Página  >  Edições  >  N.º 121  >  Boas Notícias

Boas Notícias

Recentemente, vieram a público iniciativas de índole diversa e aparentemente desgarradas umas das outras, mas unidas, pelo menos, pelo propósito comum de defender a integridade da língua portuguesa. Para mim, são boas notícias e espero que sejam muitos os leitores que tenham a mesma opinião. As iniciativas a que me refiro são as seguintes (outras estarão em curso, ou terão já ocorrido, mas estas são aquelas de que tomei conhecimento pela comunicação social).

Autarcas e cantores

O presidente da Câmara de Albufeira decidiu submeter aos deputados municipais deste concelho a aprovação de uma directiva no sentido da aplicar coimas (de montante ainda não fixado) a quem prescinda de utilizar a Língua Portuguesa (na sua modalidade escrita) no espaço público, incluíndo a sinalética urbana ? painéis, anúncios, e quejandos. O referido autarca deu-se conta de que qualquer pessoa com algum sentido crítico que visite o seu concelho teria a sensação de ter chegado a um território de outro país. É que lá já ninguém escreve ?vende-se?( mas ?for sale?), ?botequim? (mas ?bar?), ?quartos? (mas ?rooms?) e assim por diante. O autarca principal de Albufeira é tolerante: entende que todos são livres de exibir o seu Inglês (ou Quasinglês),  desde que o façam também, em primeiro lugar, em Português. Estando nós em Portugal, nada se afigura mais razoável. A iniciativa talvez tenha sido inspirada pelo exemplo do seu homólogo do Rio de Janeiro, que fez coisa semelhante na sua ?prefeitura?, há pouco tempo. Mas isso não lhe retira qualquer mérito, antes lhe acrescenta, porque os bons exemplos devem ser imitados sem qualquer rebuço, venham eles de onde vierem.

O cantor Pedro Barroso lançou um manifesto em defesa da música portuguesa que já foi subscrito por várias centenas de músicos e um outro grupo de músicos (Luís Represas e outros) lançou um movimento denominado ?Venham mais Cinco? de  índole semellhante. Ambos os grupos exigem dos poderes públicos medidas legislativas e admnistrativas destinadas a garantir à música portuguesa um espaço de difusão nas estações de radiotelefonia e de televisão que emitem a partir do território nacional. Estes artistas deram-se conta de que, pelo caminho que as coisas levam, ou começam a compôr e a cantar em Inglês (ou em Quasinglês, já que a diferença, para o caso, é irrelevante) ou, um dia destes, muito deles passarão apenas a ser ouvidos nas feiras, nas festas de aldeia e nos núcleos de portugueses imigrados.

O mais difícil

Não  conheço nenhuma destas iniciativas em pormenor. Mas tenho para mim que são todas louváveis e todas oportunas. A língua portuguesa (falada, escrita e cantada) precisa de ser defendida vigorosamente em todos os domínios. Porque é que precisa de ser defendida, de quê e/ou de quem, e, sobretudo, como pode ser defendida, não são, todavia, questões assim tão óbvias para muita gente.

Não é sequer líquido que o sejam para muitos proponentes destes movimentos, pelo que me foi dado observar a partir de uma programa de três horas e meia na RTP consagrado ao tema da defesa da música portuguesa. Muitos dos intervenientes passaram o tempo a discutir da bondade das ?pleilistes?, a comparar as estatísticas dos ?topes-téne? e dos ?topes-tuenti? e a debater a importância do ?marquetingue? e do ?praimetaime? para o ?sucesso? das suas músicas, mostrando que ainda falta percorrer um longo caminho até que consigam falar de maneira inteligível para o grande público.  Ora, sem conseguir persuadir o grande público da boa causa em que estão empenhados, muito em particular o público mais jovem, diáriamente alimentado com doses cavalares de Quasinglês ? e não apenas  os decisores políticos e jormalistas que se expressam habitualmente nesse código restrito? não se vai lá.

Leis proteccionistas poderão ser aprovadas e até regulamentadas; eventualmente a percentagem de música cantada em português subirá. Mas se tais leis forem aprovadas contra a opinião de vastos sectores desse público, é duvidoso que a música de mais qualidade venha a encontrar ouvidos mais numerosos  dispostos a  apreciá-la. Voltaremos ao assunto.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 121
Ano 12, Março 2003

Autoria:

José Manuel Catarino Soares
Instituto Politécnico de Setúbal
José Manuel Catarino Soares
Instituto Politécnico de Setúbal

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo