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Fernando António Almeida - ou o gosto de descobrir outras gentes e lugares

Fruto de uma selecção dos textos que regularmente, durante oito anos, publicou no "Expresso" até Maio de 1997, o novo livro de Fernando António Almeida - Pelos Caminhos de Portugal - revela-se sobretudo como uma escolha ou sugestão da redescoberta de gentes e lugares mais distantes e menos conhecidos das terras portuguesas e ainda dos Açores e da Madeira. Pelo modo de ser caminhante de várias navegações, a olhar e ver, a admirar e a fotografar, na esteira e inspiração de Raul Proença e do tão celebrado Guia de Portugal que começou a ser editado em 1923, o autor de Percursos de Fim-de-Semana revela-se como um poeta que sabe muito bem olhar e reparar nas paragens, pedras, sítios, enfim, nos diferentes "percursos" redescobertos de um modo tão pessoal e agora apresentados neste livro que é ainda um objecto para os olhos de quem deseja conhecer lugares menos divulgados nos tradicionais "caminhos" de férias ou de turismo. Por isso, nesta descoberta de um Portugal feita por dentro, ou seja, visto sobretudo nas suas paragens mais longínquas e esquecidas dos roteiros habituais, Fernando António Almeida acaba por manifestar que, além do mais, no desvendar destes caminhos para o leitor menos avisado, tem a preocupação de fazer conhecer aos outros aquilo que os seus olhos viram e a máquina fotográfica registou.
Trata-se, pois, de um livro-documentário dos caminhos e regiões a descobrir do Minho ao Algarve, aos Açores e à Madeira, em itinerários que nos colocam em contacto com lugares e paisagens poucas vezes admirados ou visitados, descobrindo ao mesmo tempo a própria arquitectura, a arte, a gastronomia, as tradições e as gentes desta nossa terra tantas vezes ignorada, apesar do esforço publicitário de que se deve "fazer férias cá dentro" em vez de curtir, por ser moda e de bom-tom, o sol das Canárias ou das Caraíbas, que se não podem confundir com a Costa da Caparica ou a Fonte da Telha.
Numa linguagem objectiva, rigorosa e aliciante, que se torna mesmo de estimulante leitura, Fernando António Almeida viaja assim no tempo com os outros, mesmo quando as viagens se fazem em solidão e solitariamente se mostra interessado em descobrir o outro lado da paisagem física, humana e geográfica de Portugal, ainda na memória de Aureliano Lima, poeta e escultor nascido no Carregal do Sal e que faleceu em Gaia em Dezembro de 1984, ter em tempos proclamado que viajar é bom / e fica na biografia.
Mas Pelos Caminhos de Portugal é um livro elaborado com um rigor informativo e actualizado que não espanta, porque o autor de Beira Litoral, além de fazer com que os leitores conheçam um outro Portugal - não o do olhar do turismo oficializado ou orientado em itinerários nem sempre bem estruturados -, evidencia ao mesmo tempo um conhecimento profundo dos aspectos culturais e humanos,geográficos e paisagísticos de lugares minhotos como Campo do Gerês ou Vilarinho da Furna, as terras de Amarante ou de Sabrosa, as zonas marítimas de Ovar e Furadouro, ou também Coimbra, Celas e Tentúgal de muitas histórias, a planície ou a costa alentejana, os caminhos algarvios de Alzejur, Fuzeta ou Vila do Bispo, a água e o fogo das ilhas açorianas de São Miguel e de São jorge, ou gentes sempre lembradas da Madeira pela névoa, o sol e o mar do Machico, Pico do Areeiro ou Porto Santo. E por todos esses lugares de peregrinação, Fernando António Almeida conduz o seu leitor nos caminhos de descoberta e viagem como cicerone que sabe os trilhos que percorre, revela um modo singular de falar das gentes e dos lugares, sempre com o propósito de privilegiar o acto natural de viajar, a constante mudança que a viagem implica, mas acima de tudo como sugestivo convite à viagem e à descoberta de lugares e paragens que poucas vezes aparecem nos folhetos ou programas de férias.
Por isso, vale a pena acompanhar esta viagem em comum com a forma inteligente, culta e sensível de Fernando António Almeida, colher todos os elementos informativos que nos oferece no fim de cada "caminho" descrito, preparar o saco e partir com o livro debaixo do braço na reconquista de um outro Portugal, ou ainda o mesmo na evocação de serem de hoje (e bem nossas) estas viagens feitas na nossa própria terra como o foi para Garrett a impressiva descoberta dos campos verdejantes do Vale de Santarém ou a lembrança dos olhos tristes de Joaninha. Mas, pela diversidade de propostas e sugestões, estes diferentes itinerários descritos em Pelos Caminhos de Portugal é, sobretudo, o modo inteligente de saber viajar e descobrir nos tempos livres a verdadeira liberdade do espírito: a de saber que temos um património cultural, natural e construído que interessa preservar, conhecer e divulgar. Esta edição valoriza-se ainda pela abundante qualidade fotográfica dos motivos sugeridos ao leitores, acompanhados pelos roteiros e também pela soma de informações (gastronomia, cultura, hotelaria, bibliográfica, etc.), fazendo com que Pelos Caminhos de Portugal se afirme como um atraente "livro de viagem" ou o companheiro útil de todas as horas na redescoberta de outros caminhos de férias e lazer.

Serafim Ferreira

Fernando António Almeida
PELOS CAMINHOS DE PORTUGAL
Ed. Círculo de Leitores / Lisboa, 1998.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 96
Ano 9, Novembro 2000

Autoria:

Serafim Ferreira
Escritor e Crítico Literário, Lisboa. Colaborador do Jornal A Página da Educação.
Serafim Ferreira
Escritor e Crítico Literário, Lisboa. Colaborador do Jornal A Página da Educação.

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