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Bebés e chefes

CONCILIAR A VIDA FAMILIAR E PROFISSIONAL

A decisão sobre quanto tempo deixar o trabalho para tomar conta de uma criança é determinada pela perda de rendimentos que daí advém. O modo como essa perda de rendimentos impede, por exemplo, o gozo da licença de maternidade ou paternidade vai depender de dois factores: os ganhos do cônjuge e o custo com serviços alternativos de guarda da criança. Reconciliar o trabalho com a vida familiar é um desafio que se coloca à sociedade actual. Quem dá o alerta é a OCDE, no relatório ?Babies and Bosses? (Bebés e Chefes), um estudo sobre politicas de apoio à família que compara a situação actual em alguns dos seus países-membros. Portugal, Nova Zelândia e Suíça, formam um dos grupos comparados. Canada, Finlândia, Suécia e Reino Unido, constituem um segundo grupo.
De modo geral, quanto menor a perda monetária, mais provável é que os pais gozem de uma maior licença do trabalho para cuidar dos filhos. Uma pesquisa realizada em 2003 entre as mães da Nova Zelândia confirma que durante as 12 semanas em que o período de licença parental é pago, apenas dois por cento de mãe regressaram ao trabalho; 12 por cento das mães cumpriu as 12 semanas; 32 por cento tencionava gozar entre 13 a 51 semanas e 45 por cento planeava gozar a licença completa, 52 semanas.
Aqui, tal como acontece em todos os países analisados, verifica-se que são as mães e não os pais, quem por hábito deixa de trabalhar ou reduz o horário de trabalho para tomar conta dos filhos. A justificação está sobretudo no facto de os ganhos auferidos pelos homens serem, geralmente, maiores que os das mulheres. Esta distribuição tradicional dos ganhos do agregado familiar é visível em todos os países, mas menos acentuada em Portugal.

Portuguesas trabalham mais que as suas congéneres

A média de horas de trabalho semanal dos homens (40 horas) é superior à das mulheres nos três países (Portugal, Nova Zelândia e Suíça). Mas ao contrario do que acontece nos outros dois países, e em muitos outros da OCDE, em Portugal a carga horária semanal feminina é quase igual à masculina.
Dados de 2002 mostram que as mulheres portuguesas trabalham em média menos quarto horas por semana que os homens, na Nova Zelândia a diferença é de dez horas e na Suíça de 12 horas. Tanto nos 26 países da OCDE como nos Quinze da União Europeia, as mulheres trabalham em média menos sete horas que os homens, por semana. Assim, 75 por cento das mulheres portuguesas trabalham entre 35 a 42 horas por semana, enquanto 44 por cento das novas zelandesas  e mais de metade das suíças trabalham menos de 35 horas. Estes dados permitem concluir que o trabalho a tempo parcial não é comum entre as mulheres portuguesas. A redução do horário de trabalho por razões de maternidade, também não.
Os horários alargados não são necessariamente compatíveis com as responsabilidades familiares. Cerca de 24 por cento dos homens britânicos têm horários de mais de 50 horas de trabalho semanal. Apenas 12,5 dos finlandeses, 7,7 dos canadianos e 2,3 dos suecos partilham a mesma carga horária. Entre as mulheres, igualam as mais de 50 horas semanais 6,8 por cento das britânicas e 4,3% das finlandesas contra 1,9 por cento das canadianas e 0,6% das suecas

Flexibilidade ou redução de horário

Permitir aos pais a resolução de problemas relacionados com os filhos, é o que se pretende com a flexibilidade no horário de trabalho.
Desde 2003, que os pais (pai e mãe) britânicos com filhos com menos de seis anos têm o direito a requerer flexibilidade horária, redução de horas de trabalho ou recurso ao tele-trabalho; no primeiro ano, 90 por cento de 1 milhão de pedidos foi aceite pelas entidades patronais, na totalidade ou parcialmente.
 Indicadores recentes sugerem que um quarto dos pais trabalhadores já usou este direito. Mas a percentagem de utilização é maior entre as mulheres (37 por cento) que nos homens (10 por cento). Em geral, os pais optam pela redução de horário, foi o que fizeram 30 por cento dos pais e mais de 50 por cento das mães do Reino Unido em 2004. Do lado dos empregadores, uma outra pesquisa realizada em 2003, mostrou que 60 por cento ? sobretudo entre as grandes empresas - aceitaria a redução de trabalho a tempo inteiro para parcial no retorno da trabalhadora de uma licença de maternidade.

Pagar aos pais para terem os filhos em casa

Na Finlândia, os pais que tenham pelo menos um filho com menos de três anos recebem um subsídio de apoio ao ?cuidado em casa? pago pela segurança social, caso não optem pelos serviços de assistência a crianças (berçários, infantários, ou creches) quer públicos ou privados.
Em 2004, este subsídio mensal estava fixado nos 252 euros, com um adicional de 84 euros por cada criança adicional menor de três anos e um adicional de 50 euros por criança entre os três e os sete anos, que também não estivesse a usufruir de serviços de assistência a crianças. A segurança social prevê ainda a atribuição de um suplemento mensal de 168 euros.
Juntamente com os apoios da segurança social existem outros incentivos atribuídos pelos municípios, a quem cabe a responsabilidade de organizar os serviços de assistência a crianças abaixo da idade escolar. Em média podem ir até aos 190 euros por criança. Sendo que o município de Helsínquia pagava em 2004, 219 euros por mês. No mesmo ano, 49 mil famílias receberam este apoio da segurança social, um quarto das quais beneficiava ainda do apoio municipal.
Feitas as contas, uma família que opte pelos serviços públicos ou privados de assistência a crianças está automaticamente a ?perder? cerca de 500 euros por mês e a gastar 200 euros de propinas por criança.

Conciliar o trabalho e as crianças

Países como a Finlândia e a Suécia já conseguiram uma boa articulação entre horários de trabalho e necessidades parentais. Em Portugal há ainda muito por fazer, tanto ao nível laboral como dos apoios sociais à família, os mais baixos entre os países estudados. Um dos aspectos que distingue, pela negativa, a realidade portuguesa são as elevadas taxas de impostos tributadas nos empregos a tempo parcial.
Na maioria dos países da OCDE o segundo beneficiário tem mais retorno financeiro se optar pela redução de horário para parcial, prescindindo desta forma dos serviços de assistência a crianças a tempo inteiro. Em Portugal acontece o contrário, daí a pouca generalização do trabalho parcial.
Dos sete países aqui focados, Portugal é dos que menos investimentos tem feito em medidas de apoio às famílias. Mas mesmo entre os países onde esse investimento é considerável o equilíbrio entre trabalho e família é continuamente posto à prova pelo próprio desenvolvimento social. E esta, avisa a OCDE, é uma realidade que não pode ser ignorada.


  
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Edição:

N.º 148
Ano 14, Agosto/Setembro 2005

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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