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O Português como ?segunda? língua

IMIGRANTES NA ESCOLA PORTUGUESA

Vêm de outros sistemas de ensino. Uns são filhos de estrangeiros, outros de emigrantes portugueses regressados. Integram as escolas portuguesas mediante processos de equivalências de habilitações. O pior vem depois. O ensino da Língua Portuguesa é uma prioridade. Mas tudo depende do aluno e dos professores que o recebem. A escola nem sempre está preparada para lidar com eles. Sem financiamento extra para material pedagógico apropriado, mas com autonomia pedagógica, as escolas vão tacteando estratégias de ensino.

Os amigos abreviaram-lhe o nome para ?Sveta?. Svetlana Husyeva, 14 anos, chegou a Portugal há um ano vinda da Lituânia. Na altura ingressou no 8º ano na Escola Secundária António Sérgio em Vila Nova de Gaia. Não sabia dizer nem escrever uma palavra em português. Agora os seus conhecimentos permitem-lhe estabelecer um diálogo quase escorreito. ?Aprendi com o dicionário?, explica ?Sveta?. E acrescenta: ?os amigos e os professores também ajudaram muito?. Tanto que a aluna aprendeu português em quatro meses. Agora está no 9º ano e a directora de turma, Ana Nascimento, garante que é uma das suas melhores alunas.
?Assim que dominam o idioma português os filhos dos imigrantes tornam-se alunos brilhantes.? Para tal contribuem as metodologias que trazem dos seus países de origem e que, na opinião de Ana Nascimento, ?conduzem a aprendizagens muito significativas?. ?Sveta?, por exemplo, tem o hábito de apontar as dúvidas que lhe surgem durante as aulas de Físico-Química, ministradas por Ana Nascimento, na margem da folha para pedir esclarecimentos no final. Além disso, reflecte a professora, ?como têm de fazer um esforço maior, dadas as dificuldades na língua, acabam por se empenhar mais do que os alunos portugueses?.
Da Lituânia ?Sveta? trouxe conhecimentos de Matemática, Lituano, Russo, Inglês, Biologia, Geografia, Físico-Química, Música, Educação Física e Ética. Pelo que quando a língua portuguesa se tornou menos estranha, ?Sveta? encontrou muitas semelhanças entre os conteúdos das ?velhas? e das ?novas? disciplinas. Achou a matemática portuguesa ?muito mais fácil?. E para além do Português, pode acrescentar aos seus conhecimentos de línguas o Francês que nunca tinha estudado. Feitas as contas ?Sveta? domina mais idiomas que qualquer outro aluno português da sua idade. Algo que, em termos profissionais, a aluna sabe, a poderá ajudar bastante. Mas como na Lituânia a diferenciação curricular só acontece no 12º ano, ?Sveta? não estava preparada para ter de escolher uma área de formação mais específica já no final do 9º ano. Por isso não tem o futuro muito definido. ?Gostava de fazer algo ligado à pintura?? Certeza só tem uma: ?Quero ficar em Portugal!?

Diferenças incontornáveis

Ricardo Ribeiro, 14 anos, é mais um aluno ?estrangeiro? na turma de ?Sveta?. Filho de emigrantes portugueses na Venezuela, chegou a Portugal há sete meses e foi integrado no 9º ano. Nunca tinha falado português até que os pais regressaram ao seu país natal. Por isso, o castelhano predomina sempre que pensamento não tem tempo de procurar o termo luso para se expressar. As semelhanças entre os dois idiomas facilitaram a aproximação de Ricardo aos colegas de turma, mas estão a dificultar a aprendizagem do português. ?O pior é a pronúncia??, suspira.
Ao contrário da colega lituana, Ricardo tinha já o seu futuro bem delineado na Venezuela: seguir arquitectura. ?Construir edifícios ? sorri ? era isso que gostava de fazer!? Uma vez concluído o 9º ano, Ricardo optaria pela via de ensino das Ciências. A via para prosseguir estudos em áreas tão diversas como economia, biologia, comunicação e arquitectura. E cuja alternativa é a via de ensino de Humanidades, escolhida por quem quer estudar línguas, literaturas e também comunicação.
Do seu currículo do 8º ano faziam parte disciplinas técnicas como o Desenho Arquitectónico e o Desenho Artístico. ?A primeira consistia no desenho gráfico de casas e prédios, a segunda no desenho à mão?, explica Ricardo com entusiasmo. Por serem disciplinas muito próximas da área que gostaria de seguir foi uma frustração perceber que nem uma nem outra existiam no sistema de ensino português, pelo menos não no 9º ano. Ainda que algumas das noções possam encontrar algum eco na disciplina de Educação Visual e Tecnológica, ?não se podem fazer comparações?, lamenta Ricardo cujos planos são agora seguir o curso tecnológico de Obras Públicas e regressar ?logo que possa? à Venezuela.
Para piorar ainda mais a sua situação escolar Ricardo verificou que existem poucas semelhanças entre as ?novas? e as restantes disciplinas que compunham o seu antigo currículo (a Matemática, o Castelhano, o Inglês, a História Universal, a História da Venezuela, a Educação Física, a Biologia e a Educação para a Saúde). Mesmo entre as disciplinas que se assemelham, os conteúdos portugueses acabam por ser, na opinião de Ricardo, ?mais avançados?. Os casos mais evidentes são os da Matemática e do Inglês. [ver caixa Ensino português mais exigente] O contacto com o Francês, uma disciplina que nunca tinha tido, também não está a ser fácil. O mesmo acontece com a Físico-Química. É que no currículo venezuelano esta só é iniciada no 9º ano, garante Ricardo. Ao passo que em Portugal ela é iniciada no 8º ano. Este desfasamento faz com que as matérias que está a aprender estejam um ano avançadas relativamente aos seus conhecimentos da disciplina.

Estratégias tacteadas

A forma como um aluno estrangeiro é integrado no sistema de ensino português depende do tipo de documentação que o aluno trás do país de origem. No caso de ?Sveta?, a aluna não trazia nenhum processo de equivalência de habilitações da Lituânia pelo que teve de se submeter a um conjunto de testes diagnósticos realizados pelos professores da escola. Foi esta avaliação de conhecimentos que no ano lectivo passado determinou a inclusão de ?Sveta? no 8º ano. Já Ricardo trouxe da Venezuela um processo de equivalência, onde constavam dados sobre o seu passado escolar. O que permitiu a sua integração imediata de acordo com o número de anos de escolaridade frequentados no sistema de ensino de origem, tal como determina o decreto de lei nº. 219/97, que regula esta matéria. Ou seja: o aluno havia concluído com sucesso o 8º ano na Venezuela, pelo que foi integrado no 9º ano. 
De um modo geral, os alunos estrangeiros, sejam filhos de imigrantes ou filhos de portugueses emigrantes regressados a Portugal, integram o currículo normal. No entanto, adverte o decreto lei acima referido ?a equivalência de habilitações não pressupõe integral semelhança de estruturas curriculares e conteúdos programáticos entre os correspondentes anos de escolaridade, mas apenas um paralelismo na formação global obtida através da respectiva conclusão com aproveitamento.? Uma vez determinado o ano de escolaridade em que o aluno deve ser inserido ?a escola vai tacteando?, reconhece Ana Nascimento. Sem contudo, perder de vista o exposto no decreto-lei [nº 6/ 2001, 18 de Janeiro] onde se pode ler que ?as escolas devem proporcionar actividades curriculares específicas para a aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua aos alunos cuja língua materna não seja o português.? A estratégia a seguir pela escola depende do modo como o aluno reage ao ensino do idioma. ?Às vezes podemos chegar à conclusão de que determinada estratégia não resultou?, analisa a professora. 
Na Escola Secundária António Sérgio, ?Sveta? e Ricardo têm seis aulas semanais de Língua portuguesa, ou seja, quatro do horário normal e duas horas extra estipuladas pela escola. Mas as dificuldades de Ricardo em se expressar em português levaram os professores a apresentar uma proposta a Conselho Pedagógico, ainda não aprovada à data, para aumentar em mais 45 minutos o apoio a Língua portuguesa. E para diminuir a carga  horária ao aluno uma outra proposta seguiu para o mesmo órgão: retirar do currículo o Francês, na medida em que para o Ricardo esta é a sua terceira língua.

Trabalhar no vazio

Como a concessão de equivalência não implica uma semelhança integral de currículos e conteúdos programáticos entre os correspondentes anos de escolaridade, o passado escolar dos alunos estrangeiros é quase sempre desconhecido. Ana Nascimento sabe que o Ricardo não domina o português e que ?vem com muitas lacunas?. O que a leva a concluir que ?talvez os conteúdos curriculares venezuelanos sejam menos exigentes do que os portugueses?. Diz a professora: ?O aluno ou tem dificuldades na aprendizagem ou pode não ter dado na Venezuela os conteúdos que no 9º ano já deveriam estar aprendidos no sistema de ensino português?.
Nas escolas que recebem alunos estrangeiros pairam incertezas quanto aos programas e currículos leccionados nos seus países de origem. ?Os professores muitas vezes trabalham no vazio?, contesta Ana Nascimento. ?Oficialmente desconheço o passado escolar dos alunos!?, desabafa. E acrescenta: ?Isso não me invalida de fazer uma pesquisa na Internet e tentar averiguar alguma coisa!? Ainda assim, na opinião da professora, o ideal seria a criação de um departamento para alunos estrangeiros dentro das escolas. A sua função: recolher o máximo de informação que ajudasse os professores a lidar com estes alunos.
Outra das soluções que beneficiariam as escolas que recebem alunos estrangeiros seria o recurso às faculdades de Letras onde existem professores estrangeiros de vários idiomas. ?Estes poderiam dar uma ajuda preciosa às escolas funcionando como tradutores?, realça a professora. Até porque, continua Ana Nascimento, há situações em que o entendimento entre professores e alunos não é possível, dadas as diferenças linguísticas. ?Nesses casos a escola tem autonomia para resolver o problema da maneira que achar mais correcta. Mas o facto de a escola entender que são necessários tradutores não significa que os possa pagar?, lamenta. E no que toca a apoios, a lei não prevê financiamentos especiais para as escolas que recebem  alunos estrangeiros.
Para Ana Nascimento há uma outra questão que importa ter em conta quando se fala no ensino do Português aos alunos filhos de imigrantes. ?Não podemos estar a ensinar português ao filho para ele chegar a casa e falar russo com o pai.? E sendo que a generalidade dos imigrantes têm formação, a professora acredita que após o domínio do português, estes poderiam ser úteis à escola como tradutores, ajudando na integração de novos alunos estrangeiros.

Choque cultural

L., 16 anos, veio da China há cerca de três anos. Os pais autorizaram a entrevista com a condição do nome da filha não ser revelado. A jovem frequenta o 7º ano na Escola Básica 2/3 Augusto Gil, no Porto. Quando chegou foi inserida no 5º ano. Para trás já ficaram os dias em que não dizia uma única palavra portuguesa. ?Essa foi a nossa maior dificuldade?, recorda L, falando por si e pelas três amigas que vieram com ela. E esclarece: ?Não é que seja uma língua muito complicada, o problema é que uma palavra pode ter vários significados. Além disso a leitura é muito mais difícil que a escrita.? Oralmente, os conhecimentos de português permitem a L. uma conversa razoável sem muitos soluços. Apesar do domínio da língua, a integração na comunidade escolar parece não ter acontecido. L. frequenta a escola há quase três anos, mas diz ter poucas amigas portuguesas. ?O costume, a cultura e o pensamento são muito diferentes?, justifica L., queixando-se essencialmente da falta de ?convivência? fora da escola. ?Aqui só nos dias em que temos escola é que temos colegas...?
As diferenças entre os sistemas de ensino chinês e o português não facilitam a integração. [ver caixa Uma escola chinesa] Da escola chinesa que frequentava L. diz sentir falta da ?disciplina? que se fazia sentir aos mais diversos níveis: desde os horários até à limpeza da sala de aulas. ?Desorganização?, é na opinião de L. a palavra que melhor caracteriza a escola portuguesa. E é também causa de grande transtorno para a jovem. O intervalo, por exemplo, é para L. e as amigas um verdadeiro tormento. ?O recreio é muito violento, os alunos andam sempre aos empurrões e a correr. Ás vezes não aguento!?, desabafa. A tal ponto que L. e as amigas abdicariam de bom grado desses minutos de descanso se lhes permitissem a permanência na sala de aula. Como na escola isso vai contra as regras, a biblioteca serve de refúgio.  É o espaço que mais lhes agrada na escola.
Outra das diferenças que chocou L. quando entrou para a escola portuguesa foi o ?desrespeito? dos alunos pelos professores. ?Na China quando o professor entra na sala os alunos põem-se de pé em silêncio, aqui fazem muito barulho?. A par desse incómodo, um outro: o facto de a turma não ter uma sala de aulas fixa, como acontecia na sua antiga escola chinesa. Apenas a Ginástica e a Música são praticadas em locais próprios, garante L. realçando que ambas as disciplinas entram nos currículos com o objectivo de ?relaxar? os alunos.

Aprender o máximo de português

Graça Ribau foi professora de Português e Inglês de L. quando esta chegou à Escola Básica 273 Augusto Gil. Nessa altura o número de alunos chineses ascendia aos 15. Como não dominavam o português, apenas frequentavam as disciplinas de Educação Musical, Educação Física, Inglês e Matemática integrados no currículo geral. Nos horários de Língua portuguesa, História e Ciências os alunos tinham aulas de português com Graça Ribau. ?Entendia-se ser esta a melhor forma de os integrar, fazendo-os aprender o máximo de português, numa primeira fase e depois as restantes disciplinas?, explica a professora.
Uma das dificuldades que sentiu ao ter de ensinar português aos alunos chineses foi a falta de material pedagógico. Os livros de português para estrangeiros existentes na escola eram muito infantis e desadequados a alunos adolescentes. O primeiro passo da professora foi descobrir manuais mais próprios da idade dos alunos. Depois começou por ensinar o vocabulário da vida escolar, seguiu-se o da vida quotidiana e da alimentação. ?Ensinar-lhes, por exemplo, o calendário ocidental foi essencial?, recorda Graça Ribau. As festividades típicas de Portugal e alguns conhecimentos de religião, também fizeram parte do programa. ?Tentei com que ficassem a perceber um pouco do modo como o Ocidente funciona??
Além desses conhecimentos, diz Graça Ribau: ?As minhas aulas serviam também para esclarecer o que era dado nas outras, porque eles não percebiam nada!? Este ano lectivo o procedimento em relação à integração dos alunos estrangeiros mudou. Os alunos chineses que agora chegam à escola passam a frequentar todas as disciplinas do currículo geral. Ainda que não entendam os conteúdos leccionados, devido ao não domínio da Língua Portuguesa. Graça Ribau discorda desta estratégia. Não é a única. [ver caixa Um banho de língua]
?É um problema?, resume Graça Ribau. ?Muitos dos alunos chineses desistem da escola para trabalhar nas lojas ou nos restaurantes dos pais.? Para evitar a desmotivação que acaba por contribuir para o abandono escolar a professora defende que seria necessário um acompanhamento mais exaustivo dos alunos estrangeiros. O que implicaria ?mais horas de trabalho para os professores que teriam de ser pagas?. O certo é que estes alunos precisavam de mais apoio, diz Graça. Até porque não chega o facto de serem avaliados com os testes adaptados. ?Deveria haver uma directriz para lidar com estes alunos, mas não, parece que andamos a brincar com a vida futura dele?, conclui.

Uma estratégia de integração

Kátia Barbosa, 8 anos, é filha de emigrantes portugueses regressados da Suíça. Fala um pouco de português mas tem muita vergonha do sotaque. A mãe, Maria Eduarda Barbosa, explica: ?O português soa-lhe esquisito.? A sua maior dificuldade é a escrita e a expressão dos sons. Além disso, ?na escola suíça a Kátia tinha muita gramática francesa e na matemática ainda fazia contas com centenas, aqui já fazem contas com milhares?, contesta a mãe. Por isso a aluna foi integrada no 2º ano, apesar de na Suíça frequentar o 3º ano. A professora de Kátia, Maria Manuel Miranda, suspeita que a razão das dificuldades da aluna têm origem na existência de uma discrepância entre o ritmo de ensino suíço e o português, sendo que este ?é mais acelerado?. No entanto, adverte que entre dois sistemas de ensino diferentes ?a exigência não pode ser comparada?. No seu entender, ?a diferença está nos conteúdos que ela estava a aprender lá e no modo como o aprendia.?
Apesar de não ter certas competências que deveria ter para o nível de exigência português Maria Manuel Miranda diz que Kátia está a conseguir atingi-las. E neste aspecto a professora está descansada. Na sua opinião ?importa primeiro que os alunos estrangeiros se integrem na sala de aula e entre os colegas, a aprendizagem vem depois.? A timidez de Kátia, o embaraço que sente ao falar o português, o medo de provocar o riso nos colegas estava a dificultar a integração. Então a professora arranjou uma estratégia original para integrar a Kátia: todas as sextas-feiras, a aluna transforma-se em professora de Francês dos colegas. ?Ela escolhe as palavras e escreve-as numa cartolina em Francês e em Português, depois ensina os colegas a pronunciá-las.? Os resultados estão a ser positivos. A Kátia gosta do papel de professora. ?Ela partilha o que sabe com os colegas e fica mais motivada?, afirma a professora.


?Acolher, Integrar e Partilhar Património?,
um programa da agência nacional Sócrates

Um banho de língua

Sob a alçada do projecto europeu ?Acolher, Integrar e Partilhar Património? da agência nacional Sócrates, Teresa Miranda, professora da Escola Básica de Augusto Gil está inserida num programa europeu cujo objectivo é promover a troca de experiências entre professores de alunos não falantes da língua do país onde vivem. Dessa partilha sobressai uma conclusão comum: existem muitas dificuldades de integração. ?Os alunos estrangeiros sentem-se mal integrados?, confirma Teresa Miranda. Para contrariar esta situação cada país irá agora sugerir e experimentar actividades que potenciem a integração. Na próxima reunião, a realizar-se em Maio na cidade de Roma, os resultados dessas acções serão discutidas e analisadas. 
Entretanto, cada escola tem encontrado a sua maneira de contornar o problema. Em França, no primeiro ano de integração os alunos estrangeiros recebem um ?banho de língua?. Ou seja um ano em que só aprendem idioma francês a par de disciplinas onde a falta de domínio da língua não prejudique a aprendizagem. Casos como a Educação Física ou a Matemática. Teresa Miranda defende a aplicação desta estratégia aos alunos estrangeiros a estudar em Portugal. No entanto, o sistema de ensino português não permite esta medida. Os alunos estrangeiros são integrados em turmas ?normais? e obrigados a frequentar todas as disciplinas. Mesmo àquelas disciplinas em que o domínio do Português é indispensável para a aprendizagem dos conteúdos. ?A lei não permite que possa ser de maneira diferente?, insiste Teresa Miranda.
Um facto confirmado por Isabel Ponce de Leão, da Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) e que se aplica quer aos alunos estrangeiros que frequentem o Ensino Básico quer o Ensino Secundário. Entende-se, segundo a responsável da DREN, que a frequência a todas as disciplinas integrados numa turma normal, facilita a integração dos alunos estrangeiros na comunidade escolar. Uma tese contrariada por muitos professores que entendem que tal situação apenas contribui para a desmotivação do aluno.

Uma escola chinesa

As 7h15 os alunos chegam à escola para iniciar uma espécie de ?aquecimento? que precede o início de aulas. São 15 minutos dedicados exclusivamente à leitura em voz alta. As aulas começam apenas às 7h30. Depois de entrarem na sala, o aluno responsável pela turma verifica as ausências e as presenças e fornece ao professor os nomes dos alunos em falta. Não fazia muito sentido que fosse o professor a perder tempo a fazer a chamada. Este primeiro período de aulas termina às 11h30.
Seguem-se 30 minutos de intervalo em que todos os alunos fazem ginástica cujo principal objectivo é o de relaxar. Depois segue-se o almoço. Durante os intervalos os alunos ouvem a rádio da escola. Vão para o ?ar? notícias sobre as actividades lectivas e culturais desenvolvidas pelo estabelecimento de ensino. Mas também música do agrado dos alunos e programas onde se lêem poesias e composições da autoria dos estudantes.
Das 13h30 às 16h30 há um segundo período de aulas. Findo esse período um novo intervalo em que os alunos aproveitam para fazer os seus trabalhos de casa e estudar na biblioteca. Como cada turma tem aulas numa sala fixa, cabe aos alunos a sua limpeza. Sendo que esta deve ocorrer durante um dos intervalos ao longo do dia.
O último período de aulas acontece das 18h30 às 20h30. As aulas são de 45 minutos cada. O ensino primário é o único que dispensa o terceiro período de aulas. Uma vez chegados ao 10º ano, os alunos podem ficar alojados na escola. A maioria dos alunos troca a residência para o estabelecimento de ensino. A vantagem é óbvia: a vida do estudante fica mais organizada sendo que deixa de perder tempo em deslocações e passa a concentrar-se mais nos estudos.
Reconstituição do dia-a-dia de uma escola chinesa com base no depoimento de L.

Iryna Husyeva, 21 anos, lituana

Queria estudar Economia mas faz gravatas

Se estivesse na Lituânia, Iryna Husyeva, 21 anos, irmã de ?Sveta?, estaria na universidade. O destino para a maioria dos estudantes, até porque, explica Iryna, ?quem não segue os estudos superiores é considerada pessoa sem futuro?. Além disso, continua, ?em Portugal uma pessoa com o 12º ano pode empregar-se num escritório e ter uma profissão média. Na Lituânia não! Com o 12º ano apenas se arranja emprego numa fábrica?, relata Iryna sublinhando a importância que é dada à educação superior no seu país de origem. Talvez por isso Iryna tenha vergonha de dizer às amigas lituanas que está a trabalhar numa fábrica de fazer gravatas. O seu ordenado é imprescindível para o sustento da família: pai, mãe e irmã.
Na Lituânia a mãe de Iryna e ?Sveta? era economista, aqui vai ganhando a vida a fazer limpezas. O pai, professor de História e com formação superior também na área do Direito, trabalha na construção civil. ?O ideal seria que ambos pudessem ter um emprego mais adequado à sua formação?, diz Iryna. Para isso teriam de dominar o português. O mesmo se aplica a Iryna. Como na fábrica o trabalho é feito sem conversa o português da jovem é ainda decalcado do dicionário. Um contratempo que poderá ser alterado. Na escola que ?Sveta? frequenta, a Secundária António Sérgio, em Vila Nova de Gaia, prepara-se a abertura de um curso de português para estrangeiros. ?Depois [da aprendizagem da língua] tudo pode melhorar!? Essa é a esperança da jovem.

Dayana Couto, 17 ano, venezuelana, filha de pais portugueses

Ensino português mais exigente

Dayana Couto, 17 anos chegou da Venezuela há 7 meses, juntamente com os pais e o irmão, o Ricardo. Apesar dos pais serem portugueses, emigrados há mais de 20 anos naquele país, a sua adaptação a Portugal está a ser mais difícil do que seria de esperar. Está matriculada no 1º ano do curso de Turismo no Instituto Superior de Ciências Empresariais e do Turismo (ISCET), no Porto. Ainda não domina o português. Entende tudo o que lhe dizem, mas falar sem o acento espanhol é quase impossível.
Na Venezuela a escolaridade obrigatória é de 11 anos e coincide com o término dos estudos secundários a qual se segue a entrada para o Ensino Superior. Por isso é a mais nova do curso e a menos preocupada com a certeza de que vai perder o ano. ?Aqui os estudos são mais exigentes?, diz Dayana. Como exemplo dá o do inglês. Apesar de ter tido esta língua desde o 1º ano de escolaridade quando entrou pela primeira vez numa aula de inglês do ISCET, Dayana apanhou um ?choque?: ?Não entendia uma palavra?. A razão parece óbvia: ?O inglês que aprendemos na Venezuela é o dos EUA, aqui aprende-se o de Inglaterra.?


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 132
Ano 13, Março 2004

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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