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O problema da inclusão não se resolve criando mais problemas de inclusão

Resposta a João Teixeira Lopes
Professor e Deputado do Bloco de Esquerda

Em artigo de opinião publicado neste jornal, João Teixeira Lopes (JTL), estimado colega, camarada e Deputado à Assembleia da República pelo Bloco de Esquerda, teceu duras críticas à actuação da Direcção da Área Sindical de Bragança do Sindicato dos Professores do Norte?SPN, relativamente à criação duma turma de etnia cigana na Escola Augusto Moreno. Eis alguns comentários, que também podem ser tomados em jeito de resposta:
1 ? na primeira metade do artigo, JTL dedica-se a tecer um conjunto de considerações genéricas sobre a natureza histórico-sociológica e política da exclusão social. Bem conhecidas, merecerão certamente a concordância de todos, incluindo a nossa.
2 ? na segunda parte do artigo refere-se aos protestos de pais e responsáveis escolares, à complexidade da questão/problema, à tomada de posição dos encarregados de educação e à actuação do SPN.
3 ? JTL começa a segunda parte do seu artigo por se referir a um facto: o coro de protestos contra a eventual criação e inserção (a palavra é de JTL e é interessante) duma turma constituída por elementos de etnia cigana, no âmbito do Programa PIEF.
4 ? resta saber o que originou a contestação à iniciativa; JTL dá-nos parte da resposta: ?Desde logo, porque a entrada dos jovens ciganos é forçada. Em segundo lugar, porque é feita à pressa, por via administrativa, sem envolvência da comunidade escolar e, acima de tudo, sem um projecto educativo e curricular que proporcione aos jovens ciganos algo mais do que uma obrigação que têm penosamente que cumprir?. JTL generaliza. Nós devemos e podemos ser mais precisos. A decisão sobre a constituição da nova turma é imposta pelo ME, sob ameaça, sem que antes se faça qualquer consulta aos órgãos da Escola. Por sinal, esta Escola é aquela que possui, na zona, o mais jovem Conselho Executivo ? o elo mais fraco, portanto. Dizer-se que a decisão tomada é apressada é dizer-se pouco. O ME constitui uma lista de alunos com várias proveniências relativamente aos quais nem sequer teve o cuidado de actualizar os seus dados, a começar pela idade. O resultado seria a inserção duma turma constituída por vários alunos (alguns actualmente fora do país) com mais de 16 anos, muitos dos quais haviam já abandonado experiências semelhantes ? isto, numa escola cuja faixa etária dos seus estudantes ronda os 11 anos. A decisão do ME é irresponsável porque ao impor a inserção da nova turma, sem mais, põe em causa um Projecto Educativo destinado exactamente à promoção duma Escola Inclusiva. A Augusto Moreno é frequentada por muitos alunos filhos de pais de etnia cigana ou de emigrantes do Leste, cuja presença nunca foi contestada. A sua inclusão deu-se e dá-se ao nível pessoal e da realização escolar. O que não é possível é tratar uma escola como se dum condomínio se tratasse. É aqui que as palavras inserção e integração fazem toda a diferença. A Direcção do SPN-Bragança procura sempre a integração em nome da promoção de Projectos Educativos inclusivos. O ME pretendeu a inserção duma turma, alugando para o efeito um espaço na Augusto Moreno. Aliás, a melhor forma de se comprometerem políticas e escolas inclusivas é desenvolver acções a martelo cujo destino será sempre o fracasso e a legitimação de políticas segregadoras pois, como se viu, as outras não funcionam? Nunca poderemos permitir que se violente uma comunidade educativa em nome do cumprimento de critérios administrativos só porque é preciso gastar dinheiro previamente destinado a projectos, só porque se torna imperativo apresentar estatísticas a qualquer preço. Não se resolve o problema da inclusão criando problemas de inclusão. Por muito bem que depois fiquemos na fotografia das estatísticas.
5 ? a questão é complexa. Por essa razão não pode ser tratada na dicotomia do preto-e-branco, como JTL acabou por fazer. O facto do SPN-Bragança estar contra a decisão do ME não significa estar do lado de pais ou de docentes portadores de sentimentos e práticas xenófobas ? que também os há. O SPN-Bragança bate-se pela afirmação de princípios e práticas inclusivas. E fá-lo-á sempre e com todos aqueles que queiram partilhar esse caminho de luta e conquista social. Por isso, a nossa luta não é a mesma. É diferente. E muito. Neste caso, o nosso caminho cruzou-se (e bem) com o dos representantes dos pais e com o dos dirigentes da Escola Augusto Moreno em favor da inclusão e não da xenofobia, ainda que assim não apareça perante os holofotes do imediatismo da agenda mediática. JTL sabe que a questão é complexa e conhece os riscos de seguirmos a agenda mediática e a construção social que daí advém. Escreveu-o, até. Pena é que não tenha praticado esse conhecimento, deslocando-se ao local enquanto deputado e tocando de perto a realidade e os seus actores.
6 ? no que toca à Direcção do SPN-Bragança, a luta pela inclusão é permanente. É um processo dinâmico e socialmente construído. Faz-se de conquistas, recuos, aprendizagens e até de erros. Nessa medida, estamos a organizar um espaço de debate para o qual esperamos poder contar com a presença dos vários intervenientes neste processo (incluindo JTL). Lá estaremos para, se necessário, reconhecer erros e inventar novos caminhos. Assim outros estejam disponíveis para o fazer. A bem da inclusão social.


  
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Edição:

N.º 132
Ano 13, Março 2004

Autoria:

Direcção do SPN - Bragança

Direcção do SPN - Bragança

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