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Avaliação de professores e cultura de escola

Há alguns anos, foram os professores que, vendo pouco reconhecido(s) o(s) seu(s) trabalho(s), entenderam ser necessária uma verdadeira avaliação nas escolas. Começava a falar-se de autonomia e a perceber-se que ela só poderia ser um processo de auto-regulação dos próprios estabelecimentos de ensino e dos seus actores.
A avaliação de uma escola tem como primeira variável a intenção geral de quem quer avaliar: ou o Ministério da Educação, ou os órgãos de Gestão, ou os pais e os alunos, ou a comunidade local, ou a sociedade em geral. Ou os professores. Aparentemente, o interesse deveria ser o mesmo para todos. Mas não. E não se trata apenas de perspectivas de diferentes vertentes, como avaliação externa, ou interna, ou auto-avaliação. No momento, ao apresentar propostas para avaliar escolas e docentes, o ME fá-lo com discursos em que está implícita a ideia de que as coisas estão mal. Mas avaliar sistemas ou indivíduos não é o mesmo.

Avaliar, estimar, calcular, louvar, aparecem, entre outros, como sinónimos. Avaliamos para quê? Para controlar algo importante em termos sociais. Para aprovar aquilo que se está a fazer bem e se quer continuar, para distinguir o trigo do joio se este existir, enfim, para mudar, para melhorar, para justificar. Errada é a concepção segundo a qual só se avalia o que está mal: as causas do insucesso escolar, ou o ?pouco tempo de trabalho? dos professores, segundo alguns ?iluminados?. A avaliação faz parte do quotidiano de cada ser vivo. As escolas podem (e devem) implementar formas de auto-avaliação; mantendo observatórios permanentes de qualidade.

Um dos problemas é o conceito de escola. Há muito a fazer no caminho da participação democrática. Afectar docentes, discentes, funcionários, pais e outros membros da comunidade implica uma cultura de escola de enorme abertura, de muito trabalho e de uma grande dedicação por parte dos órgãos de gestão. Uma escola que pertence efectivamente à sociedade que a entrega com toda a confiança aos seus ?produtores e realizadores?. Esta ?revolução? de ideias, que já esteve mais próxima do que hoje, não é só aplicável aos estabelecimentos de ensino. A autonomia, forma de regulação, exige, por parte da gestão hierárquica a vários níveis (ME, DREs, Instituições de Formação), a criação e a aceitação de um novo professor, cujo perfil se vem delineando desde meados do séc. XX, mas parece nunca mais ser susceptível de ser consolidada; um professor que já não é em grande parte o executante típico da sociedade capitalista, mas que estará directamente implicado na selecção da cultura escolar a veicular e na definição dos saberes necessários à formação de alunos; independentemente do facto de haver competências essenciais definidas a nível nacional. Claro que uma escola com maior complexidade exige um maior nível de formação que possibilite uma correcta escolha colectiva, criada contextualmente em termos de auto-avaliação e não importada.

Como parece ficar definido, os conceitos de escola e de professor acima referidos, só são possíveis no âmbito de uma Cultura do Local; que, em Portugal, pelos atrasos cada vez mais acumulados provocados pela inexistência de regionalização, há-de demorar a implementar.

Mas talvez as vontades políticas deixem de estar tão concentradas nos umbigos próprios. Por isso estaremos todos numa manifestação no próximo dia 5 de Outubro. E talvez os jornais mudem e vejam o que é a classe docente. (Ou teremos que fazer um ?dia sem jornais?? Ou uma semana? - fica aqui a ideia, que não é má de todo).

Não traz nada de extraordinário a avaliação feita no contexto de trabalho, de forma transparente e democrática, respeitando as diversas formas de ?estar? na escola, livremente escolhidas por diferentes professores (se alguém for classificado com uma ?nota? que lhe proporciona uma outra subida na carreira, que isso corresponda a critérios bem definidos e aceites pela comunidade escolar) e sem esquecer que no passado de cada docente há já muitas provas dadas de dedicação mais do que total à profissão.

Que nós, os professores, queremos avaliação.

Em nome da dignidade, claro!


  
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Edição:

N.º 159
Ano 15, Agosto/Setembro 2006

Autoria:

Rafael Tormenta
Professor do Ensino Secundário
Rafael Tormenta
Professor do Ensino Secundário

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