estamos, quase sempre, em guerra, o que não é verdade.

Da nossa parte, preferimos reservar o conceito de conflito, normalmente entendido como um problema, para situações mais específicas – elevado grau de tensão social – e para o resultado da ausência de mediação preventiva durante os processos sociais que são, no nosso entender, sempre geradores de concórdias, discórdias, mas também de diferentes posicionamentos de opinião, de linguagem e de decisão, o que, como dissemos, gera sempre tensões.
Já pensaram no que seria a vida se todos estivessem de acordo? O que seria se houvesse sempre concordância nas relações sociais? Uma maçada. O pensamento avança pela divergência, pela discussão, pelo diálogo – que é sempre, também, confrontação, logo, tensão.
Não se trata, portanto, de dizer, apenas “ámen”. Trata-se, antes, de cultivarmos um espírito aberto à divergência de opiniões e de percebermos que isso gera tensões, mas que sem elas tudo seria algo sem graça. Como diz Saint-Exupéry, “se tu diferes de mim, não me diminuis, enriqueces-me!” E a escola pode ser (e é) o grande laboratório da aprendizagem da vivência social, uma vivência entre iguais e diferentes; uma vivência entre convergências e divergências; um espaço de aprendizagem da interculturalidade, da convivência e da hospitalidade.
Pelo seu caráter obrigatório e universal, nas sociedades ocidentais, a mesma escola acolhe de forma prolongada as crianças e jovens de uma dada classe etária, do género masculino e feminino, de todas as condições sociais, origem étnica, religiosa e outras. Mais do que, porventura, qualquer outra instituição social, a Escola integra todas as diversidades sociais e culturais representadas na sociedade.
Por isso, a concretização de uma escola para todos obriga a uma preparação da Escola para mediar tensões, resolver conflitos e lidar com a diversidade de forma inclusiva.
A mediação é considerada aqui, assim, uma filosofia de ação social que aposta numa política não monolítica (em que há apenas um ponto de vista, o lugar de quem fala), mas antes numa filosofia que aposta na negociação entre as partes, que não são só as partes de um conflito terminal.
Neste sentido, a mediação que preconizamos enquadra-se num paradigma intercultural, no qual se reivindica uma escola para todos e não todos para uma escola.

Ana Vieira


  
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