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Cartas - Novembro 2001

Sem cura possível

O actual Ministro da Educação diz que o 1º ciclo é a sua prioridade... O Senhor parece bem intencionado, mas de boas intenções está o inferno cheio, diz o povo ...Eu, sou dos que penso que a Reforma do Roberto Carneiro, apesar de ter desenvolvido o sistema educativo, "assassinou" o ensino primário, ao descaracterizá-lo completamente.
O ensino primário que era o sub-sistema do nosso ensino mais bem organizado no tempo da "outra senhora" e que viu o seu papel reforçado no período revolucionário, talvez tenha sido vítima dos excessos de ideologização... Nestas duas décadas e meia de regime demo-liberal assistimos ao declínio do papel do ensino primário, consequentem/ à sua agonia... A inteligentzia do bloco central, com a conivência dos burocratas instalados na 5 de Outubro ( e também na 24 de Julho?) praticamente desde 1976, que relegou o ensino primário para o fim da lista das prioridades...Creio mesmo que chamar-se Ministério da Educação é um eufemismo, porque o que tem havido é um Ministério do acesso ao Superior!...
Assoberbados com o problema do acesso, não descansaram enquanto não empurraram o 1º ciclo para as Câmaras... Com a chamada nova gestão tudo fizeram para que as escolas primárias ficassem sob o controlo, inclusivé político, dos gestores das escolas preparatórias!... A legislação é feita para os alunos do 2º e 3º ciclo, acrescentando-se uns parágrafos finais, para adaptação ao 1º ciclo, tudo em nome de um pretenso ensino básico alargado... As provas aferidas são a antecâmara do regresso aos exames, apesar de todos os paliativos!... A inclusão dos alunos deficientes ( e não só) no regular, principalmente, nas escolas preparatórias não passa de uma comédia, e, como é sabido, da comédia à tragédia é só um pequeno passo... Os apoios educativos/educação especial viram-se envolvidos, desde o final do ano lectivo passado, numa situação surrealista, havendo inúmeras situações em que alunos mongolóides, alunos com deficiência mental ligeira e disléxicos, entre outros, deixaram de fazer parte das prioridades nos apoios...Por outro lado, os professores do 1º Ciclo e as educadoras de infância são perfeitamentes marginalizados na generalidade dos agrupamentos verticais... A autonomia dos agrupamentos horizontais é uma treta...
Também não se pode omitir, como prova do ostracismo a que o ensino primário público tem sido vetado, o facto dos filhos das élites frequentarem estabelecimentos de ensino básico privados, alguns subsidiados escandalosamente com dinheiros públicos, como o SPRC vem denuciando...
É certo que os professores viram melhorada a sua situação remuneratória, com reflexos óbvios a vários níveis... Agora alguns munícípios vieram com o rebuçado do computador e da ligação à internet!... E, assim, se vai adormecendo a malta...
Quanto aos sindicatos o SPRC ainda agora veio a público clamar (mais uma vez!) para a imperiosidade de medidas de urgência para o 1º Ciclo, salientando o desinvestimento camarário!... Quanto a mim o problema já não é só de investimento, da crónica falta de recursos, de renovação dos equipamentos, etc... O realismo impede-me de terminar com qualquer sintoma de esperança, porque a doença cancerosa já alastrou tanto, que não sei mesmo se há cura possível...

João Craveiro Lopes, Porto


Biblioteca e Bibliotecas

Num sábado recente, dirigi-me, como de costume, cedo à Biblioteca, esperando retomar uma série de indicações necessárias e em "stand-by" desde as férias deVerão. Foi uma surpresa triste encontrar a Biblioteca reduzida ao serviço de consulta livre. Desde 1988 que frequento com regularidade a Biblioteca, altura em que regressei de um ano de aulas nos Açores. Durante vários anos, consegui organizar-me para ir de Braga ao Porto pelo menos uma tarde mensal, descobrir os extractos de livros que precisava, e reservar um sábado de manhã para as fotocópias, tendo de antemão as colocações dos livros.
Suportei as demoras em receber os livros, em apenas poder requisitar três livros de cada vez, esperar na lenta fila para as fotocópias, ou adiar porque a máquina estava avariada quando chegava à Biblioteca... Pensava que uma Biblioteca era assim mesmo ( a de Lisboa acrescenta a exigência em ter cartão de membro): espera, fila de fotocópias, lentidão em obter a bibliografia. E, nessas condições, fui escrevendo artigos para Inglaterra e um livro gordo publicado em Portugal, finalmente, em Janeiro deste ano (pelo que me informaram, demorará dois anos a se encontrar acessível na Biblioteca).
Em 1994 tive a oportunidade em estar uns dias em Madrid, e fui descontraidamente à Biblioteca Nacional. Surpreendentemente, além do acesso livre, a espera era reduzida, as muitas máquinas de fotocópias eram em self-service, e a abundância de documentação (ficheiro manual ou informatizado) era estonteante.
Graças a uma Bolsa de Estudo da Fundação Gulbenkian, em 1997 tratei de investigar melhor a Biblioteca madrilena, e, meses depois, pude estar uma semana em Barcelona para continuar a verdadeira aventura de "caçador-recolector" de documentação. A velocidade em investigar foi adicionada ao prazer da descoberta, e logo entendi que estava a milhas do que Portugal me podia oferecer: fiquei farto das esperas, das filas, da escassez .
Em 1999, uma Licença Sabática possibilitou-me, de novo, dedicar sem rédea às bibliotecas universitárias de Barcelona e à Biblioteca Islâmica de Madrid. Livros desejados e edições académicas de teses de doutoramento abriam novas pistas para digerir, reflectir e avançar para outras ideias transformadas em livros, agora e num futuro próximo. Chegou depois a altura das bibliotecas de Santiago e de Toledo se adicionarem ao turismo cultural, e reforçar as óptimas impressões da gestão documental espanhola.
Na Biblioteca portuense terei aprendido a ter paciência e força de vontade, palavras para descrever os tempos árduos e dispensáveis sem dizer "frustrante, inútil, terceiromundista". E continuo a falar de livros, pois só agora espreito a Internet.
No sábado de inauguração do Porto 2001, voltei à BPMP; consultei um computador, e os links do menu levavam a páginas não disponíveis da Biblioteca Nacional de Lisboa; a funcionária informou-me que o sistema estava ainda em organização. Na terça-feira, dia 9 de outubro, tomei o comboio para o Porto, fui à Biblioteca, esperei pelos livros, fui às fotocópias, e consultei o computador. Em "Bibliografia", escolhi o que queria e, de acordo com as instruções, tratei de a enviar para o meu e-mail. Ora acontece que tal não é possível, apesar de estar no menu.
Para terminar, recordo-me que um sábado na Biblioteca significava azáfama: muitos estudantes em torno dos ficheiros, fila nas fotocópias, sala de leitura bastante cheia,...Não é, pois, por falta de "quorum" que o serviço de sábado foi reduzido drasticamente. Recordo-me, também, que o diário "Público" dedicou, meses atrás, uma página à inauguração do noavo serviço de acesso livre, sem deixar de referir que a BPMP é "repelente". Que novidade é o acesso livre em Portugal! Qualquer vilório espanhol oferece mais! Apesar do sistema retrógado e nada incentivador que a BPMP oferecia, não pensava que iria ficar pior. Devedor às novas "paixões" da crise, como é claro.
E nunca pensei afirmar o seguinte: a Biblioteca portuense incentiva a iliteracia e incultura lusitanas.

Franklin Pereira, Braga


Voz de alunos

Sou aluno da Escola Secundária Alcaides de Faria e queria expôr a este jornal o problema que a Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) está a causar aos alunos do 11º ano de Desenho Técnico de Mecânica (DTM).
Nós já frequentamos o 2º bloco a DTM mas a DREN decidiu, este ano, que não poderíamos frequentar essa disciplina alegando haver somente seis alunos inscritos. Se é esta a razão que a DREN dá, então porque razão no ano passado nos deixaram frequentar essa disciplina se, nessa altura, também se verificava um número inferior de alunos relativamente ao estipulado por lei?
Agora, a DREN quer pôr os alunos de DTM a frequentar a disciplina de oficinas de artes do 10º ano, sabendo nós que essa disciplina não tem nada a ver com o curso que queremos tirar (engenharia civil). A disciplina de DTM tem 3 blocos, e no 3º bloco aprendemos a trabalhar com o C.A.D. (Computer Assistent Designer), que é um programa que nos ajudará bastante quando chegarmos à universidade, e no qual nós queremos aprender a trabalhar. Por alguma coisa é que estão os melhores computadores da escola na sala de oficinas!
Os alunos e encarregados de educação de DTM já recorreram dessa decisão mas o recurso foi-nos negado. (...) Prometemos que isto não iria ficar por aqui. Por alguma razão estivemos um ano a estudar para essa disciplina, e se ela não fosse necessária não a estaríamos a frequentar.

Luís Ricardo Gonçalves Pinto
Aluno da Escola Secundária Alcaides de Faria

  
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Edição:

N.º 107
Ano 10, Novembro 2001

Autoria:

Redacção

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