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Repressão aumenta nas escolas inglesas e seduz ministro francês

Pórticos de detecção de metais e armas, policias nas escolas, expulsão dos alunos problemáticos, multas financeiras aplicadas aos pais: as escolas britânicas passaram a dispor de um menu de medidas repressivas com a justificação de luta contra a indisciplina e a violência em meio escolar.

No ano lectivo de 2003/2004, segundo informa o ministério da educação inglês, 9.880 alunos ? de um total de 7,5 milhões ? foram expulsos do ensino nas escolas inglesas. Em cerca de 20 por cento dos casos a expulsão esteve ligada a uma agressão contra colegas.
O Governo de Tony Blair fez da luta contra a indisciplina e o absentismo a sua prioridade educativa. «Uma boa disciplina e comportamentos satisfatórios são vitais para que os professores possam ensinar e os alunos aprender. A disciplina é considerada satisfatória em 99 por cento das escolas primárias e em 94 por cento das secundárias inspeccionadas em 2004/05», diz o governo no seu «plano de acção para o respeito», tornado público no passado dia 10 de Janeiro.
As escolas que têm problemas podem agora pedir apoio à policia de proximidade. «Nalgumas escolas, um policia permanece ali de serviço, ou vem algumas horas por semana, e isso dá bons resultados. Ele fala aos alunos reunidos em assembleia de modo a fazer prevenção. A sua presença tem também um papel dissuasor», assegurou um porta-voz do ministério.
«Nós encorajamos os directores das escolas a pedirem à policia que faça revistas inesperadas aos alunos procurando armas brancas e desencorajando os alunos de as possuir», disse também o ministro da educação britânico.
Quando se desconfia que um aluno tenha uma arma o director da escola pode chamá-lo ao seu gabinete e revistá-lo sem o seu consentimento ou pedir à policia que o reviste. O director da escola tem também poder para revistar o cacifo do aluno ou a sua mochila, mesmo sem o seu acordo.
Com as novas medidas, os directores passaram a ter uma grande autonomia para tomarem as medidas que entenderem necessárias. Alguns, como os de uma escola primária de Bradford, instalaram câmaras de vigilância nas salas de aula. Outros, como em Faversham, submetem à sorte alunos a exames para detectar o consumo de estupefacientes. As escolas têm também cada vez mais câmaras de vigilância e interfones, na entrada e no seu perímetro,  para detectar a entrada nas escolas de eventuais intrusos. A colocação de detectores de metais à entrada, com o objectivo de detectar armas, é cada vez mais frequente.
O Governo de Blair anunciou em 10 de Janeiro uma série de medidas tendo como objectivo combater a indisciplina e a violência escolares. Algumas medidas são dirigidas aos pais, nomeadamente a oferta de formação em «competências parentais» e cortes no abono de família aos pais que não controlam os filhos.
A par destas medidas mais espectaculares de repressão, as escolas querem também tomar outras que se consideram de prevenção. Entre estas estão a educação contra o uso de armas e as semanas contra a agressão mútua [anti-bullying]. «As escolas têm de criar sentimentos de auto-estima. Matérias como o teatro, a música ou as artes podem dar aos alunos momentos de conhecimento mútuo e ajudar a melhorar a situação», diz um especialista em educação.
Por seu lado, o ministro da educação francês, Gilles de Robien, após visitar algumas escolas inglesas com policias no seu interior, rendeu-se ao modelo apesar de ter ouvido professores ingleses criticar fortemente a medida. «Dentro de algumas semanas apresentarei no meu país um plano contra a violência na escola e, entre outras medidas, figurará a presença de um polícia nos estabelecimentos», afirmou o ministro apesar da feroz oposição a esta medida, que sabe existir em França, por parte dos professores e de algumas associações de pais.
Gilles de Robien, numa escola secundária inglesa, quis ouvir o policia de serviço, um jovem de 32 anos, loiro, de olhos azuis, destacado numa escola frequentada essencialmente por estudantes com idades entre os 11 e os 19 anos,  na sua maioria de pele escura e de origem paquistanesa ou afro-caribenha. «Represento um elo entre a policia e a escola. Ensino a educação cívica. Ajudo a escola a lutar contra o absentismo e os problemas de comportamento e faço trabalho policial no exterior das aulas», explicou ao ministro o jovem policia loiro.
Acompanhantes do ministro francês relataram que os professores destes estabelecimentos de ensino foram muito críticos em relação à situação nas escolas inglesas. «Isto é tudo fogo de vista, um artifício, e não resolve o problema dos jovens que já caíram na delinquência. A presença do policia não resolve nada», afirmou uma professora de literatura.
Em França, a oposição a este tipo de medidas, essencialmente de cariz repressivo, é muito forte por parte dos professores e de alguns pais. Duvida-se que a resolução dos problemas, resultantes da indisciplina e da violência em meio escolar, passe apenas por aumentar a repressão sobre os estudantes. O que está em causa é saber se o modelo tradicional de escola ainda responde às novas necessidades de educar toda a população. Importa saber se é ou não preciso repensar as políticas e as práticas sociais e se é possível resolver problemas da escola sem mudar a sociedade. É possível que se tenham de distinguir os problemas que nascem nas famílias e na sociedade e os que são fruto da própria escola.  Talvez a escola tenha de ser repensada nos seus objectivos, meios e, sobretudo, dimensão e organização. O debate sobre o desajustamento da escola que temos está por fazer. A panóplia repressiva corre o risco de o adiar.


  
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Edição:

N.º 153
Ano 15, Fevereiro 2006

Autoria:

José Paulo Serralheiro
Professor e Jornalista. Director do Jornal a Página da Educação.
José Paulo Serralheiro
Professor e Jornalista. Director do Jornal a Página da Educação.

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